É com muito pesar e sempre atraindo o descontentamento de meus colegas de cineclube que olho atualmente para as telas de TV e vejo algumas das chamadas símbolos sexuais da contemporaneidade. O que pode haver de realmente interessante em máscaras de botox, corpos siliconados em demasia e outras intervenções cirúrgicas que eu tenho até medo de explicar para os leitores desse humilde blog? É, meus amigos e confidentes virtuais, beleza está virando motivo de discórdia (ou, no mínimo, de discussão que pode render meses e meses de debate sem chegar a lugar nenhum). E não pensem vocês que as musas de cinema estão livres desse universo plastic surgeon! Não, senhor. Há exemplares exóticos em grande número desfilando pelas ruas de Hollywood e adjacências. Nem todo mundo (que bom seria se fosse!) pode ser uma Charlize Theron...
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Em cena, no "clássico" da Sessão da Tarde:
Allan Quatermain e as Minas do Rei Salomão |
Mas eu não ia falar de musas? Claro! E vou. O caso é que a musa de hoje me remete a um tempo em que seios gigantescos, coxas musculosas e lábios carnudos em excesso eram coisa, no máximo, de heroína underground de histórias em quadrinhos. Não era isso que se procurava na tela grande. Vide o sucesso causado pela atriz Sharon Stone quando despontou para o estrelato. E olhe que se tratava meramente de uma estudante universitária de desempenho acima da média, mas com um comportamento anti-social bastante presente em seu caráter. A primeira vez que a vi atuando - algo em torno da época em que ela devia já ter sido eleita Miss Pensilvânia - foi em duas produções de aventura ao lado do ator Richard Chamberlain, que interpretava o heróico personagem dos livros de H. Rider Haggard Alan Quatermain, nos filmes As Minas do Rei Salomão e Alan Quatermain e a Cidade de Ouro Perdida (ambas produções de Menahem Golan e Yoram Globus). Sharon, linda, esbelta, cabelos loiros ainda encaracolados, já mostrava um pouco do sex appeal que seria sua marca registrada nos anos seguintes.
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Nem precisa de legenda... |
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"Lesbian Chic" |
Entretanto, sua estreia realmente se deu quando Woody Allen a chamou para ingressar o elenco de Memórias (em 1980), quando ainda era uma contratada da agência Ford Models. O estrelato, então, só começaria a bater em sua porta com Instinto Selvagem (1992), do diretor Paul Verhoeven, com quem já trabalhara dois anos antes no longametragem de ficção O Vingador do Futuro, baseado em conto do escritor Phillip K. Dick. Na pele de Catherine Tramell - até hoje sua personagem de maior destaque ao longo de toda a carreira -, marcou uma geração de cinéfilos, principalmente o público masculino, pela cruzada de pernas mais famosa da história do cinema, e por suas cenas calientes com o ator Michael Douglas que, anos mais tarde, quando casou com a atriz Catherine Zeta-Jones, assinou um contrato pré-nupcial por conta de seu suposto "vício em sexo" (uma história muito mal esclarecida até hoje). O fascínio pela personagem femme fatale de Stone rendeu a atriz até mesmo um convite para posar nua pela Playboy.
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Em "Invasão de Privacidade", com um dos mil irmãos Baldwin |
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Sly & Stone em "O Especialista" |
Passada a fase da novelista policial ninfomaníaca, continou marcando presença nas telas com personagens sensuais e poderosas, seja na pele da inocente, mas sedutora Carly Norris, espionando a intimidade alheia em Invasão de Privacidade, na vingativa May Munro de O Especialista, capaz de tudo para destruir o homem que matou seus pais (e aqui um aparte mais que necessário: como esquecer a cena do chuveiro em que contracena com o ator Sylvester Stallone?) e a pistoleira Ellen que retorna à sua cidade natal para acertar contas com o passado num torneio de vida ou morte em Rápida e Mortal, inusitado projeto de Sam Raimi (então famoso por seus filmes de terror de baixo orçamento). Até a chegada do fantástico ano de 1995 e o convite de Martin Scorsese para interpretar a inebriante e letal Ginger McKenna, o elo de paixão e ódio dos personagens mafiosos vividos por Robert de Niro e Joe Pesci em Cassino. Uma interpretação poderosa que lhe rendeu o Globo de Ouro de Melhor Atriz e uma posterior indicação ao Oscar.
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"Bad Ass Chick" no western "Rápida e Mortal" |
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Deslumbrante e arrebatadora em "Cassino" |
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Diabolique |
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De cabelos curtos em "Esfera" |
Daí em diante sua carreira sofre uma queda considerável, apesar de sua beleza continuar em evidência. Porém, mesmo seu carisma não consegue alavancar produções apenas medianas - mesmo sendo algumas delas dirigidas por nomes de peso da indústria -, tais como Diabolique, de Jeremiah Chechik, dividindo a atenção com a também exuberante Isabelle Adjani; Esfera, de Barry Levinson, em que não consegue convencer na pele de uma cientista, mesmo estando acompanhada da dupla Dustin Hoffman e Samuel L. Jackson; Garganta do Diabo, de Mike Figgis, Onde o único personagem consistente parece ser a casa onde os personagens moram; Mulher-Gato, de Pitof, filme em que o diretor conseguiu destruir a reputação da personagem dos quadrinhos Selina Kyle (vivida por Hale Berry), até retornar 14 anos depois a personagem que dera o pontapé a toda a sua ascensão profissional (contudo, Instinto Selvagem 2, de Michael Caton-Jones, se mostra um thriller vazio, sem brilho algum e com psicologia de mais e sexo de menos).
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Queimando o filme em "Mulher Gato" com Halle Berry |
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Com Dennis Quaid em "Garganta do Diabo" |
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Sem repetir a mesma magia em "Instinto Selvagem 2" |
Nesse ínterim uma notícia externa aos sets de filmagem suscitou muito mais comentários do que seu próprio trabalho frente às câmeras: a notícia de que a atriz tinha um coágulo no cérebro, o que provocou um sumiço repentino da musa das telas. Nos últimos tempos, entre pequenas participações, papeis de pouco destaque e produções em que a própria atriz bancou do bolso, as que tiveram algum destaque - mesmo que momentâneo! - digno de nota em jornais e publicações voltadas para a sétima arte foram Bobby, belíssima produção do ator/diretor Emilio Estevez em que narra o dia do assassinato do então candidato a presidência da república nos EUA Robert Kennedy (e aqui uma observação importante: muito se comentou, na época, sobre a cena curta em que contracena com Demi Moore, outra que andava sumida dos holofotes desde sua desastrosa participação no filme Striptease, que quase deu fim a sua carreira) e o drama Alpha Dog, de Nick Cassavetes, onde seu maior destaque atuando foi numa das últimas cenas em que contracena exibindo uma silhueta gorda e flácida, construída para mostrar a derrota e a amargura de uma mãe que nunca superou a perda do filho, morto dias após seu sequestro.
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Em pequena, mais marcante participação em "Bobby" |
Desilusões e contratempos à parte, Sharon Stone (pelo menos em minha memória) ficará eternamente gravada como beleza natural e verdadeira, diferente de certas aberrações tratadas como musas nos dias de hoje. Numa era onde beleza é sinônimo de armaduras marombadas feitas em academia, lembro com saudades do tempo em que essa magnífica blonde star exibia sua exuberância e charme inigualáveis em personagens pra lá de sensuais. Onde foram parar esses tempos mágicos?
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