Fotograma Digital

Van Diemen's Land

(Van Diemen's Land, 2009)

Drama - 104 min.

Direção: Jonathan auf der Heide
Roteiro: Jonathan auf der Heide e Oscar Redding

Com: Oscar Redding, Arthur Angel

Van Diemen’s Land é um estudo sobre o quão baixo pode descer o ser humano, e o quanto nessa descida é causado pelo ambiente e quanto é fruto de nossa própria identidade. Parece complexo? Sim, e é.

O diretor Jonathan auf der Heide (que havia dirigido anteriormente um curta- metragem sobre o mesmo assunto) usa como ponto de partida a historia real do mais famigerado prisioneiro da história da Austrália, Alexander Pierce.

No período da colonização australiana, o governo central britânico enviava para a ilha (e todas as ilhas menores ao redor que eram de sua “propriedade”, incluindo ai a ilha da Tasmânia, palco da história) todos os condenados que eram considerados os seres vivos mais desprezíveis para seu império. Pierce e mais sete condenados fogem de uma dessas prisões e se vêem no meio do nada, cercados de mata por todos os lados. Aqui cabe uma observação curiosa: é a primeira vez na vida que vejo uma floresta/bosque/mata sem nem uma sombra de um animal. Dito isso, o filme de der Heide investiga, ou melhor, tenta traçar idéias sobre o verdadeiro instinto do ser humano.

Quem é esse animal de duas pernas? O que o difere dos demais?

Para o diretor e seu roteirista Oscar Redding (que também interpreta o personagem principal) muito pouco, ou quase nada. Isso porque os eventos (reais) que acontecem nessa mata são aterradores. E vou parar por aqui, pois é interessante que o espectador descubra por si só. Outra observação: não seja chato e não procure “Alexander Pierce” no google ou wikipedia ok?

O interessante é que der Heide apresenta cada fato com extrema calma e nenhuma dose de pressa. Tudo acontece lentamente, com muito cuidado para deixar o foco sempre naquelas pessoas, que são apresentadas pelos seus próprios atos. Uma maneira mais orgânica de contar os eventos, do que forçar algum tipo de diálogo explicativo que poderia derrubar o filme.

Confesso que o ritmo apresentado pareceu modorrento na primeira vez que assisti, mas dei uma “segunda chance” ao filme e ele me pareceu melhor. Ou seja, se assistir ao filme, dando aquela “pescada”, não desista. O filme te oferece muitos sub-textos (isso é claro se você estiver interessado em algo mais do que uma diversão passageira, mas imagino que se você foi atrás de um filme australiano sobre um condenado a morte, talvez se interesse por isso) e isso só fica claro com mais tempo de reflexão do espectador.

Outro aliado dessa idéia do diretor é a forma semi-documental com que ele retrata a região da Tasmania. Tudo “cheira” mal, é sujo, claustrofóbico e a sensação de que em algum momento a mata vai simplesmente engolir a tudo que é mostrado na tela é iminente. Um mérito técnico e artístico dessa produção.
As interpretações se não são brilhantes, não causam desconforto em que assiste. Por serem muitos personagens é claro que não existe tempo para o desenvolvimento de todos com grande qualidade. O que der Heide fez em pouco mais de 100 minutos foi escolher um grupo menor e definir sua história por eles, fazendo dos demais coadjuvantes de luxo.

Outro grande destaque é a região mostrada. Segundo o IMDB, temos imagens do Great Otway National Park, Lake Binney, Pine Tier Lagoon e Wild Rivers National Park, todos cenários muito bonitos e que realmente me deram o sentimento de estar realmente dentro daquela situação. Outro detalhe que ajuda a estranheza do lugar é o uso do gaélico como uma das línguas faladas no filme. Parece que muda pouco, mas o uso de um idioma tão restrito ajuda a transformar o filme em algo quase alienígena. Exemplos disso são os filmes de Mel Gibson, que tem muito de seu “realismo” acentuado graças ao uso bastante inteligente das línguas mortas (aramaico e a língua maia).

Van Diemen’s Land merece uma olhada pela intensa busca por respostas que sabe que são impossíveis de serem dadas. O que nos faz sobreviver? O que nos motiva a viver? Será que alguém tem uma resposta direta a essas questões? Imagino quer não e tenho quase certeza de que der Heide também não sabe, e nem se interessa muito em saber. Prefere nos deixar pensando nas motivações daqueles personagens depois que as luzes se acenderem.