Elefante Branco
(Elefante Blanco, 2012)
Drama - 110 min.
Direção: Pablo Trapero
Roteiro: Pablo Trapero, Alejandro Fadel, Martín Mauregui, Santiago Mitre
com: Ricardo Darín, Jeremie Renier, Martina Gusman
Pablo Trapero é um
poeta da "desgraça humana", e parece muito interessado em mostrar
situações em que o ser humano surge debilitado e em localidades em que o olhar
do público médio não gosta, nem costuma entrar. Se em seu filme anterior, o
ótimo e amargurado Abutres ele deu voz aos homens e mulheres que vivem em função do
resultado da violência, em
Elefante Branco ele nos coloca na linha de frente, acompanhando o dia a dia de uma comunidade marcada pelo medo e pela violência.
Por estarmos em um
país - infelizmente - acostumado a esse tipo de história, nossa relação com a
pobreza é muito intrínseca e direta e facilmente criamos laços com aqueles
personagens, sejam com os moradores ou padres vívidos pelo excelente Ricardo
Darin e o igualmente ótimo Jeremy Renier (oriundo dos filmes dos irmãos
Dardenne).
O padre Julián (Darin) é o
líder de uma pequena revolução social que pretende acabar com a pobreza da
região, ao colocar em prática o que os governantes prometeram e não cumpriram.
Fazer do "Elefante Branco", um gigantesco prédio abandonado, um
hospital que sirva a população carente. Além disso, pretende criar moradias
para os habitantes daquela favela portenha. Julián sofre, pois sabe que sua busca
pela paz dificilmente será alcançada em vida e por isso prepara um sucessor, na
figura de Nicolás (Renier), um padre belga missionário que quando o filme começa
está em meio a uma pregação em uma região isolada da Amazônia. Se junta
aos dois protagonistas a assistente social vivida por Marina Gusman, outra
abnegada que vive pela causa e também em processo "sacerdotal", já
que sua dedicação aquela representa tudo o que tem em sua vida.
O que Trapero faz
é discutir sem concessões todos os aspectos que criam esse cenário de pobreza
em que estas pessoas vivem. Atira para todos os lados e de forma segura com uma
densidade de discussões que fazem dos personagens principais absolutamente
humanos, expondo sem dó todas as suas dúvidas e medos diante da dificuldade da
tarefa que executam.
Da política da
igreja que tira o corpo fora diante da dificuldade de levantar fundos para o
término das obras, passando pela truculência policial na base do atire antes e
pergunte depois, a ignorância de parte dos moradores que tem enorme dificuldade
para compreender a lentidão dos processos em que estão metidos e por fim a
violência estúpida e indiscriminada do tráfico, retratada de forma realmente
assustadora.
Tecnicamente
Trapero é um diretor profundamente competente, conseguindo apresentar um
cenário absolutamente crível, auxiliado por uma construção de cenário úmida,
que parece exalar mofo dos fotogramas, tamanha dificuldade de compreendermos
como alguém conseguiria sobreviver ali. Nada diferente do que vemos no nosso
dia a dia e exatamente por isso, funciona com tamanha precisão. Outro destaque
é a construção de cenas, desde as que são voyeuristicas e apenas observam as
confissões dos personagens, passando pelos tensos planos sequências que
apresentam cenas de ação ou de descobrimento daquele habitat estranho,
geralmente protagonizadas pelo personagem de Renier, como a que o padre vai
atrás do corpo de um rapaz morto pelo tráfico em um ponto extremo da favela e
tem de passar por uma série de corredores e salas realmente assustadoras.
Como disse, a
jornada do trio de protagonistas é brilhantemente ilustrada e os três tem
caminhos tridimensionais. Com Darin questionando sua jornada e proferindo
frases muito inteligentes, enfrentando os elefantes brancos pelo caminho em uma
caminhada de sacrifício pessoal, onde viver é muito mais difícil do que
simplesmente desistir, Renier e suas dúvidas sobre sua fé, suas escolhas e sua vida enquanto Martina busca encontrar algum conforto em meio à
tamanha violência.
Dono de um ato
final cruel, Trapero não tem medo de nos chocar, nos despedaçar
emocionalmente, fazendo com que talvez a esperança de lugar ao amargor da
realidade. Trapero não tem medo de apontar sua câmera para o que enxerga de
errado e levantar sua bandeira revolucionária social, apontando os problemas e
de forma muito humilde nos dizendo que estes são tão enormes e difíceis de
serem resolvidos que nem ele encontra uma solução.
Nós brasileiros temos muito que aprender com o cinema argentino, digo isso sem bairrismo ou preconceito
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