terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Minhas Mães e meus Pais
(The Kids are All Right, 2010)
Comédia/Drama - 106 min.

Direção: Lisa Cholodenko
Roteiro: Lisa Cholodenko e Stuart Blumberg

Com: Annette Bening, Juliane Moore, Mark Ruffalo, Mia Wasikowska e Josh Hutcherson

É quase uma tradição. Entra ano e sai ano e a Academia e os críticos americanos elegem um filme indie, geralmente de pouquíssimo orçamento para ser um destaque na festa da indústria americana. Geralmente são pouco vistos pela massa - o que não é, nem de longe, sinal de falta de qualidade - tem roteiros "subversivos", atores inexperientes ou tentando resgatar suas carreiras, trilha sonora moderninha e angariam fãs entre os "descolados" e "diferentes".

Essa tradição americana sempre ocorreu, mas vem tornando-se mais evidente na última década. Desde o ano 2000 quando Spike Jonze foi indicado ao prêmio de melhor diretor pelo bizarro e genial Quero ser John Malkovich e Hillary Swank venceu o prêmio de melhor atriz pelo visceral Meninos Não Choram essa tendência se expandiu. Nos últimos anos tivemos a "coroação" de filmes como: Encontros e Desencontros, Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, Crash, Pequena Miss Sunshine, Juno, Quem quer ser um Milionário, Preciosa e Guerra ao Terror. Todos pequenos filmes que foram alavancados pela crítica especializada, tendo espaço na festa da indústria.

Kids are All Right, ou como foi toscamente traduzido no Brasil, Minhas Mães e meu Pai, é um exemplo quase arquétipo dessa tendência. Apenas não é formada de atores novatos, já que os cinco personagens principais são, ou consagrados pela critica, ou caras conhecidas do público.


Dificilmente - arrisco a dizer que é uma certeza - não teremos pelo menos três indicações ao filme de Lisa Cholodenko. Posso apostar que Anette Bening, a citada Lisa e o filme terão indicações. A exceção do trabalho forte e inspirado de Anette - de volta aos bons papéis - as demais indicações serão exageradas para não dizer injustas.
Por quê? O leitor mais ávido por respostas diretas pergunta.

Kids are All Right versa sobre um casal homossexual (Anette Bening e Julianne Moore) que a partir de um doador anônimo conseguiram ter dois filhos. Quando os garotos são adolescentes (Mia Wasikowska e Josh Hutcherson), os dois têm a vontade de conhecer o seu pai. Ai entra Mark Ruffalo que vive o doador/pai (Paul) que passa a conviver com a família. Apesar das óbvias arestas pontudas que essa relação, no mínimo, estranha revela a família passa a conviver bem.



Cholodenko no entanto acaba com a credibilidade de seu filme ao inserir um conflito fajuto e até certo ponto ofensivo, tanto em termos narrativos como - principalmente - moral. Imagino se a história fosse entre um casal heterossexual, que teria usado um doador para conceber seus filhos qual seria a saída infeliz utilizada.

Não sei da preferência sexual da diretora, mas ao ver seu filme fica claro que sua visão de sexualidade é deturpada, como trocar de camisa ou escolher um sorvete diferente. Basta termos um probleminha em casa que tudo pode ser resolvido na cama - de outro. Pior ainda quando o outro (spoiler) não "joga no mesmo time" que agente. É o caso do filme, que usa um medíocre caso vazio e sem sentido entre uma personagem lésbica, feliz com sua condição e um heterossexual, reforçando os preconceitos de que essa coisa de opção sexual é pura frescura.

Imagine você leitor. Você - como eu - heterossexual e porque tem problemas em casa, vai pra cama com um homossexual? Isso é realista? Faz algum sentido?

Para Cholodenko faz. Para mim, nem um pouco e isso faz o filme desabar vertiginosamente rumo à mediocridade.


Embora alguns possam defender que a personagem de Moore (Jules) fosse bi-sexual, ou curiosa, não faz sentido vendo o que a narrativa apresenta. Ao utilizar numa sequencia engraçadíssima, um vídeo erótico gay entre dois homens, Cholodenko tenta ali justificar sua virada na história e o surgimento desse caso. Não funciona, pois em nenhum momento fica claro as motivações para que o casal lésbico tenha tesão em ver dois homens transando.

E mesmo que tenha ficado subentendido, o que isso prova? Que no fundo lésbicas "precisam" de um pênis? Que a sexualidade do ser humano é tão complexa e que apesar de termos uma escolha sexual, no fundo "ninguém é de ninguém"? E se é assim que Lisa pensa, aonde entrar os nossos parceiros? É diversão por um tempo, até trocarmos de time? E a realidade do casal que parece viver uma crise normal de um relacionamento regado pelo tédio? Por que são lésbicas, ela tem que partir pra cima de um hétero? Por que não inserir então um caso com outra lésbica?

São questões assim que fazem o filme, que é uma comédia leve e com momentos realmente divertidos derrapar vergonhosamente. Mesmo quando vemos a traição de Jules (Moore) não fugimos do riso, porque apesar de tudo Cholodenko sabe tirar risadas de seu material. Sabe fazer de um espinhoso assunto, uma comédia dramática interessante.



Por isso, é muito difícil dizer se Kids are All Right é um bom filme ou não. Suas opções morais e escolhas narrativas são deturpadas e fracas, embora o resultado dessa "baderna" não seja ruim e até funcione em alguns momentos.

Kids conta com uma atuação retumbante de Anette Bening, fazendo de sua Nic, uma mulher tridimensional. Ranzinza, super-controladora e insegura é de longe a melhor coisa do filme. Os garotos - que ao iniciar o filme, pensei que seriam a propulsão da história - são mal utilizados apesar de apresentarem um bom trabalho e na metade filme do filme são deixados de lado em detrimento da resolução da história mal elaborada de traição e arrependimento do casal Bening/Moore.

Wasikowska prova que é melhor do que sua pálida e inexpressiva Alice e Hutcherson foge totalmente de sua imagem de garoto bonzinho, mas tem pouco tempo para solucionar seus arcos narrativos. Cholodenko levantou a bola mas furou na hora de dar a cortada vencedora, reduzindo o papel dos garotos ao papel de coadjuvantes. E Ruffalo, que tenta mostrar-se interessado nos filhos e depois com desejo por Jules, é uma pálida caricatura. Ruffalo é muito melhor do que seu trabalho aqui demonstra, e sua extirpação na parte final do filme não deixa cicatrizes e nem mesmo uma lembrança.

Talvez, e aqui faço uma defesa da diretora, Cholodenko possa estar dizendo: no fundo ele sempre foi somente um doador e como tal, jamais seria realmente parte dessa família.

Faz sentido, mas então porque dar tanta importância ao seu personagem e sugerir que ele faria parte de forma permanente da história? Apenas para descartá-lo totalmente nos últimos quinze minutos do filme (que por sinal é o melhor do filme sem dúvida).

Kids are All Right é uma comédia dramática "moderna" para caretas. Parece ser na superfície algo subversivo e tentador para os liberais, mas no fundo - até mesmo em termos narrativos - é reacionário. Tenta dar significados e aprofundar uma discussão séria - sexualidade - no meio de uma comédia indie que não sabe a quem se dirige nem o que quer dizer exatamente. Lésbicas são felizes? Quem são nossos pais de verdade? Como podermos ser felizes? Todos os nossos problemas se resolvem na cama de outro? Carência se cura? Relacionamentos são fadados ao tédio profundo e por isso uma traição é inevitável?



Muitas perguntas para pouco filme, que moralmente é discutível e narrativamente regular. Sobra apenas Anette Bening que faz uma de suas melhores atuações da carreira e a revelação de que Wasikowska não é uma garota gélida e sem expressão.

Muito pouca coisa para o "fenômeno indie da temporada".





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