terça-feira, 30 de novembro de 2010

Battle Royale
(Batoru Rowaiaru, 2000)
Ação - 114min.

Direção: Kinji Fukasaku
Roteiro: Kenta Fukasaku

Com: Tatsuya Fujiwara, Aki Maeda, Tarô Yamamoto, Chiaki Kuriyama

Para analisar um filme adaptado de uma fonte externa, seja livro, animação, quadrinhos ou mangás, geralmente se faz o seguinte exercício: ler o material original e interpretar as mudanças feitas pela equipe de produção ou ignora-se o material original e julga-se a obra por seus próprios méritos.

Na maioria das vezes - comigo pelo menos funciona assim - o acesso (a exceção de adaptações de filmes mais populares) ao material original dificilmente acontece no período em que o filme é lançado, ou visto. As editoras costumam aproveitar o "embalo" do filme e lançam o original para capitalizar em cima.

No caso de Battle Royale, um famoso mangá, eu tive acesso e consegui ler o material que serve de base para o filme antes de ver a produção audiovisual.


A boa crítica - pelo menos a "escola" que sigo - diz que não é correto analisarmos um filme como comparativo direto do material em que ele se baseia. Em outras palavras, o filme deve se bastar. Ele tem que cativar aquele que leu e aquele que não leu, não por ser baseado em x ou y, mas por apresentar qualidades como produto cinematográfico ou televisivo.

Mesmo assim, é sempre interessante situar aquele que leu - e aquele que não leu também, caso queira ir atrás do material original - sobre as mudanças, acréscimos, erros e acertos diante da obra original. Minha experiência com o mangá de Battle Royale foi bastante visceral. A narrativa e a história sórdida me pegaram pelo colarinho não dando chance de escapatória. Battle Royale trata de um jogo doente elaborado pelo governo, que seleciona "na sorte" uma classe de estudantes colegiais para participarem de uma competição que visa à sobrevivência. Todos são jogados nessa ilha e devem se matar - literalmente - até restar apenas um. Esse por sua vez será declarado vencedor e poderá retornar ao convívio da sociedade. O mangá segue as intrigas, disputas dos mais de 40 personagens, todos com algum tipo de destaque por longos dez volumes.


Os problemas em Battle Royale (o filme) são muitos. Na questão da adaptação do material original, uma série de liberdades foi tomada para aliviar o tom do mangá, que é violento e sexualizado em níveis altíssimos. Compreensível, sem dúvida, mas ao "limar" algumas seqüências, em especial as que envolvem a personagem Mitsuko, o filme perde a chance de explorar com mais força essa personagem, por exemplo. No filme Mitsuko é uma garota violenta e só, seu background é apresentado de forma "leve" e suas motivações nunca ficam claras. Outro problema é a mudança total na personalidade do diretor do jogo, Battle Royale. No mangá, ele é vil, cruel e quase caricatural, mas naquele contexto utópico funciona bem. No filme, apesar da utopia ser mantida, o personagem ganhou mais "cores" e um contexto diferente, dando a ele mais tridimensionalidade - o que é bom - mais influindo diretamente no desfecho - risível - da produção. Talvez o fato do grande Takeshi Kitano (homenageado com seu nome dando batismo ao personagem) ser o interprete tenha feito com que essas mudanças fossem realizadas.

Mas esses são apenas problemas que o leitor do mangá vai descobrir, já que não alteram a narrativa. Para os que não leram os problemas são ainda piores.


Primeiro que no afã de adaptar a obra da melhor forma possível, recorre-se ao clichê número zero em adaptações de obras com grande apelo popular: o efeito "melhores momentos". Pouco importa o foco em 5 ou 6 personagens mais importantes, mas em mostrar todos eles, assim como o mangá faz. Se tivéssemos falando de uma série de TV, com tempo para esse tipo de apresentação, funcionaria muito bem, mas com pouco mais de duas horas de filme, tudo surge corrido e desnecessário, fazendo o diretor ter de recorrer a flashbacks para demonstrar algum carinho com aqueles personagens. Flashbacks que não causam nenhuma sensação no espectador, já que aqueles personagens aparecem e somem com a mesma velocidade com que morrem. Um erro crasso e que derruba qualquer tentativa de proximidade do espectador com aquela gente.

O ritmo, resultado direto dessa escolha, é claudicante durante toda a produção. Se o começo do filme inspira o espectador a torcer por aquele pessoal (usando um recurso manjado mais necessário de apresentação nominal de diversos personagens), isso vai morrendo quando as diversas questões interessantes apresentadas são descartadas de maneira vazia.

Mais se o objetivo do programa é que eles morram, porque isso seria um defeito?


É um defeito na medida em que o protagonista não consegue convencer o espectador. Shuya (que serviria como protagonista) é "assombrado" com a morte do pai e com diversos flashbacks desnecessários e alguns até bobos que o "inspiram" a seguir em frente. Kawada que deveria ser a figura forte que contrabalancearia a doçura - sem trocadilhos gays - de Shuya também é subaproveitado assim como Noriko, a protagonista feminina. Todos eles não conseguem apresentar diálogos que convençam quem está assistindo de que eles realmente se importam uns com os outros. Tudo é tão exageradamente melodramático e apresenta um festival de "quem você está apaixonado" e "gosto de você e vou ficar em pé até te salvar" , numa tentativa patética de dar alguma profundidade ao filme.

Apesar de com a contagem de corpos cair, a questão narrativa melhorar - tornando-a mais fluída - ainda sim esses excessos e essa tentativa de ser profundo e de discutir o papel dos pais e a "revolta" dos adolescentes é patética. Vende uma violência que não se justifica, um exagero dramático que é pior do que os apresentados pelos participantes de reality shows (que no fundo é Battle Royale, pelo menos no mangá) que com um dia de convivência fazem juras de amor entre si. A inteligência critica que o mangá usa com parcimônia, apresentando motivações doentias do governo e mídia, no filme é descartado.


Não se sabe exatamente o porquê existe esse jogo (no filme), além das medíocres apresentações gráficas no início do filme, que são genéricas.

Os atores, quase todos são limitados. Ou por sua falta de talento e carisma, ou por seu tempo de tela. Outros como é o caso do interprete de Kuryiama (de grande importância no mangá) são rasos e vazios, não cabendo nem uma análise de seus papéis no filme. As interpretações seguem o exagero e a falta de timing entre os interpretes é absurda. Destaco a seqüência no farol, onde fica claro a falta de capacidade das seis atrizes presentes. Uma seqüência com muita tensão, acusações e armas em punho, que não ofende, não agride e nem trás compaixão.


Battle Royale, o mangá, é subversivo. Agride os olhos, a mente e faz pensar quando a leitura se encerra. O filme parece um decalque mal realizado. Se o objetivo era "chocar", a violência presente não assusta uma criança de dez anos, se a idéia era "discutir" não consegue, já que o filme se auto-sabota ao não conseguir dar profundidade nem mesmo as relações de seus personagens que já se conhecem e se a idéia era fazer do filme um filme de ação teen, igualmente falha, já que a ação apresentada é genérica e vista antes - e depois - de forma mais bem realizada.

O que resta do filme é uma bela idéia - retirada do mangá - que não conseguiu ser bem realizada, pelos inúmeros motivos que descrevi acima. Sobra ainda a certeza que certas obras mais longas e mais restritas talvez não funcionem no audiovisual ou apenas como uma série de TV, com mais tempo para que o espectador consiga entender aquele universo e conhecer aqueles personagens.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010


72 Horas




O novo filme do oscarizado Paul Haggis tende, infelizmente, a ser seu pior filme. Os relances de suspense de ação, com uma trama não muito convincente e os tiques de filmes de corrida contra o relógio podem prejudicar muito o que se espera de um filme de Haggis, conhecido pela sua pesada dramaticidade imposta, tão grande e competente que fez de Cassino Royale um dos melhores filme do 007. Porém, pode também acontecer que Haggis dê um passo a mais em sua carreira, dando um ar artístico a um gênero cansado como o thriller de perseguição. Agora é esperar e ver o que Haggis fará com sua primeira trama realmente de suspense, sem todo o drama de Crash e Menina de Ouro.


sábado, 27 de novembro de 2010

Scott Pilgrim contra o Mundo
(Scott Pilgrim vs the World, 2010)
Ação/Comédia - 112 min.

Direção: Edgar Wright
Roteiro: Michael Bacall e Edgar Wright

Com: Michael Cera, Mary Elizabeth Winstead, Kieran Culkin, Alison Pil, Mark Webber, Johnny Simmons, Ellen Wong, Anna Kendrick, Brandon Routh, Chris Evans, Jason Schwartzman


Falar sobre cultura pop e atingir ao público que devora games, quadrinhos, tecnologia, música e cinema nos anos 2000 é um trabalho hercúleo. Saber quais botões apertar sem parecer desesperadamente deslocado e conseguir a atenção de uma geração que foi criada - e até nascida - sob as asas da "novidade da semana" é cada dia mais raro. São chamados geração Y.

Scott Pilgrim contra o Mundo é - e não tenho o menos medo de afirmar categoricamente isso - o melhor exemplar cinematográfico para essa geração geek. Curioso que num mesmo ano, dois filmes tiveram a audácia de assumir descaradamente que eram dirigidos ao mesmo público ruidoso. O primeiro foi o já comentado por aqui - e em milhões de outros lugares - Kick Ass. Diferente de Kick Ass que parodiava os heróis sem grande pretensão de adequar sua linguagem visual a seu público, Scott Pilgrim, além de rechear suas duas horas de ação ininterruptas com cultura pop na veia, teve a inteligência de apresentar-se visualmente interessante para seu público.

Cortes secos, passagens "estúpidas", efeitos visuais integrados diretamente as seqüências de ação e uma fabulosa habilidade de transformar uma premissa risível (garoto tem de enfrentar os sete namorados super poderosos de sua atual namorada) em uma cativante história, nada pretensiosa, mas extremamente eficiente.


Sobram elogios a toda equipe de produção. Bill Pope é um monstro. Simples assim. O que ele consegue fazer em termos visuais é verdadeiramente impressionante. É daqueles filmes que seu queixo vai cair a cada dez segundos com o trabalho monumental de efeitos visuais, design de produção (Marcus Rowland) e afins.

A começar pela impagável seqüência ao som de um Nintendinho oito bits no logo da Universal, passando pela inacreditável cena da batalha de bandas emulada com avatares monstruosos e as diversas referências aos games e quadrinhos. Outra questão fundamental é sua montagem magnífica (Jonathan Amos e Paul Machliss) que atinge no peito seu público alvo. Rápida e bastante inteligente, ela não perde tempo expondo nada mais do que ele - filme - julga ser necessário.

Mas nada dessa impressionante apresentação valeria de nada caso a história - aparentemente boba e nonsense - não funcionasse e fosse minimamente interessante. Ela é. E, além disso, recheada de um bom humor e de um timing único na recente safra de filmes blockbusters. A relação quase obsessiva de Scott por Ramona - sem nenhuma motivação lógica - é um simulacro nerd do que conhecemos como paixão. E sua curva dramática - chamemos assim - é sim perceptível. Um rapaz que surge em tela como um rapaz pós-adolescente com medos e traumas em suas relações termina conhecendo melhor a si mesmo e sabendo lidar com esses problemas. Nada verdadeiramente profundo, mas ideal para a geração a que se dedica.


A geração Y, entre muitas outras características, é conhecida por seu desprendimento dos detalhes e sua ansiedade quase doentia. Natural então mostrar as relações de forma - apesar de caricatas - ágil e apresentar as trocas de parceiros como algo natural e que - em especial no caso de Ramona e Scott - acrescentam valores e criam marcas e cicatrizes.

Os atores desempenham seus papéis com segurança. Michael Cera é a âncora que nos faz fincar os pés na terra firme. Seu trabalho contido é deslumbrante. Seu Scott Pilgrim é o verdadeiro herói de uma geração, sem as horas "perdidas" em academias, ou a pseudo virilidade dos heróis de ação dos anos 80. Gostando ou não, o ator representa seu público e é encarado assim pelos estúdios. Além dele, desfilam pela tela uma infinidade de participações especiais inteligentes e divertidas. Desde Brandon Routh - num mix de emo com Goku de Dragon Ball - a Chris Evans - divertindo-se muito como o astro de ação skatista - e o sempre (ou quase) eficiente Jason Schwartzmann como o empresário bad-ass Gideon. Isso sem contar Kieran Culkin, hilário como o companheiro de quarto gay de Scott (um detalhe interessante e que merece comentários é a normalidade positiva com que o filme encara o homossexualismo), a engraçadíssima Ellen Wong, como a maluca Knives, Mary Elizabeth Winstead como a mais que deslocada Ramona Flowers e a hilariante Alison Pil como a baterista Kim.


A trilha sonora (Neil Gordich) é genial e uma das mais empolgantes do ano. O fato de Scott fazer parte de uma banda ajuda muito, mas de qualquer jeito, as músicas e a forma como a trilha é usada no filme é outro acerto colossal. As músicas da banda tem a assinatura de Beck (aquele mesmo).

Scott Pilgrim, apesar de não querer ser encarado como nada mais do que uma diversão descompromissada e leve, é uma excelente maneira de uma parcela cada vez maior de jovens se identificarem com um casal na tela. Seja pelas roupas, o som ou mesmo a forma natural com que os relacionamentos são apresentados na trama. Fugindo do óbvio melodrama das comédias românticas açucaradas e destinadas a donas de casa entediadas ou a namoradas sonhadoras, Scott Pilgrim é a comédia romântica mais pop da história do cinema. Romântica e pop na medida exata para seu público, diferente de todas as gerações anteriores.


Por que?

Vivemos num mundo onde pouquíssimas pessoas namoram e casam com apenas uma pessoa. Vivemos num planeta interconectado com todos. A vida virtual deixou de ser virtual há muito tempo, e cada vez mais nos vemos usufruindo as redes sociais da mesma forma que nossos pais aguardavam por telefonemas, e nossos avós por cartas. Faz parte da evolução da sociedade e das tecnologias criadas pela mesma. Negar isso, e dizer simplesmente que os jovens trocaram suas vidas reais pelas virtuais é - além de um argumento que nega completamente a afirmação sobre a frivolidade de seus relacionamentos, ou esses jovens namoram e transam com robôs? - uma mentira. Somos ligados a uma rede de conexões que nos permite viver em contato com quem quisermos da forma mais ágil e incrível do que em qualquer outro momento da história.

É claro que existem excessos. Mais eles existem na história da sociedade em todos os lugares e sobre todas as mídias. Quando a TV surgiu, pipocavam "teorias" dizendo que a exposição maior do que determinado número de horas prejudicaria eternamente os olhos ou coisa que o valha. O mesmo foi feito com os games, e num passado longínquo com os quadrinhos e numa eternidade sombria e esquecida, com os livros e o conhecimento.


Apurem a sensibilidade de seus ouvidos para ouvirem ao fundo a nova geração. Eles chegaram, e venceram. E Scott Pilgrim contra o Mundo será uma de suas bandeiras.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010


Rabbit Hole



O novo filme do ousado diretor John Cameron Mitchell, de Shortbus, é baseado na peça de David Lindsay-Abaire e é roteirizado pelo mesmo. Para os fãs do Homem-Aranha, David era o responsável pelo roteiro do reboot até James Vanderbilt escrever a versão final. Nicole Kidman é uma mãe que tem que superar a perda do filho e Aaron Eckart faz seu marido. O trailer é montado de forma concisa, apresentando um ritmo lento e diálogos poderosos que são elevados dramaticamente pelas atuações. Nesse caso, é o filme para Kidman brilhar e isso pode implodir ou tornar o filme memorável. O trailer é competente e é um dos grandes filmes que prometem para o fim de 2010.


quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Porco Espinho
(Le Hérisson, 2009)
Comédia/Drama - 100 min.

Direção: Mona Achache
Roteiro: Mona Achache

Com: Josiane Balasko, Garance Le Guillermic e Togo Igawa

Paloma tem onze anos e desiludida com seu futuro como uma adulta condenada a uma vida mundana decide se matar no dia em que completaria doze primaveras. Mas antes, decide deixar registrada sua história por meio de um filme caseiro, que acompanha sua vida e sua família.


Esse é o plot básico dessa pequena jóia chamada Porco Espinho, um trabalho de muito esmero de Mona Achache - também roteirista - que faz de seu filme uma mistura sutil e inteligente de comédia dramática e filme de arte, tudo bem dosado e palatável para os fãs de cult movies e para os que gostam de boas histórias humanas.

Não é um filme de grandes momentos isolados, mas um conjunto que faz desse pequeno projeto uma bela história sobre aceitar quem se é e abrir-se para o novo, sem temer conseqüências.



O mais importante é que esse é uma produção essencialmente calcada em seus personagens. Paloma é apresentada como uma menina absurdamente consciente de seu lugar no mundo, inteligentíssima e que em sua teoria busca uma fuga de sua rotina. Sra. Michel - o verdadeiro porco espinho - é melancólica e, assim como Paloma, consciente de seu lugarzinho no mundo. Porém, diferente da menina, Michel acostumou-se a, em sua função social, ser imperceptível para os moradores do prédio em que é a zeladora.

É ai que surge o "agente do caos". Sr. Ozu - numa óbvia homenagem ao mestre Yasujiro Ozu - um homem vivido, na essência da expressão. Alguém que viveu a vida e com ela aprendeu a se relacionar com os outros e a ver em todos possibilidades e luz. Ver aquele algo mais, que talvez seja o que cada um de nós precise para crermos em nossas capacidades. Ozu é um misto de guru de auto-ajuda com amante a moda antiga, e ajuda da forma mais sensível possível as duas personagens. Paloma em aceitar que sua vida é construída por seus atos, e a Sra. Michel em ver que ela ainda pode ser feliz, não importando qual papel ela representa, mas quem ela é de verdade por baixo da fachada.


A metáfora do Porco Espinho funciona muito bem por isso. As duas personagens - apesar de o filme relacionar o animal a apenas uma delas - podem ser vistas como o animalzinho. Espinhos amargurados e ferozes recobrem a pele do bicho que por baixo - em sua barriga - é sensível e delicado.

Fotografia delicada de Patrick Blossier e mais uma obra de arte musical das mãos do monstruoso Gabriel Yared são destaques técnicos claros.

E é impossível terminar esse texto sem destacar os três grandes trabalhos de Garance Le Guillermic (Paloma), Josiane Balasko (Sra. Michel) e Togo Igawa (Ozu). Uma trinca de ases que além de terem uma química excelente em quadro apresentam excelentes atuações individuais. Garance caminha com extrema habilidade - ainda mais impressionante por sua pouca idade - entre a linha tênue entre a pequena adulta chata e a criança prodígio.

Excelente trabalho. Balasko é sisuda e inteligente o suficiente para ir desmontando sua seriedade com o decorrer do filme, empregando uma transformação maravilhosa do ponto de vista dramático. E Igawa é o melhor do filme, sutilmente ele vai ganhando o coração do público com sua gentileza, bom humor e sensibilidade.


Porco Espinho é uma beleza de exemplar de filme que conquista seu público sem apelar para fórmulas óbvias ou para a excessiva erudição.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Sanctum

A nova produção de James Cameron tem um trailer competente que, apesar de não apresentar muitas surpresas, tem um tema conciso e planos belíssimos (coisa que as câmeras 3D virão a potencializar). Seguindo uma linha que lembra o clássico Das Boot, de Wolfgang Petersen, esse filme deve pelo menos suprir as expectativas regulares que o trailer transmite. Mas fica uma interessante observação aqui: Por que James Cameron deixa seus projetos mais difíceis e cults para os outros diretores hein?
 

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 1
(Harry Potter and the Deathly Hallows: Part 1, 2010)
Ação/Fantasia - 146 min.

Direção: David Yates
Roteiro: Steve Kloves

Com: Daniel Radcliffe, Emma Watson, Rupert Grint, Alan Rickman, Bill Nighy, Helena Bonham-Carter, Ralph Fiennes

Não é difícil imaginar o que passou pela cabeça de J.K.Rowling quando esta começou a saga de sete livros de Harry Potter com um pré-adolescente diante de um mundo inteiro novo a descobrir. A jornada do pequeno bruxo , é - e isto é óbvio - uma metáfora para a vida adolescente, e por isso talvez o produto criado por Rowling faça tanto sucesso e seja tão bem aceito mundialmente. Ao passo que o tempo chega, entretanto, adolescentes crescem, amadurecem, ganham responsabilidades e saem da escola. Não é diferente, portanto, o que acontece com o bruxo inglês criado pela escritora. O último livro da série, lançado há três anos, colocava um ponto final épico na história. Os nossos heróis por fim arranjavam uma solução para seus problemas, saiam da escola , e desafiavam seus inimigos. Neste último livro, que tem grande qualidade por sinal, os garotos que ''vimos'' crescer se tornavam enfim, o mais próximos de adultos o possível.

E se a série foi transformada sem pensar duas vezes em franquia cinematográfica, era preciso empregar a mesma sensação no último capítulo da série de filmes. O tom adulto já foi sendo aplicado a partir do quarto filme, para ser definitivamente explorado no quinto. Assim como nos livros, que passaram por uma sofisticação narrativa a partir do quarto volume, tomando um rumo mais sério do quinto em diante. Agora, no capítulo final, a série iria precisar de mais um ajuste - e ele seria a transformação definitiva de ''meninos'' em ''homens''. Talvez nem tanto na forma literal - eles na história tem apenas 17 anos - mas no modo de se ver o mundo. Tal modo de se ver o mundo também será, querendo ou não , compartilhado por quem assiste ao filme. Muito lógico, portanto, que Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 1 , seja o mais dramático e sério dentre todos os precedentes.


E devido à grande quantidade de informação contida no livro e também por essa mudança de rumo, o episódio final do bruxo nas telas teve que ser dividido em duas partes. Tal atitude tem conotações variadas, tanto para o estúdio quanto para o público. Para o estúdio, dividir o filme em dois é positivo, pois, na lógica capitalista, dois filmes valem obviamente mais que um . Para quem assiste, pode-se dizer um pouco dos dois. É bom por um lado, pois a adaptação terá mais tempo e espaço para transferir todo o conteúdo da obra literária. Por outro, temos um problema que parece até inesperado - a obra isolada perde um pouco de sua força.


A trama segue , como sempre, os nossos três heróis determinados. A diferença é que dessa vez eles estão em posição de xeque - Voldemort (Ralph Fiennes) está com força e influência total para capturar e matar Harry Potter. Isto fará com que ele e os dois amigos - Rony e Hermione - se distanciem da família para a segurança destes. A partir daí, eles precisam por em prática a última esperança que restou para derrotar O Lorde das Trevas - achar as Horcruxes que faltam ser destruídas.


A narrativa em si é deveras diferente das que foram desenvolvidas em filmes anteriores . Apesar do mesmo roteirista (Steve Kloves) estar presente desde o primeiro filme, desta vez ele tem não mais a tarefa de cortar as partes desnecessárias e enxugar as histórias dos calhamaços de Rowling em um longa de no máximo 2 horas e 30 minutos. O estúdio dessa vez deu luz verde para que o filme adaptasse o livro com a maior fidelidade possível, afinal, haveriam dois filmes, e não apenas um. O receio era obviamente apertar muitos acontecimentos e muitas emoções em pouco tempo, e portanto é compreensível e, até certo ponto, sensata a decisão dos realizadores. O resultado, pelo menos para quem leu o livro, é um prazer glorioso de ver páginas e páginas que você passou horas imaginando se concretizando na frente de seus olhos . Diálogos inteiros foram transcritos para o script, e as partes que precisavam ser cortadas ficaram muito bem adaptadas. Até aqui, sem a menor dúvida, é o filme mais fiel á obra da escritora inglesa. Tanto visualmente quanto em estrutura narrativa, há uma fidelidade quase obsessiva com o livro, coisa que só vi em algumas adaptações de HQs. E isso é muito bom.

É também muito bom ver que o roteiro é mais focado no drama, como deveria ser. O rumo da história a partir daqui, deve ser para algo mais adulto, maior e mais sério, sem dúvidas. Assim foi com o livro, e assim segue no filme. A maior parte do filme se passa com poucas pessoas sendo filmadas - basicamente os três protagonistas - em paisagens desertas, como montanhas ,florestas, pradarias. O drama neste ponto é intimista, interessante e muito necessário para a preparação de espírito dos personagens para o que vem a seguir. Como na vida real, é a fase de casulo que vai separar o adolescente do adulto. O livro baseia grande parte de sua história nesse momento, e no filme ele tem essa parte representada com justiça.


Entretanto, se o filme perde em alguma coisa, é na sua divisão. Não é por reclamar de falta de ação - afinal o filme tem seqüências de ação - mas é que o cerne da história, as grandes viradas e grandes revelações se concentram na última parte, que vai demorar ainda um pouco para chegar. Não que este filme tenha menos importância, mas é fato que a parte mais épica fica mais próxima do final, ou seja, na segunda parte. Isso gera , mesmo que num volume quase homeopático, um empalidecer da primeira parte. Ossos do ofício, um problema que nem se baseia no próprio filme em si, mas na expectativa gerada em cima dos dois.

E o papel de David Yates no filme não pode ser ignorado. As seqüências na mata , nos ambientes mais isolados , são quase dignos de filmes independentes, e , portanto, é preciso o mínimo de talento para carregar a narrativa sem perder o ritmo ou deixar o caldo desandar. Yates mostra que tem o necessário para fazer o filme se manter vivo nesse período, e mesmo sem grandes arroubos, demonstra que faz o que é simples bem, e que consegue variar entre o drama de câmera na mão com os close-ups nas correrias. É a sua direção mais comum até aqui, mas mesmo assim continua muito boa. E o que continua muito boa é a trilha sonora. A entrada de Alexandre Desplat não poderia ter sido mais saudável, e mesmo fazendo o que já foi testado - som de violino no grau que indica grandiosidade - ele demonstra ser diferenciado. Ponto para quem o escolheu.



Está cada vez mais próximo o fim da franquia de Harry Potter. E é muito bom saber que ocorreu, como qualquer adolescente, o amadurecimento final, tão necessário. Ele era algo anunciado, e enfim se concretiza. Por fim, resta a nós esperar pelo o último filme da série, que vem daqui a aproximadamente seis meses. Continua. Em breve.


A série Harry Potter é, sem dúvida, a maior da História do cinema, tanto em termos lucrativos como em amor do público. Como o cinema blockbuster ainda se apóia nos adolescentes, espectadores médios que querem apenas diversão, muitas franquias surgem com tramas aventurescas e limitadas, com única e exclusiva função de obter lucros. Transformers é uma delas e, ainda que tenha começado bem, teve uma segunda parte que fez jus a essa ideologia de cinema que só vê lucro. E Harry Potter começou como só mais um filme de aventura, discípulo de Star Wars, baseado numa série de livros que visava apenas um entretenimento passageiro e diversão voltada para o público infanto-juvenil. Porém, quando a escritora J.K. Rowling percebeu que o público que a acompanhava não iria gostar tanto de seqüências desnecessárias que eram apenas "mais do mesmo” (como as séries atuais Crepúsculo e Percy Jackson), resolveu amadurecer. Aproveitando sua competência adquirida com os 3 primeiros livros, J.K. criou O Cálice de Fogo com uma pegada um pouco mais séria. E isso fez um sucesso tão grande que ficou viável criar os 3 últimos livros com um clima bem mais denso.

Como não li nenhum dos livros e apenas vi o 1, o 3 e o 6, não posso afirmar que HP foi muito melhor nos livros que nos filmes (até porque sou a favor de uma pegada mais dramática e adulta no gênero fantasia, como Sandman), mas é fácil constatar que J.K. começou a virar escritora de verdade, romancista, a partir de A Ordem da Fênix. E mesmo que os fãs tenham reclamado tanto dos problemas de fidelidade dos filmes anteriores, é desnecessário comentar que nenhum deles deixará de ir conferir a nova aventura no cinema e encher os cofres da Warner. Mesmo tendo esse pensamento em mente, os executivos da Warner conseguiram unir o útil ao agradável, depois de mais uma bilheteria astronômica no sexto filme (que na minha visão, é bem legal): dividiram HP 7 em dois filmes visando mais lucro e menos sessões de cinema por dia, devido à quantidade grande de informações contidas no livro. E já que é pra dividir, criou uma adaptação literal, segundo meu amigo e co-editor Joaquim, leitor dos livros. Sendo assim, os fãs ficarão satisfeitos ao sair da sessão.


Mas e os não-fãs, como o escritor dessa crítica? Depende do tipo de público. Com certeza os leitores de HP não gostariam do filme se ele não fosse... um HP. O tom sombrio, quieto e bem solitário do filme só funciona com os jovens que acompanharam a série desde 1998(ou 2001, no primeiro filme) por ser baseado no livro do personagem preferido dos juvenis. Praticamente um Road movie com tons de fantasia e umas duas parcas seqüências de ação, HP e as Relíquias da Morte Parte 1 é um passo gigantesco a franquia, se tornando algo a mais que o alegre balé de vassouras dos 3 primeiros, os dilemas dramáticos do quarto e a fantasia séria dos 2 filmes anteriores. Numa análise mais profunda, sem contar com a vindoura segunda parte, o filme poderia até ser considerado como um estudo da solidão de 3 recém-adultos, os limites deles e os dramas de suas vidas. E nesse drama o filme ganha mais pontos, afinal os personagens de HP podem até ser bem-desenvolvidos, mas são em sua maioria, arquétipos com dramas de mesma categoria.

A trama começa com a ameaça de Lord Voldemort (Ralph Fiennes) ganhando proporções épicas, forçando Harry, Ron e Hermione a tomar providências para proteger seus familiares. Com o inimigo se tornando cada vez mais forte, é preciso esconder Harry Potter, que se torna a última esperança da resistência dos bruxos para impedir o reinado de Voldemort. Com a queda do Ministério da Magia e sua posterior reestruturação pelo inimigo, a situação se complica. E os três amigos partem em busca dos únicos artefatos que podem parar de uma vez por todas esses eventos: as horcruxes.


Ressalto novamente que não li o livro, mas quem leu diz que a fidelidade foi obsessiva. Deixando isso de lado, avaliarei apenas como filme. O roteiro, pela sexta vez adaptado por Steve Kloves (depois de uma entrada mal-sucedida de Michael Goldenberg no quinto, fazendo os fãs chiar), é vitorioso em diversos pontos. Sua estrutura é completamente diferente dos anteriores e puxa mais pro lado dramático, quase se esquecendo de toda a desenfreada trocas de magias atiradas pelas varinhas. Há sim os confrontos, todos se encaixando perfeitamente na narrativa, mas eles são praticamente sufocados pelo isolamento que ocupa 75% do filme.

Esse isolamento, presente no livro, se faz necessário justamente para haver o desenvolvimento aprimorado de personagens e a quantidade grande de detalhes que HP 7 oferece. Se o sexto filme apostava num ritmo fluente e drama conciso porém pouco maduro (Hermione chora por Rony, sendo que o Mal está presente no mundo da magia), a coisa se torna muito mais séria aqui. Não só tendo que se preocupar com a ameaça de Voldemort, os 3 amigos agora tem que lidar com os problemas pessoais, que acabam culminando em tocantes sacrifícios, como o feitiço de Hermione em seus pais.


Algumas sacadas do contexto daquele universo colocadas em tela também são interessantes, como a bolsa infinita de Hermione, uma inteligente saída para uma possível falta de continuidade futura, com alguns objetos podendo aparecer sem explicação em tela. Quanto ao ritmo do roteiro, Kloves foi meticuloso. Esse drama todo usado para a construção de personagem, nunca visto na série, é espetacular e torna o ritmo desse filme muito melhor que o dos outros. Essa jornada existencial é interessantíssima e parece retirada de um road movie europeu. A utilização de ambientes abertos, entupidos de natureza em sua forma selvagem, se fazem necessária também como saída narrativa (Hermione imagina os lugares pra onde os 3 vão) e como uma belíssima metáfora da natureza sufocando as personalidades perdidas do trio. E se 75% do filme são nessas partes esplendidamente construídas, os outros 25% são muito bons também, mas é onde residem os típicos problemas da franquia. A memorável seqüência no Ministério da Magia é organizada de forma ágil e tem cortes sucintos, com informações brotando na tela sem soar gratuitamente, porém tem os conhecidos alívios cômicos da série, um verdadeiro abismo de contraste em relação aquela solidão.

As poucas seqüências de ação empolgam, sem atrapalhar as partes dramáticas e acrescentando tensão á película. Nas florestas, sempre existem alguns guardas procurando o trio, o que torna tudo mais realista e natural. Há sim batalhas épicas, como a que abre o filme, um duelo de magias no meio da cidade, mas parece que o roteirista deixou todo o tom exageradamente épico no trailer para a Parte 2. Sendo assim, é fácil constatar que essa Parte 1 só é apreciada e vista no cinema por ser baseada no livro tão amado pelos adolescentes. Com certeza, se não houvesse a presença do bruxo ali, várias pessoas tachariam o filme de chato, modorrento e sem clímax. Não é o meu caso, que mesmo sem ser fã adorei, mas é instigante o fato de que o público a quem se destina o filme, simplesmente não gostaria isoladamente. Até mesmo os fãs estariam reclamando dessa falta de clímax e do ritmo lento se não fosse a fidelidade absurda. Mesmo sem final, sem ação e com pouco ritmo, HP 7 agrada bastante pelo drama ali colocado, mesmo que ele não seja todo esse abismo choroso.


Se o roteiro de Steve Kloves impõe ao filme um tom digno de filme indie como Valhalla Rising, a direção caprichada de David Yates entende isso e faz um trabalho seguro. Na pouca ação existente, a condução é interessante e competente, tendo destaque a já citada batalha no Ministério da Magia e o espetacular confronto na floresta, acompanhado com o mesmo filtro de câmera de Robin Hood, que auxilia a movimentação. Além disso, a seqüência é registrada apenas pelo barulho dos personagens e o som abafado dos "tiros", o que traz uma elegância nova aos confrontos da saga.

Nas partes dramáticas, Yates conduz normalmente, ainda que erre alguns enquadramentos e deixe de trocar o foco dos zooms. Mesmo assim, os erros são perdoáveis vistos perto da interessante saída que o diretor arrumou para as seqüências de impacto: A câmera na mão. Tremida, a câmera dá certo desconforto e surge logo que os personagens estão tendo um conflito verbal ou sentimental. É uma solução manjada em certos filmes, mas quando visto numa série com direções de aluguel e drama pouco atrativo (por ser tipicamente adolescente) nos capítulos anteriores, é de se reconhecer a inteligência do competentíssimo diretor.


A fotografia de Eduardo Serra, depois da saída do indicado ao Oscar Bruno Delbonell, é interessante, ainda que perca grandiosamente para o esverdeado clima do filme anterior. Ainda que nas seqüências urbanas a fotografia não passe da média, nas seqüências de natureza é linda a percepção do fotógrafo em deixar o clima mais sombrio. Uma solução inteligente e que torna o filme esteticamente belíssimo, como na seqüência de neve. A trilha sonora de Alexandre Desplat mantém o nível ótimo de compositores que a série teve e cria notas grandiosas, ainda que siga o estilo fantasioso de John Williams em alguns pontos. Nas partes dramáticas, porém, a trilha se sobressai e se distancia do resto das melodias que permearam a saga. A edição de Mark Day é sucinta e auxilia bem a direção, mesmo sem se destacar.

Nas atuações, pouco a se falar, mas é notável de que Radcliffe, Emma Watson e Rupert Grint aprenderam a atuar e melhoraram as atuações animadinhas dos primeiros capítulos e os tiques dos dois episódios anteriores (Emma sempre chorosa, Grint só servindo como alívio cômico). Agora o negócio é mais sério e os atores captaram a essência do roteiro, fazendo com que os 146 minutos passem tranquilamente.

No geral, Harry Potter 7 agrada bastante e consolida os novos (e certos) rumos que a série tomou. Que a seriedade continue na Parte 2, que tem promessa de bastante ação e onde residem todos os clímaces que faltaram a essa Parte 1. Talvez o ritmo maravilhoso desse dramático episódio desande, mas já fica a certeza de que a espera continua, mais amplificada. Um excelente filme sobretudo e um gigantesco passo rumo à maturidade absoluta da antes boba série que agora entra no panteão das melhores obras juvenis da história.


domingo, 21 de novembro de 2010


O Ritual

O novo filme do diretor Mikael Hafstron, que fez Shangai num circuito mais restrito em 2009, aborda o terror dos exorcismos de uma maneira mais interessante, explorando o drama dos envolvidos e o próprio exorcismo em si. Fora que a gigantesca presença de cena que Anthony Hopkins faz em cena vale desde já o ingresso. Tendo um tema polêmico, envolvendo até fatos reais no Vaticano, O Ritual promete por abordar esse tema sem apelar, se focando na potente narrativa cinematográfica que tende a vir.
 

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Lanterna Verde: Primeiro Vôo(Green Lantern: First Flight, 2009)Aventura - 77 min.

Direção: Lauren Montgomery
Roteiro: Alan Burnett

Com as vozes de: Christopher Meloni, Victor Garber, Tricia Helfer, Michael Madsen e John Larroquette

De pelo menos cinco anos para cá, o Lanterna Verde - e sua tropa - tem sido o grande (senão for o único) personagem dos quadrinhos da DC. O roteirista Geoff Johns criou três sagas seqüenciais que colocaram o campeão esmeralda no centro dos principais acontecimentos de seu universo.

Teoricamente, após a trindade - Batman, Mulher Maravilha e Superman - o personagem mais importante do panteão dos heróis da editora é Hal Jordan e sua encarnação de Lanterna Verde. É talvez por isso, que a próxima franquia nos cinemas sobre os personagens DC seja o do "homem do anel verde". E preparam-se para uma nova série animada centrada nos Lanternas Verdes e que estréia ano que vem também.


Lanterna Verde: 1º Vôo conta a origem - mais um filme de origem - do mais importante dos Lanternas Verdes, Hal Jordan. Porém diferente do que é mostrado em Liga: Nova Fronteira, a origem do personagem e seus eventuais traumas são apresentados em corridos cinco minutos, dando a impressão de cara, que a abordagem da história e seu plot é sobre o eterno - e aqui em sua primeira "encarnação" - conflito entre Hal e Sinestro.

A idéia do filme é transformar a história numa aventura sci-fi com conceitos retirados da HQ. Essa "pressa" em apresentar Hal como Lanterna é arriscada já que o personagem descobre como usar seus poderes quase de imediato, dominando - pelo menos o básico - de forma muito simples, o que causa ao filme uma falta de credibilidade quanto ao público que imagina que é fácil ser um Lanterna e que qualquer um usando o anel consegue criar qualquer coisa.


Esse prequel quase derruba de início a aventura cheia de plot twists (simplórios) que tenta abranger a mitologia do personagem inserindo uma investigação criminal - simplória também - que envolve os personagens da trama. O "quem matou" presente na cultura pop desde seus primórdios aqui também é utilizada, obviamente sem grande profundidade ou desenvolvimento maior, já que esse plot serve apenas para aumentar a rivalidade entre Hal e seu antagonista Sinestro.

Sinestro é retratado como um homem que em sua moral entorpecida busca a justiça pelo único meio que conhece: o medo. Em sua jornada não mesura as conseqüências ou mesmo não se esconde de ter de "sujar as mãos" para atingir seus objetivos.

Hal por outro, é um protótipo de herói americano. Forte, consciente, justo e inteligente. Uma caricatura que é bastante fiel ao que os primeiros quadrinhos imaginavam como ideal de herói. Jordan não apresenta conflitos em - por exemplo - partir em uma missão no espaço sem avisar sua namorada, ou mesmo sentir-se só no meio de uma gama de alienígenas estranhos e muito mais poderosos do que ele. O desenvolvimento psicológico de Jordan é raso como um pires e faz falta para o público. Uma vez que seu herói não tem conflitos e não apresenta medos ou dúvidas como fazer com que ele seja compreendido como um "ordinary guy" que foi escolhido sem saber para essa tarefa interplanetária.


Tecnicamente o filme é um pequeno retrocesso em relação à beleza de Mulher Maravilha. Mais ligado ao estilo "tradicional" das animações da Warner de heróis e seu criador Bruce Timm, o filme tem cenários mais simples (a exceção da bateria de Oa) e personagens mais quadrados e menos expressivos, o que não chega a atrapalhar o filme, mas que é inferior a produção anterior do estúdio.

Outra coisa que incomoda é o CG usado em algumas seqüências que misturam animação tradicional com técnicas mais modernas. Não que - em princípio - seja contra. Mas esse tipo de trabalho precisa ser bem realizado para não destoar e parecer falso.

O elenco de atores é bastante competente, tendo a frente Christopher Meloni (da série Law & Order: Special Victims Unit) como Hal Jordan, Victor Garber (que vivia Jack Bristow na série Alias) como Sinestro, Tricia Helfer (da série Battlestar Galactica) como Boodikka, Michael Madsen como Kilowog e John Larroquete (veterano de diversas séries como: O Desafio) como Tomar Re.


Aliás os coadjuvantes - todos pertencentes à mitologia dos Lanternas Verdes - estão bem caracterizados, apesar de terem suas origens e desenvolvimento (leia-se mortes) diferente do que ocorria nas hq's.

Lanterna é uma aventura sci-fi razoável que não "ofende" o personagem mas que não trás nenhuma seqüência que se destaque ou momentos de grande importância. Mesmo o discurso dos Lanternas - que tende sempre a ser épico - aqui não causa comoção. Talvez o filme com Ryan Reynolds que entra em cartaz no próximo ano seja uma versão mais divertida e emocionante do que a animação dirigida pela bela Lauren Montgomery.