sábado, 7 de janeiro de 2012

Cavalo de Guerra

Cavalo de Guerra
(War Horse, 2011)
Drama - 146 min.

Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Lee Hall e Richard Curtis

Com: Jeremy Irvine, Peter Mullan, Emily Watson, Niesl Arestrup, David Thewlis, Tom Huddlestone, Benedict Cumberbatch

Steven Spielberg é um mestre naquilo que faz. Um manipulador de mão cheia, capaz de conseguir extrair lágrimas dos mais frios e de emocionar com quase qualquer história quando inspirado, o diretor parece ter voltado a boa forma depois da tragédia Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal. Lançando no mesmo ano Cavalo de Guerra e Aventuras de Tintin (ainda não visto) Spielberg parece ter retomado o ritmo de produzir duas obras num mesmo ano, como fez em 2005 com Munique e Guerra dos Mundos, em 2002 com Prenda-me se for Capaz e Minority Report e principalmente 1993, quando entregou o drama de guerra emocionante Lista de Schindler e um dos maiores blockbusters da história do cinema: Jurassic Park.

Em sua nova produção com cara de Oscar, Spielberg fala sobre a busca do ser humano por um avatar que simbolize a esperança em meio às dificuldades. Acompanhando a historia de Albert Narracott (interpretado por Jeremy Irvine) um jovem garoto que treina um cavalo arredio para ajudar sua família pobre na fazenda arrendada e cheia de dividas, Spielberg nos coloca no lugar do garoto (a principio) mas especialmente no lugar do animal, chamado de Joey (que é o personagem principal do filme) acompanhando suas reações a um mundo novo e em suas várias aventuras.

A primeira meia-hora do filme lembra uma série de outros que exploram a relação homem-animal de forma até cafajeste, apelando para a emoção fácil do espectador, porém, quando a trama passa a contar com a variável da Primeira Guerra,a produção muda de tom e passa a utilizar o animal como epítome de umas serie de sonhos e expectativas dos vários personagens que passam a conviver com o cavalo. Desde os cavaleiros do exercito britânico (os bons Tom Huddlestone e Benedict Cumberbatch), passando por uma petulante jovem francesa, por dois irmãos alemães muito unidos e um tratador de animais também alemão, culminando na sequencia em que mostra como (segundo Spielberg) a humanidade ainda tem salvação, lembrando bastante o ótimo filme francês Feliz Natal em sua proposta.


A ideia de situar boa parte da projeção a partir das ações perpetradas pelo cavalo só aumenta a sensação de que o animal é quase um messias, uma criatura dotada de sabedoria e inteligência superior aos homens e que está vagando pela terra para trazer esperança aos atingidos por suas próprias deficiências. Spielberg faz de Cavalo de Guerra o seu libelo (mais um) contra a violência, e se em Lista de Schindler o foco foi um homem arrependido, Soldado Ryan mostrou-se a coragem diante do fogo e em Munique, os problemas da vingança, aqui é a esperança antropomorfizada em um animal, um ser sem vaidades, cobiça ou ódio.

Spielberg também acerta tecnicamente já que auxiliado por seus parceiros de longa data (o fotografo Janusz Kaminski, o designer de produção Rick Carter, e o compositor John Williams entre outros) consegue uma sinergia muito peculiar ao seu trabalho, que ao mesmo tempo em que é previsível no conteúdo é muito bem realizado na forma, em especial nas escolhas da fotografia que destacam os muitos e variados cenários em que o filme se passa. 

Em Cavalo de Guerra, somos levados de uma idílica fazenda britânica, cercada de montes, pedras e uma vegetação rasteira, aos gloriosos campos de trigo dourados, onde a cavalaria britânica surge como se brotasse do chão, nessa que é a sequencia mais bonita de todo o filme. Conhecemos também o cinzento dia a dia do front alemão, onde se destacam a intenção de transformar o lado perdedor em uma região desesperançosa, como se o filme (de forma até infantil) precisasse reforçar ao espectador que aquele lado sairá perdedor na guerra. Já quando o filme mostra um pequeno chalé em solo francês, a cor e a alegria é novamente focada, com destaque especial também para a ótima direção de arte (Neil Lamont e equipe) que se destaca por ser a porta-voz da beleza clássica no filme. O escopo da fotografia de Kaminski, não é esquecido durante todo o filme, já que entranhado na historia de superação animal, está um filme de guerra, e em especial em seus últimos minutos. 


Diferente do que fez em Resgate do Soldado Ryan, no entanto, Spielberg filma suas cenas de batalha campal com mais fluidez e elegância, e com certa distância do cheiro de terra pisada e da sujeira dos corpos atingidos. Parece ter sido mais reverente com os soldados na primeira guerra em campo, deixando para concentrar-se no que acontece nas trincheiras da guerra, nessa que foi a última guerra em que os exércitos se enfrentavam em campo aberto diretamente.

Apesar de acompanharmos uma história simples e até em certos momentos enfadonha (já que o personagem principal do filme fica por boa parte do tempo longe de seu objetivo, e por boa parte da projeção o garoto Albert não é visto no filme, nos deixando a mercê de uma serie de outros personagens que em maior ou menor grau ocupam esse lugar de leading role no filme) a epicidade conseguida por Spielberg compensa os eventuais momentos excessivamente melodramáticos (e sim, eles existem em um considerável número).

Em um filme em que existem tantos atores em pequenos, porém significativos papéis, fica até difícil destacar alguém, mas é impossível não comentar que o jovem Irvine é fraco e incapaz de emocionar ninguém, deixando a cargo do cavalo (pois é) o fardo de emocionar a platéia. A jovem impertinente e doce Celine Buckens que faz a garota francesa Emilie e os dois soldados, um britânico e um alemão que se unem em uma causa comum durante a cena mais bonita do filme são os destaques positivos desse filme em que muitos personagens deveriam ser cortados para o bem do filme e do humor do espectador.


Cavalo de Guerra não é original, é profundamente previsível e até arrastado em suas mais de duas horas e vinte de filme e de um classicismo que beira a chatice. Mas é um desbunde emocional (embora covarde em alguns momentos), particularmente doce e sensível em suas relações e tecnicamente uma aula de gêneros cinematográficos (filme de guerra, suspense, comédia, drama familiar). Uma pena apenas que Spielberg pareça ter se acovardado, e esquecido que o maniqueísmo funciona, é verdade, mas que dele sempre esperamos muito mais.

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