sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Elefante Branco


Elefante Branco
(Elefante Blanco, 2012)
Drama - 110 min.

Direção: Pablo Trapero
Roteiro: Pablo Trapero, Alejandro Fadel, Martín Mauregui, Santiago Mitre

com: Ricardo Darín, Jeremie Renier, Martina Gusman

Pablo Trapero é um poeta da "desgraça humana", e parece muito interessado em mostrar situações em que o ser humano surge debilitado e em localidades em que o olhar do público médio não gosta, nem costuma entrar. Se em seu filme anterior, o ótimo e amargurado Abutres ele deu voz aos homens e mulheres que vivem em função do resultado da violência, em Elefante Branco ele nos coloca na linha de frente, acompanhando o dia a dia de uma comunidade marcada pelo medo e pela violência.

Por estarmos em um país - infelizmente - acostumado a esse tipo de história, nossa relação com a pobreza é muito intrínseca e direta e facilmente criamos laços com aqueles personagens, sejam com os moradores ou padres vívidos pelo excelente Ricardo Darin e o igualmente ótimo Jeremy Renier (oriundo dos filmes dos irmãos Dardenne).

O padre Julián (Darin) é o líder de uma pequena revolução social que pretende acabar com a pobreza da região, ao colocar em prática o que os governantes prometeram e não cumpriram. Fazer do "Elefante Branco", um gigantesco prédio abandonado, um hospital que sirva a população carente. Além disso, pretende criar moradias para os habitantes daquela favela portenha. Julián sofre, pois sabe que sua busca pela paz dificilmente será alcançada em vida e por isso prepara um sucessor, na figura de Nicolás (Renier), um padre belga missionário que quando o filme começa está em meio a uma pregação em uma região isolada da Amazônia. Se junta aos dois protagonistas a assistente social vivida por Marina Gusman, outra abnegada que vive pela causa e também em processo "sacerdotal", já que sua dedicação aquela representa tudo o que tem em sua vida.


O que Trapero faz é discutir sem concessões todos os aspectos que criam esse cenário de pobreza em que estas pessoas vivem. Atira para todos os lados e de forma segura com uma densidade de discussões que fazem dos personagens principais absolutamente humanos, expondo sem dó todas as suas dúvidas e medos diante da dificuldade da tarefa que executam.

Da política da igreja que tira o corpo fora diante da dificuldade de levantar fundos para o término das obras, passando pela truculência policial na base do atire antes e pergunte depois, a ignorância de parte dos moradores que tem enorme dificuldade para compreender a lentidão dos processos em que estão metidos e por fim a violência estúpida e indiscriminada do tráfico, retratada de forma realmente assustadora.

Tecnicamente Trapero é um diretor profundamente competente, conseguindo apresentar um cenário absolutamente crível, auxiliado por uma construção de cenário úmida, que parece exalar mofo dos fotogramas, tamanha dificuldade de compreendermos como alguém conseguiria sobreviver ali. Nada diferente do que vemos no nosso dia a dia e exatamente por isso, funciona com tamanha precisão. Outro destaque é a construção de cenas, desde as que são voyeuristicas e apenas observam as confissões dos personagens, passando pelos tensos planos sequências que apresentam cenas de ação ou de descobrimento daquele habitat estranho, geralmente protagonizadas pelo personagem de Renier, como a que o padre vai atrás do corpo de um rapaz morto pelo tráfico em um ponto extremo da favela e tem de passar por uma série de corredores e salas realmente assustadoras.


Como disse, a jornada do trio de protagonistas é brilhantemente ilustrada e os três tem caminhos tridimensionais. Com Darin questionando sua jornada e proferindo frases muito inteligentes, enfrentando os elefantes brancos pelo caminho em uma caminhada de sacrifício pessoal, onde viver é muito mais difícil do que simplesmente desistir, Renier e suas dúvidas sobre sua fé, suas escolhas e sua vida enquanto Martina busca encontrar algum conforto em meio à tamanha violência.

Dono de um ato final cruel, Trapero não tem medo de nos chocar, nos despedaçar emocionalmente, fazendo com que talvez a esperança de lugar ao amargor da realidade. Trapero não tem medo de apontar sua câmera para o que enxerga de errado e levantar sua bandeira revolucionária social, apontando os problemas e de forma muito humilde nos dizendo que estes são tão enormes e difíceis de serem resolvidos que nem ele encontra uma solução.


Um comentário:

  1. Nós brasileiros temos muito que aprender com o cinema argentino, digo isso sem bairrismo ou preconceito

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