sexta-feira, 12 de abril de 2013

Chamada de Emergência


Chamada de Emergência
(The Call, 2013)
Thriller - 93 min.

Direção: Brad Anderson
Roteiro: Richard D'Ovidio

com: Halle Berry, Abigail Breslin, Morris Chestnut, Michael Eklund, David Otunga, Michael Imperioli

Não é raro encontrar filmes que se propõe a criar tensão em ambientes ou situações limitado (a)s. Desde os recentes - e ótimos - Enterrado Vivo e 127 Horas até o competente Por Um Fio, o horror gerado pela angústia do protagonista em estar preso a algo acaba por render um desconforto sempre bem-vindo em filmes de suspense. Há também, porém, os diretores que aproveitam das pequenas pretensões, e do baixo orçamento, para realizar thrillers psicológicos com situações que soam mais angustiantes na ideia do que na prática: o péssimo ATM, o mediano Pânico na Neve, o primeiro Jogos Mortais, e diversos outros.

Definitivamente, Chamada de Emergência utiliza das limitações do gênero para maquiar suas evidentes fraturas narrativas e ideológicas, criando uma trama ofensiva que, volta e meia, se esconde atrás de uma estética corretamente aterrorizante.

O diretor Brad Anderson, eficiente responsável pelo intrigante O Operário, não é um charlatão qualquer que aparece em Hollywood de vez em quando. Mesmo suas quedas, como o ridículo O Mistério da Rua 34, tem uma estética um tanto além do padrão. E logo no início, ao registrar o sequestro da menina Leah Templeton, Anderson utiliza de hiper-closes para realçar a sensação de perigo em volta da personagem. Essa mesma lógica, mais à frente, é usada tanto nas situações de perigo (com Abigail Breslin) quanto nas de tensão (com Halle Berry). Além disso, o diretor cria um desconforto claro ao utilizar lentes angulares junto ao rosto das sequestradas, o que emula bem uma atmosfera de terror crescente.




De certa forma, as soluções narrativas funcionam de início; Jordan (vivida por Berry) concede instruções interessantes para Casey contornar o seu problema. A tinta, por exemplo, é um eficiente recurso narrativo. O problema é quando o espectador percebe que as duas protagonistas não estão sendo bem-sucedidas na luta propriamente por serem inteligentes; estão por lutarem contra o sequestrador Michael Foster, que é um completo débil mental.

Não cabe apontar como falha os pormenores (Casey fala alto até demais no porta-malas, até mesmo quando a música está alta); reclamar deles seria subestimar os erros bem mais grotescos presentes no filme. Escrito por Richard D'Ovidio, o roteiro é infeliz ao elaborar situações que dependem estritamente das coincidências para darem certo. Logo no início, fica estabelecido que o rastreamento é essencial para as ligações do 911. Porém, mais a frente, uma amiga de Casey fala com ela que o celular dela não tem rastreamento só para depois, oh!, a personagem se ver em apuros justamente por não ser rastreada. Se a tensão não está alta o suficiente, um noticiário de TV anunciando o sequestro passa exatamente na hora que Michael abastece o carro. E as ligações não param: um incêndio é causado ali pelo vilão, em decorrência do isqueiro, que ganhou quando matou um homem que, claro, por acaso, entrou em seu caminho. E se há uma bem-vinda naturalidade em um homem parar o sequestrador no trânsito para apontar uma falha da lanterna, fica difícil engolir que esse homem SEGUIRIA o vilão após.

Essas irritantes conexões que D'Ovidio faz para criar sua historia seriam até divertidas em um mero exercício de gênero, mas isso se torna inviável quando o tom de Chamada de Emergência é muito mais sério do que deveria ser. Além disso, D'Ovidio escreve certos diálogos de forma bem cafona ("Que tipo de pessoa não sairia com um tira?"), o que suprime a tensão. Ou seja, o que poderia ser um novo B-movie à moda do divertidíssimo Celular, acaba se tornando um suspense involuntariamente cômico.




No desenvolvimento de personagens, o roteirista não se mostra muito melhor. Jordan é traumatizada, como mostra o prólogo, mas nada além disso. Para curá-la, apenas uma situação idêntica a anterior. Casey é apenas uma vítima comum, ao que parece (onde estão seus pais?), já que sabemos pouco sobre a vida dela, e a empatia do espectador com a personagem se dá apenas pela situação de perigo que ela corre. Já Michael, por mais mentalmente instável que seja, é o psicopata mais tolerante em anos no Cinema: não adverte uma, nem duas, nem três, mas QUATRO vezes que, se Casey tentar escapar de novo, ele vai matá-la. Fico feliz de não ter atuado em Chamada de Emergência; eu não conseguiria encarar Michael Eklund sem rir de suas ameaças. O rosto pálido, um tanto desesperado, do ator, é sub-aproveitado de tal maneira que, perto do fim, quando o canadense encara a câmera com rosto inchado e olhos sem vida, o terror planejado pelos realizadores explode em humor involuntário.

De problemático suspense, porém, Chamada de Emergência começa a se afundar em seu terceiro ato. Elevando o inverossímil a níveis risíveis, o clímax do filme constrói uma conclusão que não apenas abusa da crença do espectador como desacredita toda o sentimento de impotência que pairava sobre Jordan. Não apenas isso: em uma leitura mais aprofundada, Chamada de Emergência pode ser classificado como completamente a favor da postura dos Estados Unidos como xerifes do mundo. (Spoilers a seguir) A bandeira americana, de certa forma, é responsável por resolver o caso. Além de ufanista, no contexto da vigilância extrema que o filme aborda (os dados pessoais de diversos personagens são mostrados com naturalidade), essa afirmação pode ser nociva. No final, quando Halle Berry é captada em absoluto contra-plongeé com a bandeira americana se impondo ao fundo, o sentimento de que a invasão a privacidade pós-Ato Patriótico é justa, toma o filme. Mais: a última cena pode até dar um senso de justiça, mas soa puramente pró-tortura, neste contexto.

É uma leitura mais complexo do que o filme merecia, mas ao cair em armadilhas narrativas, Chamada de Emergência se presta a ela. Não apenas narrativamente equivocado, como ideologicamente infeliz.




É evidente que Halle Berry tem usado sua credibilidade bem mal após ganhar o Oscar por A Última Ceia, mas frente às declarações da atriz, que julgou seus X-Men como "puro comércio" e filmes como este The Call como "autorais", fica a dúvida sobre o gosto da americana para filmes. Não quero parecer chato ou pesquisador de mercado, mas suponho que ninguém ficará com Maré Negra, Na Companhia do Medo, Movie 43 e este Chamada de Emergência, na memória por mais de um minuto após a sessão. 


Se Berry quer criar "filmes de arte" como esses que escolhe, é bem melhor ficar sendo a Tempestade pra sempre.


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