segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Wall Street 2: O Dinheiro Nunca Dorme
(Wall Street: Money Never Sleeps, 2010)
Drama - 133 min.

Direção: Oliver Stone
Roteiro: Allan Loeb e Stephen Schiff

Com: Michael Douglas, Shia LaBeouf, Josh Brolin, Carey Mulligan, Eli Wallach, Susan Sarandon e Frank Langella

Wall Street é um marco dos Anos 80. Não apenas satisfeito em alçar Charlie Sheen ao estrelato e transformar Stanley Weiner em exímio roteirista, o filme ainda criou o genial vilão Gordon Gekko, interpretado por um oscarizado Michael Douglas. Seu "Greed is Good" virou um dos maiores bordões dos icônicos vilões que cercam Hollywood. Agora, depois de 20 anos, Oliver Stone demonstrou não manter a regularidade e virou o inconstante diretor que é hoje, que alterna projetos bons como W. com excentricidades como seu recente documentário sobre o regime de Hugo Chávez na Venezuela. E é nesse cenário que Stone retoma as câmeras pra continuar a história de seu seminal filme oitentista. E o contexto histórico ajuda afinal a Crise Econômica de 2008, o período em que se passa o filme, é um prato cheio para contar histórias sobre a Bolsa de Valores e seu mundo tão peculiar. Deixo bem claro que não assisti ao primeiro filme, logo, essa crítica procurará avaliar a continuação apenas como um filme, sem se deixar levar pela análise-comparação que se tornaria se eu tivesse assistido o longa de 87.

A trama segue um jovem corretor chamado Jacob Moore (Shia LaBeouf), que está em alta no mercado. Ele trabalha para a empresa de Lewis Zabel (Frank Langella) e trabalha com as ações em Wall Street. Jacob pensa em pedir Winnie (Carey Mulligan) em casamento, mas ela não gosta muito disso pois se lembra da relação traumática entre seus pais. Porém, Winnie é obrigada a conviver novamente com seu pai, ninguém menos que o lendário Gordon Gekko (Michael Douglas), quando Jacob começa a se reunir com o personagem de Douglas, do qual é grande fã, para pedir conselhos sobre a Bolsa que está começando a declinar com a falência da companhia de Lewis. Em troca, Jacob ajudará Gekko a se reconciliar com sua filha. Mas quando Lewis tem um destino ruim, Jacob encontra Bretton James (Josh Brolin), o homem responsável pela quebra da empresa e começa a pensar num plano de vingança.


O roteiro escrito por Allan Loeb e Stephen Schiff é competente em apostar no filme de 87 para trazer um fôlego novo aos filmes de golpe, em demonstrar a agilidade digna dos melhores filmes de roubo, mas falha grandiosamente quando procura solucionar problemas do passado. Jacob precisa de um elo entre ele e Gekko e, por isso é criada sua namorada, filha dele. E criando um personagem que toma tanto tempo de tela apenas por falta de desculpa melhor pra juntar Jacob e Gekko, o filme perde um pouco. Fora que, tentando dar uma profundidade maior ao arrependimento do lendário corretor, a importância de Winnie cresce e ela funciona como o escape dramático do filme. Mas as soluções apresentadas ali são arquetípicas e, algumas vezes, incongruentes.

Peguemos por exemplo a cena da festa, a conversa de Winnie e Gekko. O arrependimento do personagem pode até soar verdadeiro, mas o rápido convencimento de Winnie no perdão é estranho e meio deslocado. Assim, a personagem é mais um problema do que um ponto pro filme. Pode até dar um fundo dramático, mas prejudica o filme quando se pensa que ele podia ser mais cínico, mais ácido e menos emotivo.

Mas ainda temos a parte ágil do filme, a ácida, a do mercado das ações. E ela não poderia ser melhor, registrada muito bem pelo diretor e escrita soberbamente. Sem explicar roteiro e tendo diálogos espetaculares e críveis, o filme avança muito nas partes da Bolsa, inclusive na parte final, quando temos uma reviravolta esplêndida. Se focasse apenas nessa inovação que é mostrar o mercado da bolsa de dentro pra fora, o filme ficaria facilmente entre os melhores do ano. Mas o drama impede isso e Wall Street 2 acaba, no final das contas, tendo um roteiro acima da média, mas que poderia ser melhor.


Se o roteiro fica devendo, tecnicamente o filme é impecável. Oliver Stone parece estar em sua melhor forma, apresentando takes interessantes e, nas passagens da Bolsa de Valores, é espetacular. Apresentando vários cortes ágeis, cortando a tela em dois, três ou até quatro pedaços pra mostrar o caos que é o mundo das ações. Agilidade marcante, com uma fluência impressionante, uma direção soberba. Nas partes dramaticas, entram os takes bem planejados mas lentos, com calma, sem aquele panorama corrido que marcava as sequências na Bolsa. Consegue enquadramentos competentes e uma direção de atores ótima, mostrando algo um pouco (apenas um pouco) diferente do que se vê ultimamente nos filmes dramáticos. A fotografia de Rodrigo Prieto faz o feijão com arroz, retratando bem a cidade de Nova York e só. Poderia se sair melhor se quisesse, por exemplo, utilizar o filtro de câmera que foi usado no espetacular cartaz. Porém, só conseguimos ver aquela fotografia sombria na conversa de Bretton com Jacob na sala do primeiro.

A edição de David Brenner e Julie Monroe é muito boa, sendo destaque nas anteriormente citadas sequências do mundo das ações. Auxiliando a direção de forma impecável, a edição é um dos destaques. Já a trilha sonora de Craig Armstrong é composta de maneira precisa. O curioso dessa trilha, e que faz ela ser um pouco acima da média, é que Armstrong faz a "agitação" (que retrata o mundo corporativo) com instrumentos clássicos, o que dá um ar novo a tudo aquilo.


As atuações de Wall Street 2 são ótimas, como era de se esperar. Shia LaBeouf demonstra que pode criar um personagem crível e interessante, com carga dramática e se distanciar do seu Sam Whitwicky de Transformers. Claro que não há como não notar a semelhança do biotipo do ator com Joseph Gordon-Levitt, um ator mais competente (e que ficaria melhor no papel). Mas Shia mostra seu talento e faz com que esqueçamos da tal semelhança. Carey Mulligan tem um papel reduzido e, como citei anteriormente, meio dispensável. Mas mesmo assim é definitivamente uma das atrizes mais completas atualmente. Mesmo sem muita relevância na trama, Carey marca sua presença em cena com dignidade. Se Josh Brolin tem um papel estendido e só faz o caricatual vilão, sem ir muito além disso, temos Frank Langella no outro espectro. Mesmo tendo pouco tempo de tela, Langella engole qualquer um com sua atuação e mostra ter diferentes facetas, ficando irreconhecível se pensarmos que aquele cara era o Nixon.

Mas todos sabem que o mais legal do filme só poderia ser mesmo Michael Douglas. O espetacular ator, com atuações tão marcantes quanto os próprios filmes (Wall Street, Um Dia de Fúria), fica á vontade no papel que rendeu o Oscar a ele. No início do filme, aparece mais retraído, quase sentindo nostalgia de tudo aquilo e sendo um mero coadjuvante de luxo. Porém, quando a trama vai ganhando duração, Douglas aparece mais e mais e seu comportamento vai mudando de forma. É interessante acompanhar esse processo pois parece que Douglas foi se reacostumando com o papel, provando a si mesmo que estava enferrujado e precisava voltar com o tempo ao lendário homem. Atuação soberba, que faz valer o ingresso e que deve fazer muita gente que viu o filme de 87 sentir nostalgia, principalmente na virada da trama, próxima do final.


Aliando uma técnica vencedora e um elenco vitorioso, Wall Street 2 era jogo ganho. Mas seu roteiro se autosabota em alguns pontos e isso prejudica o filme de ser algo marcante como o filme de 87. É sempre bom ver Oliver Stone de volta a forma depois de direções insossas como em As Torres Gêmeas e também é bom ver um elenco tão estrelado e competente junto, tendo todos (menos Shia) os principais atores indicados ou vencedores do Oscar. Porém, os rumos dramáticos do filme impediram que a agilidade caótica da Bolsa de Valores ocupasse todo o tempo de duração, resultando em algo marcante e espetacular. E aí entra a personagem de Mulligan e o núcleo da família Gekko. É estranho pensar que sem apelar pro drama arquetípico, o filme poderia ser um dos melhores lançamentos do ano. Apesar de seus erros e percauços, Wall Street 2 vale o ingresso, seja pela nostalgia ou pelos momentos inspirados do mercado financeiro.


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