quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Indomável Sonhadora



Indomável Sonhadora
(Beats of the Southern Wild, 2012)
Drama/Fantasia - 93 min.

Direção: Benh Zeitlin
Roteiro: Lucy Alibar, Benh Zeitlin

com: Quvenzhané Wallis, Dwight Henry

Analisando de forma fria Indomável Sonhadora é absurdamente simples e óbvio: um homem perturbado e sua filha pequena sobrevivem na incrível precariedade de uma região assolada pela pobreza e falta de recursos. Porém, Benh Zeitlin recobre essa narrativa aparentemente exploratória e agressiva com muita fantasia e lirismo, fazendo do filme uma experiência emocional.

Em Bathtub (cuja tradução literal é banheira) todos se divertem, festejam o dia todo, bebem até cair e comem o que a natureza lhes dá. Os habitantes do local são recriações de uma comunidade quase tribal, que não tinham pudores, nem deveres sociais burocratizados. Trabalhavam na terra e dela tiravam seu sustento. Não compravam sua bebida, mas a faziam com o que tinham em mãos. Não compravam a carne, mais criavam e depois matavam os animais, ao mesmo tempo em que outros eram adotados como companheiros e amigos.

Indomável Sonhadora se localiza nesse mundo, um misto de fantasia com observação do ser humano em um ambiente que privilegia o contato do homem e da natureza. Lembra um pouco da ideia de Árvore da Vida, embora aqui a história seja muito menos hermética. Hushpuppy (Quvenzhané Walllis) mora com seu pai (Wink, vivido por Dwight Henry) um sujeito agressivo, cheio de manias e uma forma de ver a vida muito particular.



A trama ganha corpo quando uma gigantesca tempestade destrói ainda mais a região onde Bathtub está localizada. A pequena ilhota é encravada no coração da Louisiana, local arrasado pelo furacão Katrina, é um reduto de sujeira pelo menos na visão de alguém que não vive por lá.

E diante de condições tão complexas, a pequena Husshypuppy, narradora do filme e por quem o espectador observa aquela história, imagina gigantescas feras que motivadas pela destruição da natureza e derretimento dos pólos partem livres para dominar novamente o mundo como fizeram na pré-história.

Essa ideia de colocar-nos como ouvintes dos relatos sempre ingênuos, inocentes e doces da pequena garota se não é original, pelo menos funciona bem. Ao optar por essa saída Ben Zeihn nos faz observar esse mundo - que parece condenado - pelo espectro infantil, que para a pequena Hushpuppy é o lugar onde encontra alegria e diversão.



A direção de Ben Zeihn é segura, não poupando o espectador de imagens da desolação usando de pouca profundidade de campo, apostando em closes da lama, animais, da bagunça das casas e dos personagens todos praticamente miseráveis, mas muito felizes e conscientes de suas escolhas.

É o tipo de filme que pode desagradar por ter um olhar condescendente sobre a miséria, embora ele sempre venha recoberto pela história que realmente importa: um pai e uma filha tentando sobreviver em um mundo que os força a se adequar ao padrão. Por trás de toda a raiva e agressividade de Wink, está um sujeito querendo preparar sua filha para a "vida bandida", uma realidade onde as coisas são difíceis e a sobrevivência complicada.

E chegamos à garota Quvanzhané, que como toda criança prodígio que tem uma interpretação de encher os olhos nos apresenta a dúvida: o que ali na tela é uma legítima interpretação? Ou, a garota "viveu" tudo aquilo, e não conseguirá o mesmo desempenho em outros projetos? Um caso bem recente é o da atriz Gabourey Sidibe, indicada ao Oscar por Preciosa, que nunca mais se destacou com o impacto dessa produção. Que pese o fato da atriz não estar incluída no padrão de beleza hollywoodiano, quando teve chance de aparecer não conseguiu se destacar.



Mesmo com esses detalhes, a garotinha tem um desempenho realmente especial. A naturalidade é visível, a capacidade de emocionar-se e emocionar bastante crível e ainda consegue nos transmitir a solidão que é a vida dessas pessoas em uma situação de profunda miséria. Nada diferente do que estamos acostumados (infelizmente) a ver em nosso país, mas embalada na fábula, no lado onírico e em personagens que não parecem pertencer ao "mundo real".

Essa combinação de "denúncia" com fantasia é o que faz de Indomável Sonhadora um filme de exceção. Original na proposta, competente na execução e interpretado com alma por um grupo de amadores que parece compreender a essência daquela singela história de amor entre um pai problemático e uma filha, uma verdadeira sonhadora.


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