segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O Turista
(The Tourist, 2010)
Ação/Thriller - 103 min.

Direção: Florian Henckel von Donnersmarck
Roteiro: Florian Henckel von Donnersmarck, Christopher McQuarrie e Julian Fellowes

Com: Johnny Depp, Angelina Jolie, Paul Bettany e Timothy Dalton



No último ano ficou claro a proposta hollywoodiana de faturar alto com blockbusters que misturam gêneros e agrupam grandes estrelas cinematográficas . James Mangold optou por um produto de entretenimento de fácil aceitação pelo público e nada ofensivo á critica - um retorno louvável de Tom Cruise, num roteiro simples, mas bem amarrado e desenvolvido, sendo muito bem capturado pela câmera contemplativa do diretor, que deixou seus astros bem á vontade para realizar um bom filme. Na contramão da honestidade bem executada de Encontro Explosivo, também foi cometido o deslize máximo de Robert Luketic, o pastiche enjoativo e cheio de erros Par Perfeito, que tentava - veja bem, tentava - usar uma química inexistente entre Ashton Kutcher e Katherine Heigl, para faturar alto mesclando comédia romântica com um filme de espionagem.


É o trabalho de Hollywood, afinal, tentar juntar gêneros para atrair o máximo de público possível. Nesse quesito, O Turista - remake do filme francês chamado Anthony Zimmer - já começa com larga vantagem. Juntar Johnny Depp, o queridinho de Hollywood, cotado para 11 entre 10 projetos da casa, e a musa Angelina Jolie, é a segurança mínima para pagar os 100 milhões do orçamento. Ambientado em 90 por cento de sua duração na bela cidade de Veneza, poderíamos apostar nossas fichas que o diretor do filme vencedor do Oscar - A Vida dos Outros - Florian Henckel Von Donnersmarck faria uma bela homenagem ao gênero de espionagem ao melhor estilo europeu. Contudo, essa afirmativa fica apenas nas intenções. O Turista é uma armadilha não só para o personagem de Depp - mas para todo o público.




 A trama começa com a esposa de um fugitivo da Interpol (Angelina Jolie) que é vigiada pela polícia 24 horas por dia onde quer que vá. Para tentar despistar o paradeiro do marido, ela recebe a missão de encontrar um outro homem, que se faça passar pelo parceiro (que passou por uma cirurgia plástica) e o escolhido é o pacato professor de matemática Frank Dupello (Johnny Depp). Claro que nada sai da forma planejada, e os dois acabam entrando em perigo nas paisagens venezianas.


Logo de cara, o roteiro de O Turista já começa com alguns leves deslizes. Toda a vigília em cima da personagem de Jolie é deveras expositiva, e mesmo que ela já soubesse que estava sendo vigiada - o que de fato sabia - não deixa o filme de apresentar, além destes momentos, o conceito de "espionagem" um tanto escancarado, para um thriller do gênero. Esse, entretanto, é um dos erros mais ínfimos do longa de Von Donnesmarck . O script do filme tem muito mais defeitos - tanto de falta de respeito com o espectador, quanto de simples desleixo, e falta de aprimoramento ou acabamento. Note, ora, como a narrativa é extremamente vazia. Não há diferenciais explícitos, e muito menos implícitos, em O Turista. Perseguições comuns - e filmadas com pouco caso - não empolgam e dão à impressão enfadonha de alguém caminhando numa esteira: anda, anda, e não sai do lugar. Pode até sair do lugar, mudando de cenários, mas na mente de quem assiste, o filme parece continuar sem graça, e passa quase despercebido pela tela.



Uma solução para isso seria tentar preencher de conteúdo nos locais que davam - e construção de personagens seria uma saída adequada. E, mesmo com uma atuação competente, porém inibida de Johnny Depp - de Jolie só dá pra falar que ela se esforça como pode, principalmente pra imitar o sotaque inglês - não há nada que recheie suas personas com uma vitalidade. Von Donnesmarck sangra os closes o máximo tolerável, e mesmo assim, a densidade dos personagens é diminuta, rasa como um pires. Não há vilões - aliás, o vilão do filme é bem esdrúxulo - ou coadjuvantes que possam fazer diferença e contrabalançar a palidez da construção dos dois protagonistas. O Turista molda seus personagens de maneira apática.


E se havia alguma maneira do longa não ser uma inutilidade completa , era necessário explorar os outros gêneros que permeiam o filme - como a comédia romântica, por exemplo . Neste ponto, esbarramos inevitavelmente na falta de aptidão do diretor com o tema. As cenas de ação, que no papel já não deviam estar lá essas coisas, transportadas paras as telas, perdem qualquer ponto positivo. Von Donnesmarck é um tanto quanto quadrado - engessado e sem a vivacidade necessária para embalar o filme de uma maneira interessante. E é verdade que a película tem alguns ápices cômicos, e se eles fazem rir, é mérito exclusivo do roteiro e da interpretação dos atores. Se Von Donnesmarck faz alguma coisa, é tornar qualquer momento mais opaco. E não é uma implicância sem motivo. O cineasta tem até bons momentos - como nos closes máximos nos protagonistas, que são esteticamente interessantes, e em um ou dois zooms ágeis bem eficientes - mas comete erros desnecessários - os closes no vilão são tão imperfeitos que beiram o amadorismo - e não consegue mudar seu estilo gelado um milímetro para favorecer o resultado final.




Ao acender das luzes, fica a sensação indigesta de uma metalinguagem sarcástica: O desfecho do longa é tão ridiculamente inconcebível , que passa a impressão de que uma persona do filme brincou e pregou uma verdadeira pegadinha em todo o resto dos personagens , do mesmo modo como O Turista prega uma peça maldita no público que pagou para assistir um produto lastimável . Poderia me estender ainda para falar nos inúmeros buracos de roteiro que saltam aos olhos numa avaliação final, mas é melhor parar por aqui. O Turista é, afinal, como Salt: Um produto descartável que não merecia nem existir.


Nenhum comentário:

Postar um comentário