sexta-feira, 22 de outubro de 2010


A grande diferença entre um grande clássico e um filme cult é simples: Cult é aquele filme que você gosta e não necessariamente é tão bom assim (alguns até são), mas que por algum motivo você adora, se diverte e indica aos amigos. O caso é que na ânsia de encaixar esses filmes em alguma sessão, o Fotograma resolveu criar essa nova sessão, onde aqueles filmes amados e cultuados serão aqui comentados. Sempre de maneira leve e divertida, como pede um filme cult.

Matinê: Uma Sessão Muito Louca
(Matinee, 1993)

Imagino o sufoco de cineastas ancestrais em produzir efeitos de qualidade para prender a atenção do público. "Como foi feita a cena em que Moisés, vivido por Charlton Heston, abre o Mar Vermelho para a passagem de milhares de judeus na mega produção de Cecil B. Demille Os Dez Mandamentos?" é uma pergunta que já se tornou clichê no universo dos efeitos especiais. De lá pra cá muita coisa mudou (e pra bem melhor), mas se banalizou muita coisa também. E esse ramo começou por conta dos esforços de diretores pioneiros que arriscaram quando ninguém queria saber de nada além do óbvio. Diretores como Lawrence Woolsey (John Goodman em atuação fantástica), o visionário filmmaker de Matinê: uma sessão muito louca, nostálgica película do mestre Joe Dante.

Tudo se passa em Key West, pequena cidade do estado da Flórida, em plena era da crise dos mísseis e da luta Kennedy X Fidel em 1962. Os ãnimos da população mudavam como quem muda de roupa, pois havia uma incerteza quanto ao futuro: estaremos aqui amanhã ou seremos abatidos à tarde? Todo um clima de paranóia generalizada se instaurava nas ruas, as crianças filhas dos militares sequer podiam sair das bases e conhecer o aroma das ruas. E nesse cenário desolador Woosley, mestre do sensacionalismo decide tirar proveito disso. Como? Produzindo a maior revolução cinematográfica da história, o filme Mant! sobre um homem que sofre uma terrível mutação após uma tragédia nuclear e acaba virando uma simbiose entre homem e formiga. Ardiloso e louco na mesma medida, o diretor convence o dono da sala de cinema da cidade a utilizar a sua tecnologia inovadora, prometendo uma plateia jamais vista na região. O resultado é simplesmente arrebatador!

Fazendo uso de efeitos baratos, a maioria deles através de roldanas e mecanismos arcaicos, o filme toma a plateia de susto e transforma o pacato vilarejo no cartão-postal do cinema moderno. A fotografia de magníficos planos abertos de John Hora associada ao roteiro debochado de Jerico e Charles Hass, que foca principalmente nos duelos familiares e no clima de tensão do período, prendem a atenção do público até o arremate final (no caso, a sessão de Mant!). Impossivel não guardar lembranças as mais positivas de uma época em que o cinema não se escorava em excessivas tecnologias e aparatos para gerar bilheterias vultosas.

Pensar o sucesso de Matinê na época em que foi produzido é, em poucas palavras, pensar a necessidade da sétima arte voltar a ser simples para encantar as plateias (hoje carentes de ídolos e de boas histórias). Ver os olhinhos grudados dos espectadores a cada surpresa, objeto ou inseto estilizado que atravessava seu caminho a cada 10 minutos de filme numa sucessão de reveses que faziam a sessão de cinema parecer um passeio no trem-fantasma do melhor parque de diversões do mundo é, acima de tudo, deixar registrado o respeito dos realizadores daquele tempo pelo público, diferentemente de hoje em que se recorre a qualquer 3D, Imax ou outro suporte para encarecer o preço do ingresso e, muitas vezes, só servindo para estragar o divertimento e fazer as pessoas (quase) pedirem de volta o dinheiro na bilheteria.

Um filme para ser admirado - certamente Tim Burton e Guillermo del Toro beberam dessa fonte como inspiração para seus longas Marte Ataca e O Labirinto de Fauno - e, principalmente, resgatado pelas novas gerações. Quem sabe depois de acompanhar esse exemplar genial eles não entendam de uma vez por todas que cinema é isso aqui: dar alegria às pessoas.

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