segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Festival do Rio: Fruitvale Station

Fruitvale Station
(Fruitvale Station, 2013)
Drama - 85 min.

Direção: Ryan Coogler
Roteiro: Ryan Coogler

com: Michael B. Jordan, Octavia Spencer, Melonie Diaz, Ahna O'Reilly, Kevin Durand

É véspera de Ano Novo. Na Califórnia, Oscar Grant e os amigos vão ao metrô, tomar a condução até a festa que haverá no Centro. Assim que eles entram em um dos vagões, a câmera para de se mover e os acompanha ir embora. O plano dura mais alguns segundos, como se houvesse algo de diferente naquela estação comum. Parece que algo assustador acontecerá.

Construindo um duro conto de realidade, Ryan Coogler estreia na direção em Fruitvale Station. O novato é preciso ao estruturar o roteiro sem privilegiar uma divisão de atos, definindo as situações com o olhar de quem observa majoritariamente o protagonista, desenvolvendo-o através de pequenas cenas; um estudo de personagem, em suma.

Nessa busca por definir o drama de Oscar através da tentativa de se redimir do passado – e a tentação de voltar a ele –, Coogler aposta nos conflitos morais dos quais o personagem passa. Os antigos contatos com o tráfico se mostram ainda presentes, mas o senso de proteção de Oscar com seus familiares é mais forte. Além disso, cenas como a do protagonista na prisão – excelente do início ao fim – realizam uma relação de causa e efeito que tornam Oscar mais reticente na hora de se entregar à saída mais fácil. A trilha e o design de som são executados à perfeição na hora de traduzir os sentimentos do personagem, e isso só aumenta no catártico clímax, que parece concretizar um movimento de elegia.


Elegia essa concebida com um cuidado notável por parte de Coogler, uma visão madura sobre a perda. De maneira sutil, o diretor chama atenção para detalhes aparentemente banais, mas que terão tremenda importância emocional no clímax: a corrida com a filha é eternizada, em câmera lenta; o encontro com a filha na casa da tia é filmado em close; a já citada estação é filmada com mais cuidado que o normal; um plano no metrô, passando rápido, revela temíveis faces de pessoas, numa dissonância eficiente. É difícil alcançar esse nível melancólico do luto sendo discreto, ainda mais quando se estrutura uma narrativa inteira em volta dele, mas o diretor entrega a responsabilidade ao excelente Michael B. Jordan – digno de premiações – e consegue remeter até ao Elefante de Gus van Sant.

Os cortes abruptos (a cena de mãe e filha no banho é notável), impactantes, ajudam a causar o desconforto que a história provoca, junto do trabalho de câmera naturalista, com belíssima fotografia em 16mm para se manter o mais documental possível. As intenções do diretor se revelam satisfatórias principalmente no clímax, que não deixa de causar tensão por um segundo sequer.

Não é um trabalho perfeito, porém. Já que Oscar é uma vítima das consequências, Coogler não se contenta apenas em fornecer a visão em volta do jovem, manipulando o ambiente para deixar sua maldade mais clara; pesa a mão demais no drama e acaba o atenuando. O cachorro atropelado do início até consegue dar uma visão desesperançosa ao ambiente, mas de nada serve para a jornada do personagem além de vitimizá-lo nesse mundo frio e cruel. A festa no metrô também é de uma inocência sem vez naquele pano de fundo; não é normal ver pessoas apertadas no metrô dançando do nada. Só soa dissonante em tom, como o plano dos parentes reunidos com fotos na geladeira: procura expor o forte conceito de família do filme, mas não deixa de ser um didatismo previsível.


Ryan Coogler e Michael B. Jordan constroem um personagem multifacetado. Oscar soa vivo nas telas, lidando com questões éticas até haver uma intervenção. Coogler pode ainda ser desmedido em suas metáforas, mas consegue, através dos cortes secos e da presença marcante de B. Jordan, criar uma digna jornada a um personagem dolorosamente real.


E é na hora de traduzir essa dor em réquiem que Fruitvale Station mostra seu poder.

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