quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Melhores Coisas do Mundo
(Melhores Coisas do Mundo, 2010)
Comédia/Romance - 100 min.

Direção: Lais Bodanzky
Roteiro: Luiz Bolognesi

Com: Francisco Miguez, Denise Fraga, José Carlos Machado, Gabriela Rocha, Fiuk, Caio Blat e Paulo Vilhena


Falar sobre adolescentes ou para os adolescentes sempre foi uma tarefa dificil. Falar sobre adolescentes de maneira correta, sem esbarrar em clichês, ou apresentando uma linguagem inteligente, que não menospreza ou contemporiza as ações dos personagens é o principal desafio. Por essa tarefa ser complexa é que cada vez mais vemos filmes que versam pela prática de uma paródia bobalhona dessa fase da vida.


Os americanos são mestres nesse tipo de produção. Desde os - hoje ingênuos - Porky's até as bobagens (e incontáveis sequencias) de American Pie, esse tipo de filme que propõe a seu espectador duas horas de lobotomia cinematográfica faz sucesso relativo. Quem geralmente compra um ingresso pra esse tipo de produção é o mesmo que encara a arte do cinema como mais um elemento comercial em sua patética vida.


Os estúdios por sua vez, vendo que esse comportamento é o padrão (muito influenciado pelos próprios estúdios, que não arriscam nada do que fuja do óbvio, com medo de um fracasso), entopem as salas de cinema com lançamento inclassificáveis e incontáveis paródias de outros sucessos destinadas a esse público estúpido e comedor de pipoca.



É raro encontrar produções que tratam seu pseudo-público alvo de forma inteligente, e mais grave ainda no caso dos adolescentes, que os retratem com alguma fidelidade.


Melhores Coisas da Vida consegue esse feito, apesar de ser restrtivo em sua ambientação, e falar muito sobre a realidade de uma cidade. Mais, o principal nisso tudo é que o filme de Lais Bodanzky consegue ser relevante ao mesmo tempo em que trás um frescor ao usar de atores novatos ou amadores (muito a vontade ao verem retratados sua propria realidade). E o texto de Luis Bolognesi é um achado. Primeiro por achar meandros, discussões e muitos significados nas relações daqueles adolescentes de classe média. Segundo por dar - e isso fica claro para quem vê o filme - espaço para os garotos improvisarem, inserirndo gírias e pausas dramáticas que acertam em cheio o naturalismo proposto.


Nesse aspecto lembra e muito o brilhante filme francês Entre os Muros da Escola,ou mesmo o polêmico KIDS. O naturalismo dessas produções é o que causava o choque de suas história cruas e verdadeiras.



O filme versa sobre essa família formada por Horácio (José Carlos Machado), Camila (Denise Fraga), Mano (Francisco Miguez) e Pedro (Fiuk), que é mais uma tipica família paulistana de classe média que se esforça para dar o melhor aos filhos. Isso inclui uma escola particular, aulas de violão, incentivo a criatividade dos filhos e tudo o que todo pai deveria fazer, se tivesse boa vontade e dinheiro. O caos rompe quando o pai da família decide separar-se e pior para ficar com outro homem.


Ao mesmo tempo, o filme investiga - apesar de fazer de maneira rasa - o fenomeno da internet numa geração que nasceu apertando botões e o cyberbullyng que acontece por decorrência dessa facilidade de acesso a tudo e a todos a toda hora.


O filme poderia ter optado por uma linguagem mais virulenta, expondo a "sujeira" por baixo do tapete do mundo mágico de boa casas, colégio pago e cursos extras, mas prefere seguir luminoso falando dessa gente e expondo suas vidas com naturalidade. Não existem vilões claros no filme (por isso quando acontece a inevitável cena de briga entre Mano e os valentões, ela parece um pouco exagerada, ainda mais porque não vemos a relevância daqueles personagens) e o cyberbullyng, a humilhação publica e o "ranso" com que os personagens de afastam dos caluniados é bastante crível de forma narrativa e muito mais próxima da nossa realidade do que a dos enlatados americanos que pregam que o ser popular e ser impopular definem eternamente seus sentimentos e a forma de encarar a vida que segue.



O que faz o filme perder pontos são alguns detalhes. A óbvia história de amor, que é perceptivel desde o primeiro frame do filme, é uma repetição - bem feita, é verdade - de dezenas de outras histórias. O uso excessivo da mesma canção como um rito de passagem cansa em determinado momento, em especial quando ela aparecer em duas sequencias muito próximas (a do quarto de Valéria e da "jam" nas escadas), que apesar de mostrarem a evolução do aprendizado de Mano funcionaram para mim como uma ducha de água gelada sobre a ação mostrada.


Outro problema é que um dos personagens mais importantes - e com arco narrativo mais doloroso - é interpretado por um ator que não consegue atingir o que se esperava de seu personagem. Falo de Pedro e de seu interprete, o popstar Fiuk. Não faço a menor idéia do que o rapaz canta, ou mesmo dos outros trabalhos em tv que ele protagonizou, mas vendo este, percebe-se que sua dicção embolada e propositalmente quase "bebâda' incomoda a comprensão de suas linhas. Sua falta de verdade ao recitar as poesias que ele escreve também demonstram que o ator ainda precisa ser melhor trabalhado. Em compensação ele funciona muito bem na tela, tem presença cênica e tem domínio rasoável das expressões corporais. Ou seja, não é um gênio da arte, mas pode melhorar muito.



Os pontos positivos - que são muitos nesse setor - começam pela feliz escolha do protagonista do filme. Apesar de ecos de Preciosa serem ouvidos a cada frase do garoto, Francisco Miguez parece ser um jóia descoberta pela diretora e que precisa ser bem cuidada e desenvolvida. Notei uma certa semelhança física - notem bem, física - com um Al Pacino em início de carreira, com o olhar carregado de medos e incertezas e uma tensão constante na forma de caminhar. O menino é talentoso e merece ter mais trabalhos para crescer ainda mais como interprete.


O outro pilar é a garota Carol interpretada com naturalismo extremo por Gabriela Rocha. Minha favorita dentre todos os atores ela consegue jogar angústia, medos e aquela ansiedade adolescente em cada momento seu em tela. A menina, mais até que que Francisco, terá um futuro radiante se seguir bons papéis.


Os coadjuvantes são muitos e alguns merecem destaque. Denise Fraga - uma atriz de grande capacidade - apresenta mais um bom papel, e apesar de sua participação ser a esperada - ou seja, pequena - num filme que foca os adolescentes. Paulo Vilhena destaca-se ainda mais como um professor de violão que torna-se guru de Mano. Natural e mostrando que é um ator bastante talentoso, que envolve-se em muita polêmica, o que talvez o afaste de papéis tão legais como esse. Caio Blat, tem três cenas relevantes no filme, e em ambas não pode desenvolver com grande profundidade seu personagem. Por fim o pai, José Carlos Machado, um ator veterando e muito conhecido de outras produções do cinema nacional é o mais fraco deles. Parecendo dstante do tom dos demais personagens, até mesmo o ator que faz a participação como seu namorado (Gustavo Machado) consegue em muito menos tempo ser mais relevante do que o ator consegue aqui.



Lais Bodansky, conhecida pelo ótimo Bicho de 7 Cabeças, é uma senhora diretora. Além do óbvio domínio técnico consegue extrair bons momentos de todo o seu elenco, basicamente muito inexperiente e que só por esse fato mereceria minhas palmas.


Apesar de discordar de algumas soluções encontradas pela história - em especial do seu terceiro ato - Melhores Coisas da Vida ainda sim é um dos filmes nacionais mais interessantes da década. Retrata com competência uma geração, expõe algumas feridinhas de uma parte da população e ainda consegue contar um história de amor açucarada mais competente.


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