quarta-feira, 21 de julho de 2010

Prova de Morte
(Death Proof, 2007)
Ação - 114 min.

Direção: Quentin Tarantino
Roteiro: Quentin Tarantino

Com: Kurt Russell, Zoe Bell, Rosario Dawson, Vanessa Ferlito, Sydney Tamiia Poitier, Tracie Thoms, Rose McGowan

Em 2007 ,Quentin Tarantino e Robert Rodriguez entraram num projeto em conjunto chamado Grindhouse, para homenagear os tantos filmes da década de 70 pertencentes a esse quase gênero - onde as produções eram baratas , as histórias toscas, e o cuidado dos distribuidores quase inexistente - que marcou a geração dos cineastas, que assistiam ás famosas sessões duplas em estacionamentos ou cinemas baratos. A produção, então, foi dividida em dois filmes: Planeta Terror, de Rodriguez, e Á Prova de Morte, de Tarantino. Por azar do destino e extrema falta de destreza administrativa das distribuidoras brasileiras, o filme de Robert Rodriguez chegou ao Brasil em sua data prevista, mas o mesmo não aconteceu com a película de Tarantino. Mas , depois de um inexplicável atraso de 3 anos, Á Prova de Morte enfim chega ao Brasil .

E é fato de que esse ''passatempo'' do diretor é simplesmente mais uma de suas obras-primas, e , avaliada separadamente do seus contexto, é ainda melhor. Ora, o projeto Grindhouse sofre afinal de dois ritmos diferentes : Um é o caricato mundo criado por Robert Rodriguez, e o outro é o interessantísimo mundo tarantinesco de Á Prova de Morte. Em poucas palavras é possível resumir a diferença básica: Rodriguez criou algo convencional, e Tarantino algo pessoal, onde a homenagem brota de maneira mais cativante .


A história de Á Prova de Morte apresenta tudo o que uma produção Grindhouse original tinha : garotas sexy , clima de suspense e horror, e sanguinolência . Nesses pilares, Tarantino consegue estabelecer sua originalidade através de uma história única. Nela, acompanhamos o dublê misterioso Stuntman Mike ( Kurt Russel) que vaga pelas cidadezinhas á procura de futuras vítimas do seu carro - Um Chevrolet Muscle adaptado para dublês, seguro para quem o dirige. Paralelamente seguimos as histórias das vítimas que Stuntman Mike pretende atacar. Entram para interpretá-las , Rosario Dawson, Zöe Bell , Vanessa Ferlito ,entre outras . A história, é claro, não é tão simplória a resumir-se por matanças , e na inteligente divisão de seus arcos de história, Tarantino ganha pontos mais uma vez.

O roteiro se estabelece de maneira interessante, principalmente em sua estrutura . Tarantino pega uma trama básica típica de Grindhouse (vilão matador que vai atrás de suas vítimas) e utiliza todos os detalhes recorrentes de sua carreira, comos os diálogos extensos e estranhos ou os seus arcos gigantes de narrativa, além de utilizar muito da auto-referência - desde de detalhes do figurino até músicas, marcas e situações chave. O cineasta também utiliza todos os recursos presentes num filme de terror barato. A típica ''enrolação'' antes da ação em si, e o erotismo farto (emblematizado na cena da dança do colo), que estava presente na maioria dos filmes Grindhouse. Na parte da divisão de arcos, Tarantino se sobressai mais uma vez, como dito antes. Assim como em Kill Bill ou Bastardos Inglórios, em Á Prova de Morte Tarantino divide sua narrativa em trechos objetivos e que são contundentes para o entendimento da história. Como se trata de uma história de horror básica, Tarantino resolve simplificar mais ainda as relações: o filme se baseia praticamente em dois atos: Ação e reação. E, como de costume, seus diálogos estão afiados e com assuntos estranhos. Porém, desta vez, Tarantino os coloca em situações onde personagens são apresentados, fazendo com que a típica parte de ''enrolação'' seja interessantes para trama. Além disso tudo, Á Prova de Morte ainda apresenta mais uma novidade: os erros. O filme não desperdiça oportunidades de criar erros de edição, problemas na construção de som e efeitos mal acabados. Além disso, Tarantino inclui propositalmente em seus script de personagens situações que não vão se resolver - como a da personagem Lee - ou que não tem relevância nenhuma para a história - como a participação de Eli Roth pretendendo embebedar as garotas.


Na direção, Tarantino aproveita para experimentar novidades e lapidar algumas de suas marcas registradas. Todas as cenas de ação filmadas com carros eram de certo modo novidade para a filmografia de Tarantino na época em que o fime foi rodado. Nessas cenas, Tarantino mostra que consegue acompanhar a ação passando toda a emoção e sem perder o estilo . Nas marcas registradas, a cenas da conversa entre as dublês no bar entra em destaque. Ali , o diretor busca criar um conversa extensa, mas filmar tudo em um take apenas. O desafio já havia sido proposto em seu primeiro filme, Reservoir Dogs , e foi aperfeiçoado aqui. Enquanto ele gira no eixo de uma personagem que fala, ele mostra todas as outras, de costas, e conforme a conversa segue, os eixos mudam, mas sem cortes. Genial. De resto, Tarantino abusa de bons enquadramentos e direção de atores competente como sempre.

Nas atuações, quem mais impressiona é Kurt Russel (Aventureiros do Bairro Proibido, Fuga de Nova Iorque), que apesar de ser um ator consagrado, nunca obeve um papel onde pudesse mostrar todo seu talento. Aqui, como o vilão carismático, Russel encanta a platéia, e quando troca olhares com o público e com os outros personagens, a sintonia é perfeita. O papel de sua vida. Todas as outras garotas mostram grandes atuações e entrega total para o desempenho do filme. Nas partes técnicas o diretor mais uma vez não decepciona. A jukebox mental de Tarantino não parece ter fim, e as músicas de seus filmes são sempre um destaque. A fotografia, assinada por ele mesmo, é boa, e ajuda a dar o tom de velho e de baixo custo ao filme.


Depois de um avaliação completa, é possível dizer que Á Prova de Morte é mais uma das grandiosas obras-primas da genial galeria de Quentin Tarantino. Um toque do seu talento nato ao gênero Grindhouse . Aqui, o garoto do Tenessee cria uma homenagem adicinando doses de seu cinema primoroso. Enquanto Rodriguez criou uma homenagem convencional e caricata, Tarantino proporcionou uma história única, e uma experiência única , marcando sua assinatura profundamente em nossas mentes, de novo.

O cinema de Grindhouse percorreu os anos 70 de forma marcante. Os filmes mal feitos, censura alta e com doses cavalares de monstros, sangue, sexo, matança, exagero e caricaturas serviu pra entreter e animar a adolescência de um dos maiores diretores da história do cinema, Quentin Tarantino. E ele, cinéfilo até a alma, apreciador de geniais obras antigas, sempre usou referências em seus filmes e, constantemente, homenageia elas nas telas. Desde Pulp Fiction, em que imortalizou a literatura policial até Bastardos Inglórios, um filme de Segunda Guerra Old School com trilha de faroeste, o diretor bebe de clássicos antigos pra criar seus clássicos modernos. Agora, era a vez de Tarantino homenagear os filmes de Grindhouse, filmes em que se viam nos estacionamento e cinemas vagabundos da época de baixo orçamento e, principalmente, trash até a essência.

E, nesse projeto, Tarantino chamou Robert Rodriguez, também amante desses filmes. Tomavam forma os dois projetos: Planeta Terror e Á Prova de Morte. Logo, essa enorme diversão gerou 2 longas e 5 curtas, que seriam exibidos entre os dois filmes. Esse era o esquema: Dois filmes pelo preço de um. Porém, a longa duração do projeto e a falta de conhecimento da maioria do público sobre o sub-gênero fez o filme fracassar nas bilheterias e eles foram divididos para o lançamento mundial. Então, o Brasil também dividiu os filmes. Porém, se a Europa Filmes viu Planeta Terror (o segmento de Rodriguez) chegar aos cinemas em 2007, Á Prova de Morte foi segurado pela distribuidora até 2010, quandio os direitos foram expirados e comprados pela Playarte, que lança o filme essa semana nos cinemas. E toda essa expectativa gerada é, sem dúvida, recompensadora.


A trama segue um grupo de garotas em Austin, Texas. Elas são modelos e vivem muito bem nessa pequena cidadezinha e vivem indo a bares e andando de carro, demonstrando sua sensualidade. Porém, num bar, elas são surpreendidas por um homem chamado Stuntman Mike (Kurt Russell), um sádico dublê que tem um legítimo Muscle Car "Á Prova de Morte". E, com isso, leva suas vítimas a um aterrorizante passeio, extremamente violento.

A proposta inicial de Grindhouse era homenagear esse gênero cultuado pelos dois cineastas. Porém, se em Planeta Terror Robert Rodriguez realizou um filme de grindhouse mais exagerado, mais caricato e action-packed, Tarantino fez uma legítima HOMENAGEM, dando sua marca ao gênero. Enquanto Planeta Terror é um filme grindhouse comum, Á Prova de Morte é a homenagem de um gênio para o sub-gênero. Tarantino pegou uma trama do sub-gênero e construiu uma narrativa completamente sua, com suas situações divertidas e seus diálogos afiados (e descartáveis). E, homenageando, colocou falhas na película, falhas de continuidade, edição tosca e situações engraçadíssimas pelo espírito trash, como o repentino final. Também perto do final, temos a perseguição dos Muscles, um branco contra o preto. Engraçada até a alma, não havia forma mais exata de demonstrar quem é do mal e quem é do bem.


Desde a construção de personagens até as situações criadas por Tarantino, Á Prova de Morte é um enorme acerto. Apesar de discursarem o tempo inteiro sobre cinema, cultura pop em geral e afins, agora os personagens tarantinescos tem uma diferença: são mulheres.

E é incrível como o criador tem mão até pra escrever diálogos femininos depois de duas décadas fazendo filmes extremamente masculinos. E até nisso há a homenagem: aqui, os diálogos servem pra típica enrolação de filme de terror, que culmina no grande ato (nesse caso, as batidas de carro com Stuntman Mike). Tudo isso, somado a icônica criação do personagem de um inspirado Kurt Russell torna Á Prova de Morte um filme sensacional. Pode até ser o filme de Tarantino com ritmo mais lento, mas tudo isso é recompensador.

Tecnicamente, o filme também arrebenta. A direção de Tarantino é mais uma vez completa, com destaque ao genial take inteiro de 7 minutos em que as amigas conversam no bar sobre perseguições de carro no cinema(mulher falando disso?!) e as perseguições de carro, orquestradas de maneira fabulosa. E isso, confesso, até me espantou. A mão de Tarantino para a ação nunca havia sido mostrada antes e aqui é excelente. A edição de Sally Menke é competente quando pedida e homenageia no tom certo quando necessário.

No início, cortes mal feitos e caricatos. Homenagem. No final, perseguições montadas de forma ágil. Competência. A fotografia de Tarantino é maravilhosa também e o envelhecimento da película foi preciso pra dar o tom trash. E isso é aliado à trilha sonora que, como de costume nos filmes do diretor, é sensacional e vai ficar horas e horas na sua cabeça.


Avaliando de uma forma geral, ainda se somando ás inspiradas atuações de Kurt Russell, Vanessa Ferlito e até a dublê Zöe Bell, Á Prova de Morte é um deleite aos olhos e um legítimo produto cinéfilo. Tarantino entrou pra história novamente com um novo filmaço, excelente por conter cada segundo de sua marca. Se, apesar de ter 113 minutos, esse é o filme mais lento em ritmo dele, é porque homenagens nem sempre podem construir um filme todo sem incomodar. Pois aqui não incomoda. Aos cinéfilos, temos uma nova pérola tarantinesca aqui. Completamente diferente do que Rodriguez fez com seu Planeta Terror, Tarantino fez uma verdadeira homenagem ás Grindhouses. Os diretores dos trashs setentistas podem ficar honrados.


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