Roubo nas Alturas
(Tower Hesit, 2011)
Comédia - 104 min.
Direção: Brett Ratner
Roteiro: Ted Griffin e Jeff Nathanson
com: Ben Stiller, Eddie Murphy, Casey Affleck, Alan Alda, Matthew Broderick, Stephen Henderson, Judd Hirsch, Tea Leoni, Michael Peña, Gabourey Sidibe
Na indústria cinematográfica, é corriqueiro o comentário sobre a
época em que uma obra se passa. Em tempos de crise financeira afetando o país,
surgem as mais diversas visões sobre o assunto. Oliver Stone fez em seu mediano
Selvagens uma maneira de contornar a economia, assim como Soderbergh e seu
Magic Mike. Em Roubo nas Alturas, até Brett Ratner, conhecido por suas direções
sem alguma identidade, resolve conceber uma visão sobre o tópico. Em filmes
blockbusters, nunca algo fora do comum, mas um leve parecer sobre a atualidade
(até Transformers, por um lado, representa bem uma época). O novo de Ratner
parte justamente de um problema de finanças para tecer sua narrativa, o que não
deixa de ter sua relevância no atual cenário.
Estruturado como um filme de assalto a lá Onze Homens e um Segredo, o
filme começa de forma simples apresentando a rotina do protagonista Josh
Kovaks em seu emprego de chefe de segurança no prédio do título original (Towe Heist). Logo
que ele chega em seu trabalho, a forma articulada com que faz suas ações demonstra a familiaridade com sua função, mas é a intimidade no tratamento com os
funcionários ao seu redor que é o que caracteriza a bondade e honestidade do
personagem de Ben Stiller. Também válida é a decisão do roteiro em incluir o
obrigatório novato no ambiente, como o personagem de Michael Peña, que, ao ter
seu primeiro dia no trabalho, serve como motivo para Josh mostrar ao
espectador todo o ambiente. Mas ainda que tenha esse novato com função bem
definida, o filme surpreendentemente escapa do didatismo ao transformar todos
os empregados do roubo em iniciantes totalmente leigos.
A graça do bem-humorado projeto, portanto, é acompanhar a forma
com que esses losers contornam as situações. Logo nesse início, quando Josh
chega ao prédio, vemos rapidamente cada um que irá nos acompanhar na projeção,
em situações que definem, de forma bem sutil até, suas personalidades. E a
apresentação do vilão do filme é interessante justamente pela maneira nada
ameaçadora com que ele é retratado (é um leão de Wall Street, afinal). Dotados
de uma vulnerabilidade, que tanto os aproxima do espectador como dá certa
urgência ao roubo (nunca se sabe ao certo se aquilo dará certo mesmo), os
personagens de Roubo nas Alturas possuem inesperado carisma em suas simples composições,
ainda que a tendência óbvia seja a de Eddie Murphy roubar a cena na sua volta a
papeis como os que realizava nos anos 80 (e, de fato, o ator está muito bem).
Nisso, o roteiro de Ted Griffin e Jeff Nathanson se revela cheio
de fórmulas prontas como a maioria dos filmes de roubo (Griffin roteirizou Onze
Homens e um Segredo). Porém, o subgênero é um dos mais bem sucedidos em
Hollywood, apesar de nunca se entregar a uma grande evolução. Competentes
longas, que vão de Atração Perigosa e Uma Saída de Mestre a Velozes e Furiosos
5, utilizam da consagrada divisão de três atos do manual do Heist Film e,
talvez até por isso, continuam empolgantes. Se Roubo nas Alturas surpreende,
portanto, é por conseguir construir um primeiro ato consistente, baseado apenas
nas pessoas ali retratadas. Após este ato, o roteiro se desenrola apenas no
planejamento e execução do roubo – e o que eventualmente dará errado.
O diretor Ratner, bastante contido e construindo uma boa atmosfera
urbana com o excelente fotógrafo Dante Spinotti, consegue então estabelecer um
cenário de opressão financeira aos trabalhadores da Tower sem muito esforço. E
isso se reflete na excelente escolha de elenco: por mais que sejam competentes,
todos do elenco têm algum elemento de B-list das estrelas hollywoodianas, com a
exceção clara de Ben Stiller, que não só é o protagonista como compensa essa
tendência com sua já conhecida postura retraída em seus “filmes-família”. Já
Matthew Broderick e Eddie Murphy, astros de muito sucesso no passado e agora
entregues a projetos que mal aproveitam seus talentos, são exemplificações
perfeitas; Casey Affleck e Michael Peña, por mais competentes que sejam ainda
não são totalmente estabelecidos no cenário hollywoodiano; Alan Alda, vivendo o
vilão, é um nome forte na TV que nunca se estabeleceu em produções grandes; e,
claro, a presença da mais expressiva das atrizes de comédias bobas, Tea Leoni,
no papel da agente do FBI. E nesse entretenimento bem executado que é Roubo, as
atuações são bastante orgânicas.
Parte dali, então, o comentário sobre a recessão. Os funcionários
promovidos a ladrões são movidos por um sentimento de justiça que não poderia
ser mais relacionado à crise: se um homem, vivendo na cobertura com sua piscina
com estampa de uma nota de cem dólares, pode estar tão bem de vida após roubar
nosso suado dinheiro, por que ele teria que sair impune? A motivação no
rosto dos empregados é forte, apesar de se detectar com tanta facilidade o
discurso pronto do filme. Bastante inocente, o filme de Ratner acredita na solução
imediata financeira. E, principalmente, acredita que pode arrumar formas de
punir os ricaços da Bolsa de Valores que foram responsáveis pelo desastre do
excesso especulativo. Mas já que a produção é cercada de personagens que
acreditam nessa ideia, não é tão absurdo aceitar o filme. Ainda que possua esse
leve comentário, Roubo nas Alturas ainda é um esquemático blockbuster que
diverte justamente pela previsibilidade. Nada ali, no final das contas, deve
ser levado muito a sério, mas é divertido pensar que mesmo um bobo heist movie
bem-humorado de 85 milhões ainda possua seu parecer sobre os tempos difíceis de
agora.
E pela previsibilidade, obviamente, enfileiram-se as situações que
mantém o roteiro dentro de uma estrutura conhecida. Para conseguir um “olheiro”
dentro da Tower, acaba existindo um conflito no grupo, ainda que este não tenha
sido planejado e surja apenas conveniente; na falta de uma forma plausível de
abrir o cofre, transformar a faxineira em uma expert de fechaduras termina
sendo a saída; o protagonista Josh deve ter um interesse romântico, por mais
perigoso que ele seja; a verossimilhança é jogada fora assim que for
conveniente; e, claro, que no clímax algo dará bastante errado no roubo e tudo
terá que ser reorganizado. Mas nada disso atrapalha a montagem segura de Mark
Helfrich e o bom olho de Ratner para suspenses cômicos, embalados, aliás, por
uma trilha de Christopher Beck que, finalmente, funciona. O ritmo da projeção é
bem-sucedido e, ainda que tenha uma inocência um pouco acima do normal, o
discurso do filme é facilmente absorvido.
Quando não se tem um fundo intelectual muito grande a ser abordado
e explorado, há a saída de investir na emoção. E Brett Ratner, inexpressivo em
sua alcunha de um dos maiores diretores de aluguel da indústria, até consegue
realizar um pensamento mais consistente, sem que perca a diversão garantida que
todos seus filmes devem ter. E a estrutura de filme de assalto melhor empregada
(Griffin e Nathanson são profissionais competentes em um filme mais
descompromissado, afinal) do que no seu anterior Ladrão de Diamantes transforma
Roubo nas Alturas em algo levemente melhor que este, a aceitável trilogia Hora
do Rush ou até mesmo o terceiro X-Men.
Raro blockbuster onde tudo o que é pra dar certo, dá, considerando
até mesmo o que se erra. Para um filme sem muita ambição, os erros são tão
corriqueiros que são facilmente perdoáveis. Não tem força para ser chamado de
evolução na filmografia de Ratner, mas sem dúvida é um passo competente e que
diverte sem muito esforço.
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