quarta-feira, 31 de março de 2010


“Montage”


Nas primeiras postagens do FotoMusic Score, eu tive a intenção de explicar alguns conceitos básicos sobre Música. Comecei falando, mesmo que resumidamente, sobre a música erudita e a popular. Também ressaltei a diferença entre a música pura e funcional, e ainda levantei uma pequena discussão sobre a repercussão que a música do Cinema teve em seu nascimento, se ela foi ou não um rebaixamento da música, tão explorada desde o início da humanidade.

Uma pergunta simples, porém interessante é: “O que é Música para você?”. Muitos não entendem a intenção desta, e respondem que música é aquele cantor famoso, ou aquela banda revelação do momento, ou tal estilo que é “tudo de bom”. Mas não é exatamente isso que estou procurando saber. Quando faço esta pergunta, me refiro a uma visão mais ampla, procuro sempre saber qual a opinião que a pessoa tem sobre a música como um todo.

O que é a Música (como um todo) pra você?

Esta é uma pergunta que eu sempre faço para os meus alunos, logo na primeira aula. Curiosamente, cada pessoa tem seu ponto de vista, e todos respondem de uma forma totalmente diferente. Nenhuma resposta é necessariamente errada, e embora pareça ser difícil de responder, todos têm uma “versão” totalmente sensata, de acordo com a experiência que cada um teve ao se familiarizar com esta linguagem mundial.

O fato é que definir toda a música em uma única resposta é algo muito difícil de fazer. Ao longo de toda a história do homem, muitos se perguntaram isso e cada um conseguiu ter sua própria opinião, tendo em vista seu aprendizado e sua experiência.

Mas independente da opinião que as pessoas têm sobre o que afinal é a Música, várias pesquisas e experimentações foram feitas para enfim sabermos qual o significado da música para o cinema. Por que música no cinema? Parece ser outra pergunta óbvia, mas se pensarmos poderá ter uma resposta mais profunda do que “porque é legal” ou “para poder acompanhar a cena”. No cinema, desde o seu surgimento com os irmãos Lumière, até os dias de hoje, descobrimos alguns detalhes importantes para o funcionamento da música para o cinema. E é basicamente sobre isso que vou escrever hoje.


Como já discutido em outras postagens, a trilha sonora é composta de três elementos: Voz, Ruído e Música. Prefiro escrever nesta ordem, para funcionar como uma hierarquia para a mixagem, na pós-produção dos filmes. Em outras postagens vou comentar sobre ruídos e também sobre as vozes. Mas hoje, assim como faço desde o começo, vou falar sobre o terceiro elemento que compõe toda a parte sensorial dos nossos filmes favoritos.

Desde o seu surgimento, o cinema tem a música para ajudar, de uma forma cada vez mais específica, a fazer uma narrativa cada vez mais completa. E um conhecido recurso muito útil em certas passagens dos filmes é a “Montage”.

A música é extremamente usada no cinema quando precisamos narrar uma grande passagem de tempo. Quando um personagem faz uma longa viagem dentro de algum transporte, horas e horas podem passar em segundos, com um passar de cenas adequado e acompanhado de música. Um grande exemplo disso é a cena de “Anjos e Demônios”, quando o Professor Langdon (Tom Hanks), voa para o Vaticano “em poucos segundos”.


Existem várias “Montage” que posso selecionar sendo este outro um exemplo muito conhecido:


Lembrando também o grande vencedor do Oscar de Trilha Sonora de 2010, “Up – Altas Aventuras”, na Montage de Carl e Ellie:


Todos estes exemplos têm coisas em comum: Facilitar passagens de tempo ou mudanças de localização. No exemplo de Rocky e de Up, temos certa passagem de tempo, sendo alguns meses de treinamento, ou uma vida inteira juntos. A “montage” melhora a continuidade de transições, e a música nos ajuda a perceber como o tempo vai passando, com o decorrer das cenas.

Já no caso de “Anjos e Demônios” e também em “Supremacia Bourne”, podemos reparar que a “montage” não narrou uma grande passagem de tempo, mas sim uma grande distância. Nestes dois filmes podemos observar uma “montage” com cenas e música para designar uma viagem internacional.


Ou seja, mesmo sendo meses de treinamento, anos, ou apenas algumas horas de viagem, podemos transformar tudo em segundos, sem que o momento perca seu sentido e de acordo com a liberdade da narrativa do cinema. Ele, com a ajuda da música, nos permite também enfatizar o principal conteúdo emocional da cena, como podemos observar a partir dos 3:00 do vídeo que selecionei de “UP”


Estas são apenas algumas das funções da Música no Cinema. Existem também outros aspectos que ainda não mencionei, e como disse no começo do post, futuramente pretendo comentar mais sobre os ruídos, e também sobre as vozes, sobre como funciona essa “hierarquia” da trilha sonora.

terça-feira, 30 de março de 2010

Homens que Encaravam Cabras
(The Men Who Stare at Goats, 2009)
Comédia - 94 min.

Direção: Grant Heslov
Roteiro: Peter Straughan

Com: George Clooney, Ewan McGregor, Jeff Bridges e Kevin Spacey

De boas intenções o inferno está cheio, e é fácil perceber porque, em especial quando essas boas idéias são cometidas em nome do cinema. Quantos filmes (esse começo de ano está prodigioso nesse quesito) tiveram ótimas idéias estragadas pelo meio do caminho resultando em produções comuns, estéreis e em última instancia ruins.

Homens que Encaravam Cabras é mais um que se junta ao cada vez maior hall dos filmes que tem boas idéias demolidas por problemas durante a projeção. No caso de Homens é seu ritmo, ou melhor, a falta dele e a incapacidade de ser engraçado quando pretende ser e não conseguir ser satírico quando precisa ser.


O filme pareceu ter sido uma tentativa de recriar o clima dos irmãos Coen. Aquele humor negro e satírico que flerta com o absurdo. Até Jeff Bridges “volta” ao seu papel em Grande Lebowski ao viver o hippie milico Bill.

A história, que tinha um enorme potencial ainda mais quando ficamos sabendo que ela é real, fala de um jornalista (Bob Wilton, vivido por Ewan McGregor) que ao entrevistar um suposto adivinho (ou algo assim) descobre que o governo treinava pessoas para usar certos poderes especiais no intuito de aproveitá-los na guerra. Ao mesmo tempo seu casamento rui e ele se manda para o Iraque, em busca de auto afirmação como “macho”. Lá ele encontra um dos treinados pelo governo (Lyn Cassady, interpretado por George Clooney) que explica o que era o treinamento.


A idéia era transformá-los em jedis.

Sim, um jedi. Igualzinho ao de Star Wars. Com super poderes, capacidade de atravessar paredes, aquela coisa de convencer as pessoas a não fazer o que elas queriam, encontrar pessoas em longas distancias entre outras coisas.

Foi uma boa a sacada de ter McGregor no elenco, em especial na cena em que Clooney fala pela primeira vez sobre os jedis e ouve de McGregor “você não pode ser um jedi”. Se você não vive na terra, saiba que McGregor foi um jedi na nova trilogia Star Wars.


O filme então se divide entre os eventos de uma missão que Lyn e Bob (agora envolvido na coisa, e em busca de uma história) e flashbacks contando sobre a montagem da equipe chamada de Exercito da Nova Terra, que pregava a paz e toda aquela coisa hippie.

Potencial tinha certo? Ia ser hilário ver as tentativas de Clooney em se passar por jedi usando seus poderes. Mas Heslov (diretor) e Straughan (roteirista) optaram por um road movie esquisito que nunca chega a lugar nenhum e só vai irritando o espectador.

Os momentos menos maçantes são os flashbacks, onde dá pra notar que Bridges vive mesmo um momento especial, já que mesmo copiando vários trejeitos de seu “Dude” ainda sim se sai razoavelmente bem. Clooney, (no flashback usando uma peruca ridícula) que deveria ser o astro do filme, me pareceu que assim como o público foi se decepcionando com o filme. Ele vai “murchando” e a cada tomada vai piorando. Um dos papéis mais fracos do ator.


McGregor é outro que faz coro com o resto do elenco e mantém a mediocridade em alta, assim como Kevin Spacey (olha o elenco desse filme) que faz o “vilão” do filme, numa atuação patética.

Heslov (que pra quem não lembra foi coadjuvante em True Lies e era o roteirista de Boa Noite e Boa Sorte) não conseguiu fazer de seu “Frankenstein” que mistura M.A.S.H., Três Reis e os filmes dos Irmãos Coen um filme interessante.


Falho na condução, e muito irregular no ritmo, Homens que Encaravam Cabras é mais um filme que entra pra lista de boas idéias que foram incompetentes em sua condução esse ano.

segunda-feira, 29 de março de 2010

A Caixa
(The Box, 2009)
Thriller/Ficção Científica - 115 min.

Direção: Richard Kelly
Roteiro: Richard Kelly

Com: Cameron Diaz, James Marsden e Frank Langella

Richard Kelly é uma das pessoas mais egocêntricas e prepotentes da história do cinema. Só isso pode explicar seus dois últimos filmes. O medonho Southland Tales e o mediano A Caixa. Em ambos ele não consegue contar uma história sem apelar para reviravoltas mirabolantes e explicações estranhas e sem sentido. Tá certo, Southland Tales talvez seja um dos piores filmes da história recente e qualquer filme comparado a esse já sai ganhando de uns 10 a zero, mas A Caixa, é mais um dos fracassos do ano e mais uma boa idéia mutilada e estragada por seu diretor e roteirista.

Tudo começa até bem, com uma caixa largada na porta de um casal comum (Cameron Diaz e James Marsden). Dentro dela existe um dispositivo estranho (uma cúpula com o botão vermelho no centro), e uma carta indicando que um tal de Steward apareceria ainda naquela tarde com instruções. Durante o dia somos informados que a personagem de Diaz (Norma) é uma professora de segundo grau que tem uma certa deficiência física (numa cena medonha de tão gratuita e sem sentido) e que Arthur (Marsden) trabalha na NASA, numa das filiais em Langley, onde se passa o filme.


Quando o tal Steward aparece ele diz: apertem o botão e alguém que vocês não conhecem morrerá e vocês receberam 1 milhão de dólares (o que devia ser uma grana inacreditável para 1976, época em que se passa o filme). Não apertem e tudo é esquecido. Steward é Frank Langella, que com auxílio da tecnologia tem uma enorme deformidade no rosto, causada por uma espécie de queimadura.

Tirando a cena dispensável que apresenta a deformidade de Norma, a premissa e os primeiros 30 minutos do filme são bem interessantes. E quando pensei que acompanharíamos as discussões entre o casal e os problemas morais que envolvem o ato de apertar o botão, Kelly simplesmente resolve a situação e parte para o “filme de mistério”. O que acontece com a caixa? Quem é Steward? Porque ele faz aquilo? O que acontecerá com Norma e Arthur?


Nada contra, mas quando se caminha nessa direção alguns riscos são corridos. A possibilidade das respostas não agradarem são enormes, principalmente tratando-se de um diretor que adora misturar coisas que não combinam. Ao ver o filme, (e odeio usar outros filmes como comparação, já que acho que cada obra é única, em sua magnificência e mediocridade, mas nesse caso acho que facilita a compreensão), lembrei-me de O Apanhador de Sonhos e principalmente do (com perdão do trocadilho infame) esquecível, Os Esquecidos. Pra quem não lembra é aquele com a Juliane Moore, que tem seu filho seqüestrado e no fim descobre-se que é tudo culpa de et’s.

A comparação cabe, pois, ambos partem de uma premissa interessante para entregarem trabalhos medíocres, cada um com sua particular imbecilidade.

O filme de Kelly peca no ritmo, no atropelo e na quantidade inacreditável de personagens “misteriosos” que surgem na tela. E peca, quase mortalmente, ao explicar os mecanismos da caixa e as motivações por trás do deformado Steward.


Faltam palavras para descrever a colagem de elementos absurdos na tentativa de demonstrar coesão que o diretor usa e abusa. Eu não vou soltar spoilers, mas quem tiver visto o filme e quiser comentar abaixo sobre suas impressões terei o prazer de me estender sobre isso.

Tecnicamente o filme não é ruim. A fotografia que emula os suspenses setentistas é bastante eficiente e talvez seja o único ponto de destaque incontestável. Granulado, mais apoiado pela tecnologia misturando o "clima" de uma década espetacular para o cinema com as técnicas atuais de filtros e coloração.


Por outro lado o que falar dos medonhos efeitos visuais? A impressão é que toda a verba foi gasta na “cara” de Langella e esqueceram que o filme apresentaria pelo menos mais três sequencias com efeitos visuais. As três são dignas de aparecerem num livro de como NÃO fazer efeitos visuais em cg. São dignos de filmes da Saban (lembram dos Power Rangers, então nesse nível) e acabam de enterrar o filme de Kelly.

Outro erro cabal: apostar que o público vai se identificar, acompanhar e gostar de um casal insosso como Cameron Diaz e James Marsden é brincadeira. Diaz, que não é uma atriz ruim, mas é muito irregular alternando atuações consistentes com outras muito fracas, e Marsden que é um eterno coadjuvante. Nem nas cenas mais tensas e que dependiam pouco dos atores, pois toda a situação já era por si só magnética, o casal se sai bem.


Langella, apesar da atuação no automático, é a melhor coisa do filme. O “ar de superioridade” de seu personagem condiz perfeitamente com o que lhe é pedido, e principalmente depois que a tal “revelação” acontece.

É verdade também, que na meia hora final Kelly volta ao clima de análise de comportamento, mas o caldo já tinha sido entornado e assisti ao filme só pra saber o que ia acontecer e pra que lado o barco ia ser tocado.

Kelly está agora, numa “sinuca de bico”. Dos seus cinco filmes, um virou Cult, outro é um dos piores da história e os outros três (A Caixa é um deles) vão pro limbo.


Em 2000, um roteiro de ficção-científica dramática circulava pelo circuito independente de Hollywood. Depois de ser recusado por grandes estúdios, o roteiro foi aceito por Drew Barrymore, dona da Flower Films, que se propôs a financiar o filme. Com orçamento enxuto de 4 Milhões, Donnie Darko era lançado em 2001.

O filme, com uma passagem boa pelo cinema, acabou ficando na memória dos cinéfilos, se tornando um instantânio cult. Assim, estava sacramentada a entrada de Richard Kelly no cinema. O diretor-roteirista, na época com 25 anos, estava sendo moldado para uma carreira vitoriosa. Porém, depois só veio "tragédia" pra carreira do talentoso Kelly. Primeiro, o roteiro do execrável Domino. Segundo, Southland Tales, tido como um dos filmes mais bizarros e pretenciosos da história, envolvendo de fim do mundo até reflexo atrasado no espelho. Mesmo com o baque, Kelly continuou. Agora, surge A Caixa nos cinemas, a chance de redenção dele. Será que houve a redenção?

Bom. Digamos que o talentoso Kelly agora é o pretencioso Kelly.

A trama, baseada no conto do genial Richard Matheson, segue o casal Norma (Cameron Diaz) e Arthur Lewis (James Marsden), dois perfeitos exemplos da classe média do subúrbio americano em 1976. Ela, professora. Ele, engenheiro da NASA. Mas, sua vida sem sal começa a mudar quando a falta de dinheiro aparece e quando um homem chamado Arlington Steward (Frank Langella) bate em sua porta e deixa uma caixa, junto com um bilhete, dizendo que Arlington aparecerá ás 17 horas. Então, quando ele chega faz uma proposta pro casal. Se eles apertarem o botão, duas coisas acontecerão: alguém no mundo irá morrer e eles receberão uma maleta com 1 Milhão de dólares. Logo, eles têm 24 horas pra decidir.

Vendo a trama, dá pra perceber facilmente que nas mãos de um Michael Haneke, de um Park Chan-Wook ou de um Darren Aronofsky, teríamos um suspense psicológico sobre moral e bons costumes, com a tensão lá em cima. Porém, estamos falando de Richard Kelly, que entrou na fase "quero colocar o maior número de referências sci-fi nos filmes". Em A Caixa, temos um absurdo número de referências desnecessárias que só fazem parecer que Kelly é cineasta de um só filme. Quando James Marsden, em uma cena chave que envolve sobrevivência ou escuridão eterna, fica fascinado com o fato na tela e cita Arthur C. Clarke, toda a naturalidade se esvaiz.


O roteiro de A Caixa é o que afunda o filme em mais de 10 momentos. Kelly pega a trama principal, sobre a tal caixa e a resolve em ridículos 20 minutos. A partir daí, começa o famoso "jogo de gato e rato", a "corrida contra o tempo" ou o "vamos desvendar o passado do personagem". O pior de tudo é que esse resenhista, fã de Kelly, resolveu dar uma chance ao filme, afinal, se ele escolheu trilhar o caminho de descobrir o passado de Arlington, que o faça com destreza. Mais um ponto negativo. A trama de Arlington envolve desde experiência pós-morte até os ETs. É a tal mania de Kelly em colocar todas as referências Sci-Fi possíveis. Fora a estrutura, os diálogos de A Caixa são interessantes de acompanhar. Eles vão do sublime (não explicar o que a imagem já diz) ao desatroso ("Você é real?" Cameron Diaz para Langella).

As interações entre os personagens são pontuadas por esse contraste do diálogo, o que torna A Caixa uma experiência estranha e bizarra. Seja para o bem ou para o mal. Mesmo na estrutura, esse contraste é visível. O sublime (o bom final e os mistérios poucos explicados) ao ridículo (o idiota meio do filme). Assim, Kelly continua com o mal de Southland Tales: a pretensão.


Tecnicamente, não há o que reclamar de A Caixa. Kelly tem uma boa direção, posicionando ângulos mais suaves e clássicos. Apesar disso, sua direção de atores é fraca, afinal, ele só consegue extrair de Langella uma boa atuação. A trilha sonora de Win Butler, Régine Chassagne e Owen Pallett é extrema e eleva a tensão com notas clássicas, lembrando os filmes de horror dos anos 60. Cabe como uma boa homenagem, mas artisticamente serve pouco, sendo mediana. Funciona no filme e isso basta.
A edição de Sam Bauer é competente e também ajuda no ritmo do filme. Mas, o ponto positivo extremo do filme é a fotografia de Steven Poster. A aura branca do filme, como se tudo fosse um sonho, é excelente. Fora isso, o excelente filtro de câmeras digitais que Poster usou ajuda na recriação dos bonitos anos 70 americanos. Outro ponto positivo é a direção de arte, que criou um cenário verossímel e bonito para aquela época tão peculiar. Em conjunto com a fotografia, a direção de arte forma o dueto fantástico do filme, talvez uma das únicas coisas que merecem nota em A Caixa.


Em atuações, pouco para se falar. Sem a ajuda de Kelly, que não se esforça em conseguir uma atuação no mínimo aceitável de Diaz e Marsden, todo o elenco se perde. Frank Langella engole qualquer um e demonstra sua competência habitual, mas Cameron Diaz faz uma caricatura mal feita de professora do subúrbio. Suas falas já não convencem sozinhas, quando Diaz abre a boca então... Nem quando ela tem suas expressões com marido e filho ela convence. Com certeza, Diaz pode ser boa, mas com um diretor excelente (Gangues de Nova York) ou quando ela é alívio cômico (As Panteras). Mas o pior, sem dúvida, é o pífio e metido-a-ator James Marsden. Se não bastasse ele ter como maior papel o Ciclope-corno-inexpressivo de X-Men, ele piora em A Caixa. Deslumbrado, bobo e sem convencer por um segundo, Marsden consegue um feito único: ele tem uma expressão só para todos os sentimentos. Quando tá triste, faz cara de bobo. Quando tá feliz, também. Quando raivoso, também. E por assim vai. Apesar da falta de talento, uma parcela da incompetência se deve a Kelly e sua construção razoável de personagens. Enfim, um desastre.
Sendo assim, pode se dizer que A Caixa é execrável para muitos. Porém, o filme tem alguns méritos já citados, como um bom início e um bom final. Fora que, os mistérios poucos explicados da trama não são ridículos e, mesmo sendo chupados de tudo quanto é filme Sci-Fi, não são dignos de apedrejar.



No final das contas, A Caixa é algo pra se esperar o DVD. Apenas um filme que tinha potencial que foi devidamente destruído pela ganância criativa de seu diretor. E aqui fica a torcida por Kelly. Ele tem 34 anos. Ainda dá tempo de se concertar.

domingo, 28 de março de 2010

Legião
(Legion, 2010)
Ação/Fantasia - 100 min.

Direção: Scott Stewart
Roteiro: Peter Schink e Scott Stewart

Com: Paul Bettany, Lucas Black, Tyrese Gibson, Adrianne Palicki, Dennis Quaid

Resenhar um filme de ação é quase tão perigoso quanto escrever sobre um filme mundialmente reconhecido, um cult amado por muitos ou sobre uma bomba anunciada. O óbvio ao escrever sobre esse tipo de produção é descer a lenha nas atuações, falar sobre as sequencias de ação e por fim, dizer no alto da empáfia, “é um diversão passageira”.

Legião poderia se encaixar perfeitamente em cada um dos comentários acima, porém, por alguma razão doentia, eu gostei razoavelmente do filme, a ponto de considerá-lo meu “guilty pleasure” do ano.


Guilty Pleasure, pra quem não tem familiaridade com o termo, é aquele filme que você sabe que é ruim (às vezes o mundo todo sabe) mas que por algum motivo você acaba simpatizando com ele ou mesmo gostando.

Não cheguei a gostar de Legião, mas longe de achá-lo detestável, ainda mais quando sabe-se a proposta do filme. Legião é uma brincadeira, e nem quer ser levado a sério, nem se esforça para isso, portanto analisar o filme com os mesmos critérios ou visão que talvez avalia-se um filme que tivesse a petulância de se vender como um “novo clássico da ficção científica” ou “épico moderno” ou qualquer outra coisa, é uma tremenda perda de tempo.


Legião é a história da revolta do anjo Miguel, que não gosta da atitude de Deus que fica de saco cheio dos homens e decide acabar com tudo. Porém ainda existe uma salvação, uma criança na barriga de uma garçonete que mora/trabalha num boteco no meio do nada no deserto americano.

Enfim, não é uma história que vá mudar a vida de ninguém, ou fazer alguém amar o cinema a partir de seus fotogramas.

Diferente, por exemplo do recente Simplesmente Complicado, que tenta a partir de um fato corriqueiro e até certo ponto comum a muita gente (separação e a convivência entre os “ex”) fazer graça. Pra fazer graça com coisa “séria” tem que ser gênio, senão soa forçado e chato.


Fazer graça sobre anjos e metralhadoras, um messias na barriga de uma garçonete, uma velhinha sangue suga e um sorveteiro do mal, não requer tanta genialidade. Requer algum senso estético, alguma habilidade com câmeras, uma boa noção de fotografia e enquadramentos e só.

O filme não é nada mais do que uma re-edição de dois filmes muito melhores que a mistura que o diretor Scott Stewart (um especialista em efeitos visuais, tendo seu segunda oportunidade como diretor) conseguiu: Anjos Rebeldes, um filme Cult (e muito bom) dos anos 90 que versava sobre uma guerra celestial entre anjos e demônios pela posse de uma mulher (o elenco tinha Christopher Walken, Viggo Mortensen, Elias Koteas e Eric Stolz) e Assalto ao 13º DP (o original de Carpenter e o remake com Ethan Hawke) que se passava em um lugar fechado por 90% do tempo, onde um grupo de pessoas (bandidos e policiais) tinham que enfrentar outros que tentavam invadir a delegacia (daí o título).


A mistura torna-se indigesta em alguns momentos, principalmente ao errar na composição dos personagens principais, que não são carismáticos, fazendo com que suas mortes (e varias acontecem como manda a cartilha) não sejam nem lembradas. Como em todo filme de grupo, sempre existe o cara misterioso, o mocinho que rejeita o rótulo, aquele que se sacrifica "pelo bem maior" e o traidor, e como todo clichê dos filmes de ação, os epílogos desses personagens também são os esperados.

As interpretações condizem com o roteiro. São fracas, limitadas e sem brilho. Bettany tenta compor seu personagem como um bad-ass com coração. Quando ele é o bad-ass até funciona, quando ele mostra o coração falha grandiosamente. Lucas Black, o mocinho, é fraco até dizer chega, e não é nesse filme, mas uma constante. O mesmo vale para Adrianne Palicki (a garçonete grávida) que é limitada e passa o filme todo sentindo pena de si mesma. E Dennis Quaid repete seus personagens, e se auto parodia.


Outro problema grave, e que já era esperado, é a qualidade (ou melhor, a falta de) dos diálogos. Quase todos medíocres ou auto-explicativos. E tome cena de arrependimento do pai com o filho, de revelações sobre o passado contadas para um completo estranho, e o fato de pessoas que se conhecem a menos de um dia, se importarem de forma doentia por outros estranhos a ponto de arriscarem suas vidas para salvá-los. Enfim, tudo o que já conhecemos num bom (ou péssimo) pipocão.

Mais então, porque esse filme não merece um fraco, ou ruim... ou mesmo um sofrível ?

Porque no cerne da questão, é divertido e é verdadeiramente descompromissado. Dentro da sua proposta (tacanha é verdade) cumpre bem o seu papel. Estão lá, efeitos convincentes (mais que poderiam ser melhores), uma fotografia inteligente (abusando das cores do deserto), um anjo bad-ass, algumas sequencias (como a da velhinha e do soverteiro já citadas) divertidas e uma boa dose de ação. Ligeiro, totalmente esquecível e até idiota, mas divertido. Cinema McDonald’s da melhor qualidade.

sábado, 27 de março de 2010

Amelia
(Amelia, 2009)
Drama - 111 min.

Direção: Mira Nair
Roteiro: Ronald Bass e Anna Hamilton Phelan

Com: Hillary Swank, Richard Gere, Ewan McGregor

Filmes biográficos costumam se dividir entre dois grandes grupos: os que apostam na transformação do ator/atriz que interpreta o biografado e os que apostam no melodrama como forma de atingir diretamente as pessoas. Entretanto, não é incomum que as duas “receitas” se entrelacem. Afinal, Ray (por exemplo), contou com Jamie Foxx incorporando Ray Charles e ainda assim apelou para o melodrama. Outro exemplo é Touro Indomável, onde é impossível esquecer a transformação de DeNiro em LaMotta (para detalhes sobre o filme, leiam o texto sensacional do Fabio no blog Dr.Frame) e mesmo assim Scorsese usa do melodrama (e a palavra, apesar do que muitos pensam não é pejorativa) para contar a história sofrida e doentia de seu personagem. Ambos são exemplos de boas biografias (Ray menos) que foram ancoradas nessa mistura.


Existem outros que preferem apostar em apenas um dos quesitos. Essas geralmente não se saem tão bem, pois é quase obrigatória a necessidade do público em ver retratado na tela alguém que consigam gostar, entender, ou mesmo odiar. A frieza de uma recriação se não for amparada por uma boa história não funciona. E vice-versa. Não adianta nada uma excelente história se o biografado pouco tiver a ver com o que é retratado. Mesmo nos casos mais herméticos (Não Estou Lá, entra como um dos maiores representantes disso) a identificação do personagem é necessária.


E pra que eu escrevi dois enormes parágrafos de teorias saídas da minha cabeça, se a resenha fala de Amelia?

Simples. Amelia se enquadra no entrelace entre os dois elementos mais comuns em biografias, porém com resultado que beira o catastrófico.

A começar pela caracterização. Se você conhece Hillary Swank (que interpreta Amelia Earhart) sabe que a atriz é capaz de Meninos Não Choram, Menina de Ouro e Dália Negra como também é responsável pelos medonhos O Núcleo, O Dom da Premonição e A Colheita do Mal. Ou seja, apesar de dois carecas na bolsa, a atriz é irregular. E irregularidade é o que marca a caracterização da aventureira Amelia Earhart, a primeira mulher a atravessar o oceano atlântico de avião. Em momento algum vemos “alguém”, vemos ações. Ela quer voar, e pronto, voa. Ela se envolve com o personagem de Gere (mal desde O Vigarista do Ano) e sem motivo algum (simplesmente por que se encheu?) muda de idéia e flerta com o personagem de McGregor (estranho vê-lo num filme tão ruinzinho), que é pai do pensador Gore Vidal.


Aliás, o filme mostra em três cenas absurdamente desnecessárias, o suposto “amor” de Amelia pelo garoto. Se Amelia gostava de Gore, tudo bem, mas isso (no filme) ficou jogado. Não existe, novamente, uma motivação convincente.

Outro grande problema é a opção da diretora Mira Nair e dos roteiristas Ron Bass e Anna Hamilton Phelan, em usar um determinado evento da vida de Amelia (apesar de biografia, não vou contar o que acontece) como linha inicial de narração, entrecortando com uma infinidade de flashbacks, retratando o passado da protagonista. São muitas datas, lugares, e eventos que poderiam ser amarrados de forma linear que não fariam a menor diferença. História a serviço de estilo.


O roteiro também falha ao ignorar completamente a infância e adolescência de Amelia (que é retratada em uma mísera cena, que “explica” o seu amor pela aviação) e apresentar a personagem adulta e “pronta”. Não que isso deva ser uma obrigação, mas nesse caso fez falta, já que se a opção de Nair (clara) é apostar no melodrama, nada funcionaria melhor do que mostrar o desenvolvimento da personagem (mesmo que nos já “xingados” flashbacks), o que causaria uma melhor identificação dela com quem vê.

Amelia parece quase robótica, e os eventos de sua vida são contados quase como um jogral (alguém ainda lembra disso?). “Dia tal, ela fez isso” e assim sucessivamente. Tudo fica jogado, e nesse caso seria muito mais interessante, recorrer a internet e procurar na Wikipédia os feitos da aventureira.


Tecnicamente o filme faz o feijão com arroz (sem sal ainda por cima) quando aposta em tomadas aéreas, e peca muito ao apostar numa sucessão ridícula de “nuvens” que mostram como o céu e lindo e como (para a personagem) voar é um sonho. Gratuito, chato e mal-feito.

No terceiro ato do filme, a diretora aposta numa tentativa infeliz de criar tensão que é tão bisonha que dá sono, além de apresentar uma das piores atuações de uma "equipe militar" que já vi num filme americano.


Mira Nair perdeu uma grande oportunidade de transformar a vida de Amelia em um produto visual interessante e que despertasse o interesse no público de conhecê-la mais. Toda grande cine-biografia deveria despertar isso em seu público. Como Amelia passa longe disso, natural que entre para o infame hall dos filmes medíocres.


sexta-feira, 26 de março de 2010

Julie & Julia
(Julie & Julia, 2009)
Comédia - 123 min.

Direção: Nora Ephron
Roteiro: Nora Ephron

Com: Meryl Streep, Amy Adams, Stanley Tucci e Chris Messina

É curioso como numa temporada de filmes tão interessantes alguém pode realmente considerar Julie & Julia um filme “oscarizavel”. E falo isso com impressões positivas do filme. Julie & Julia é “bonitinho”, é um filme gostoso de ver se você não tiver grandes pretensões e funciona muito porque apesar de sua simplicidade e falta de pretensões não ofende a inteligência do espectador. Ele é uma comédia levemente (bem levemente) dramática e faz isso com competência. Mas está longe de merecer receber ovações, ou mesmo de apresentar um papel verdadeiramente bom de Meryl Streep.

Baseado em duas “histórias reais” inter-relacionadas, o filme fala do período em que Julia Childs, a primeira mulher a apresentar um programa de culinária da TV americana e de ter “ensinado” a mulher americana a comer com classe e estilo a partir de seu livro “Mastering the Art of French Cooking”, viveu na Europa preparando seu debut como autora. Ao mesmo tempo baseia-se na experiência da escritora e blogueira (olha a “categoria” representada) Julie Powell que dedica um blog a narrar suas aventuras ao cozinhar todas as receitas de Child armazenadas no tal livro no período de um ano.


Plot legal. Funciona como um mix de biografias, narradas de forma paralelas e de forma com que as narrativas se misturem e se “expliquem”. Exemplo: Julie se vê como incapaz de alguma coisa, e na historia de Julia a mesma também se vê da mesma forma. O que o roteiro de Nora Ephron (também diretora) parece querer dizer é que as duas mulheres são “farinha do mesmo saco”. Em resumo, são mulheres que se encontram e a seus talentos pelos caminhos tortuosos da vida.

Das duas historias, a que mais me agradou foi a de Julie (a cada vez mais interessante Amy Adams de Dúvida e Encantada), que funciona divinamente em especial quando aborda o “mundo blogueiro”. O que escrever? Quando escrever? Será que alguém lê o que eu escrevo? Será que alguém vai ler e, melhor, comentar? Tudo isso é abordado de maneira leve durante o filme.


Julie é uma funcionária do governo que trabalha com os seguros das vitimas do 11 de setembro, e que encontra uma válvula de escape quando cozinha. E como cozinha. Sempre que você assistir a um filme culinário de barriga vazia, existe uma enorme chance de a) sua nota pro filme aumentar pelo seu deslumbramento e b) você se pegar comendo qualquer coisa só pra matar a fome.

Julia (Meryl Streep) é a mulher de um adido cultural (Stanley Tucci, especialista em papeis leves em comédias igualmente “light”) que, uma vez em Paris, aprende todo tipo de coisa até se dar conta que verdadeiramente amava cozinhar e que é isso que deveria fazer. A narrativa de Julia é mais corrida e episódica, em razão da divisão do filme em duas partes e pelo exercício hercúleo de Ephron em resumir a fase mais importante da vida de uma pessoa em cerca de 60 minutos (o filme tem 123 minutos).


Ephron acerta (eu disse que o filme era bonitinho e funcionava) quando não tenta mostrar a vida colorida e perfeita e foge (como torci pra isso) do eventual encontro entre as duas. Em lugar disso ela prefere manter a aura mítica de Child intacta e faz de Julie mas do que uma fã, uma verdadeira expert em sua ídola.

Porém, o filme (e Ephron) erram bastante quando transformar a personagem de Child em uma quase caricatura. A todo momento ela é exagerada (e o filme adora enfatizar seu tamanho e seus modos desajeitados) e Meryl Streep erra feio ao compor a personagem dessa maneira. Longe de seus melhores momentos, a atriz entrega-se a farsa e ao tragicômico e esquece que além de ser uma pessoa tridimensional, ela representa alguém que realmente existiu.

E não, nunca vi Julia Child, mas me recuso a crer que alguém pode ser tão “over” em quase todos os momentos de sua vida.


Em compensação gosto cada vez mais de Amy Adams, que transforma sua personagem cheia de pequenos problemas muito humanos (stress, falta de tempo, falta de confiança em si mesma, medo de não conseguir vencer, medo de se manter eternamente presa ao nada, medo de envelhecer fracassado) numa criatura adorável e cheia de paixão pelo que faz. Cada prato preparado é uma vitória pessoal e uma nova rocha escalada em sua tentativa de reencontrar sua alto-estima. Se o filme fosse somente baseado no livro de Julie, com Julia sendo usada como personagem oculto; aquela sombra que paira sobre os personagens os inspirando, gostaria muito mais.

Ao fim da projeção, fico com a impressão que faltou tempo a Julie e que o tempo de Julia foi (sendo generoso) mal conduzido, mesmo com a bela reconstrução de época e com algumas (poucas) piadas e situações que roçam no realismo. Mas quer saber, o filme não se vende como sério e uma avaliação assim iria contra a própria proposta do filme.


Um dos maiores erros (a meu ver) de críticos por ai é a intransigência na crítica. Em outras palavras, não podemos ter o mesmo grau de exigência com filmes que “imploram” para não serem levados a sério. Em compensação, atrocidades como Transformers 2 (que apesar de serem claramente imbecilizantes, mesmo nesse nível, ofendem a inteligência de qualquer ser vivo) não merecem defesa pois querem ser algo que nunca poderão ser: bom entretenimento, pois não acreditam em seu próprio público.

Julie & Julia passa raspando nesse teste. Entretem e sabe muito bem a quem se destina. Um mérito e tanto numa indústria cada vez mais pretenciosa.