sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Os Descendentes

Os Descendentes

(The Descendents, 2011)
Drama/Comédia - 115 min.

Direção: Alexander Payne
Roteiro: Alexander Payne, Nat Faxon e Jim Rash

Com: George Clooney, Shailene Woodley, Amara Miller, Nick Krause, Matthew Lillard, Judy Greer, Beau Bridges, Robert Forster e Patricia Hastie

É muito difícil não gostar do novo filme de Alexander Payne. Além de contar com uma história dolorida e que é próxima dos espectadores de todos os lugares, credos e idades, o faz de maneira a fugir o máximo que pode do melodrama, apostando em misturar uma situação complicada (e que com o decorrer da trama torna-se também complexa) e obviamente dramática com momentos em que o humor predomina e alivia a tensão do filme, fazendo-o divertido e leve, apesar do tema.

Essa é uma característica de seu diretor (e um dos roteiristas) Alexander Payne, dos ótimos Sideways, Confissões de Schmidt e Eleição. Em sua filmografia, Payne sempre se especializou na chamada dramédia, em que a partir de um drama ou de uma situação mais complicada, recheia seu filme de pequenos momentos cômicos que fazem a mensagem de seu filme ser melhor absorvida pelo público, que não é "obrigado" a receber seguidas pancadas em temas mais duros (como é o caso desse Descendentes).

O filme fala de Matt King (George Clooney) que é um pai relapso e que nunca foi verdadeiramente presente na vida de suas filhas, a pequena e engraçada Scottie (Amara Miller) e a adolescente Alexandra (Shailene Woodley) até que um acidente muda a vida de sua família. Sua mulher Elizabeth (Patricia Hastie) acaba ferindo a cabeça em um passeio de barco e entra em coma. Com isso, Matt que nunca foi um marido ou pai ideal precisa encontrar forças para lidar com a situação ao mesmo tempo em que tenta uma aproximação das filhas. Para complicar sua condição, durante sua vigília (e isso não é um spoiler pois até o trailer do filme entrega isso) descobre que sua mulher tinha um amante, e junto, com suas filhas parte para encontrá-lo.


Clooney é a alma e o coração do filme. Caracterizado aqui como um homem de meia idade nada elegante ou preocupado com sua imagem de galã (a corrida com o "freio de mão puxado" até a casa de um casal de amigos é um exemplo disso), o ator tem mais uma oportunidade para demonstrar que é maior do que a aura de astro de Hollywood, que insistem em impingir ao ator. Sóbrio e até um pouco apalermado, Clooney consegue fugir das "caretas" características e apresentar um trabalho que ao mesmo tempo em que é contido, é emotivo sem ser piegas ou melodramático.

Outro pilar do filme é a surpreendente Shailene, que interpreta a filha mais velha do Clooney. Alexandra vive em outro ponto do arquipélago do Havaí, internada numa espécie de colégio interno. Como uma típica adolescente rebelde, é cheia de provocações e atos de alto-afirmação. Porém, quando o pai lhe explica a real situação da mãe, a personagem muda e a partir de uma excelente cena na piscina (em que o diretor inteligentemente coloca a personagem mergulhando e começando uma crise de choro embaixo d'água) torna-se tão importante para a trama quanto o personagem de Clooney, já que é a partir dela que a trama toma outra proporção quando ela revela (e isso não é um spoiler já que está mesmo no trailer do filme) que sua mãe tinha um amante e pretendia se separar do pai.

Esse novo fato faz o filme crescer tanto como drama humano, já que agora Clooney precisa administrar a inevitável morte da esposa ao mesmo tempo em que descobre que ela não o amava, como ganha um norte, já que a partir desse fato Matt parte em busca do tal amante, e aproveita a situação inusitada para se aproximar mais das filhas e do namoradinho da mais velha, o hilário Sid (Nick Krause).


Os diálogos criados pelo excepcional roteiro de Payne, Faxon e Rash dão riqueza ao filme, que não abre mão de emocionar o público sem precisar apelar para o óbvio, encaixando observações sobre o cotidiano aqui e ali. Em especial, a pena afiada do trio é dirigida para as dificuldades de relacionamento entre uma geração mais "castrada" e a nova e desbocada geração Z.

Porém, nem só de piadinhas vive o ótimo texto de Descendentes. Ao longo da história, marcada por uma tragédia, a sensibilidade e a destreza são à base do filme. Sensibilidade que nunca resvala no clichê melodramático dos filmes ditos dramáticos, e destreza para concatenar a mistura entre humor e lágrimas.

Os cenários belíssimos do Havaí também ajudam (e muito) a aumentar a sensação de estupefato e de grandiosidade. Já que em outra ponta da história, Payne coloca seu protagonista em uma iminente venda de um antigo terreno da família, que em conjunto com seus muitos (mesmo) primos, deverá ser vendido antes que a família perca a chance de ganhar dinheiro com ele. Daí é que Payne tira seu título, a mistura entre o seu encontro emocional com sua descendência direta (filhas) e da sensação de culpa que ele tem ao precisar pensar em se desfazer de uma herança conquistada por seus antepassados. Seriam os descendentes capazes de julgar as intenções de seus antepassados? Seria justo das a eles o poder de decidir sobre as vigas fincadas pelos mais velhos? Ou como faz o personagem de Clooney, pensar de verdade no que seus atos podem fazer a seus próprios descendentes? Em suma, ser humilde quanto a sua finitude e perceber que um ato feito hoje, tem repercussão no futuro de quem amamos.


Parece ser essa a mensagem de Payne, que mesmo tendo em mãos um tema que lhe renderia diversas discussões e símbolos bélicos, prefere apostar na civilidade, na compreensão mútua e no respeito à situação. E principalmente, no global, na percepção que os seres humanos são falíveis e apontar os dedos enfurecidos nunca resolveu os problemas de ninguém.

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