The Last Station
(The Last Station, 2009)Drama - 112 min.
Direção: Michael Hoffman
Roteiro: Michael Hoffman
Com: Christopher Plummer, Helen Mirren, James McAvoy, Paul Giamatti e Kerry Condon
Observem esse elenco: Christopher Plummer, Helen Mirren, Paul Giamatti e o jovem e competente James McAvoy. Fabuloso não acham? Ainda mais quando todos eles estão em momentos inspirados, dando o melhor ao que seus personagens pedem.
Então porque Last Station não é um filme fabuloso? Porque o que o filme pede a esses atores é muito (mesmo) menos do que eles são capazes de fazer. Não que estejam mal no filme, muito pelo contrário, mas a narrativa que estes personagens estão inseridos é cheia de pequenos problemas. O mais notório deles é o abuso que Michael Hoffman (diretor e roteirista) faz do melodrama. Embora tente mostrar os últimos dias de Tolstoi (Plummer) como uma serena aventura rumo ao fim da vida, ao mesmo tempo em que Bulgakov (McAvoy) que funciona como narrador, é o foco do filme, o filme se caracteriza pelo excesso. Excesso de explicações, excesso de zelo com seus personagens e excesso de consistência naquelas figuras.
Tolstoi (o mítico autor de Guerra e Paz) é retratado como Jesus Cristo. Não no sentido de santificação (embora alguns "amantes" do autor o julguem assim) mas como alguém que disse coisas que foram subvertidas e aproveitadas por seguidores que não eram dotados da sensibilidade do autor. Ao mesmo tempo, e isso é um tremendo mérito na pungente interpretação de Plummer, em que o homem por trás do mito é mostrado como uma pessoa cansada, mas ainda apaixonada por sua esposa e por seus ideais, o que é o verdadeiro conflito do filme.
Sofia, sua esposa, represente esse conflito, já que é vista como uma mulher loucamente apaixonada, extremamente sanguínea e transtornada por esse amor. Uma diva de ópera (como o próprio filme adjetiva) que não consegue enxergar o outro lado da história.
O problema é que o filme não sabe que caminho seguir. De um lado temos essa linha que apresenta o casal idoso, mas ainda apaixonado, as voltas com os problemas comuns de uma relação longa. Rotina, dificuldade para "engolir sapos", problemas de convivência e o afastamento gradual dos corpos e mentes.
De outro temos o jovem Bulgakov (outro autor famoso) que conduz a história como uma espécie de mediador entre o pensamento dos "tolstonianos" (um grupo de pessoas que usava os textos e ensaios do autor quase de forma religiosa, inserindo contextos e apresentando as visões do autor como verdades absolutas) representados por Grigorevich (Giamatti) e sua própria história e ideais que são modificados quando ele conhece a jovem e bela Masha (Kerry Condom).
O filme tenta mesclar essas duas narrativas e ainda insere um conflito entre a visão de Sofia e a de Grigorevich sobre o homem por trás do mito. No meio deles Bulgakov é uma espécie de espião duplo, servindo como informante primeiramente a Grigorevich, mas com o tempo parece nutrir afeição a figura trágica de Sofia e profundo respeito e admiração pelo homem Tolstoi, numa desmistificação bastante feliz.
Essa desmistificação surge logo no primeiro encontro entre o então apaixonado e fervoroso tolstoniano Bulgakov e seu ídolo. A sutileza de Plummer ao conduzir a conversa contrasta com a reação de McAvoy (no seu melhor momento no filme) que se emociona com a humanidade apresentada por seu ídolo. Naquele momento ele percebe que além de grande autor, Tolstoi (pelo menos no filme) é um homem. E como tal, tem diversas qualidades e defeitos, que transformam o mito em gente comum.
Quando o mito sofre esse efeito, seus admiradores (e principalmente quem lucra com o estado de "endeusamento") tendem sempre a castrar essas tentativas. No filme o detestável Grigorevich tenta de todas as formas impedir que Tolstoi desça do pedestal criado por ele. O tal tolstoianismo é ridicularizado pelo filme, em especial a regra que impede o sexo, que por si só é uma besteira tão grande, que nem precisava ser refutada.
Por outro lado, Hoffman "destrói" com todo o movimento ao apresentar os líderes como figuras cegas por sua fé. Apesar de sérias restrições, existem algumas idéias no movimento, como a distribuição de renda por exemplo e de terra, que num mundo ideal onde o homem não fosse por natureza corruptível, funcionariam muito bem.
Mas, Last Station é um filme de atores. Plummer, como citei acima, é um poço de sutileza e leveza com seu personagem. Por isso, quando sua fúria é apresentada o espectador tende e se impressionar mais e a comprar a idéia de que aquele homem está certo naquele momento. Instintivamente somos levados a pensar: "ora se aquele homem é tão sereno, somente algo realmente visceral o faria sair do seu estado de quase alpha". Um trabalho notável do ator, que é sempre utilizado em produções dos mais diferentes tipos (outro que vive essa sina é o mítico Max Von Sidow) que não deixam seu talento aflorar. Esse, felizmente deixou.
Helen Mirren é fabulosa. Isso fica novamente claro em Last Station. Além de apresentar um charme quase sensual (que é inerente a atriz, vide seus trabalhos mais antigos) constrói os arroubos de fúria de sua personagem com grande realismo. A cena do jantar, onde ela enfurecida atira pratos e vocifera é das mais interessantes da carreira da atriz. Ali estão combinados o charme, a cólera da personagem e a posterior submissão e drama operístico que fundamentam a personalidade daquela mulher.
McAvoy é um ator de qualidades, e nesse filme apesar de seu personagem ser no cerne, um banana, faz o que dele se espera. É o elo de ligação do público com aquela gente e aquela história. Uma pena é que sendo o personagem um frouxo, o espectador tenda a não levá-lo a sério e achá-lo enfadonho e irritante por boa parte da projeção. Culpa do texto e não de McAvoy, que faz o seu papel dentro daquilo que o filme lhe pede.
Já Giamatti (e aqui o texto acerta, mesmo que o maniqueísmo ronde a esquina) acerta em cheio e mesmo odiando com todas as forças Grigorevich, não temos como não enxergar uma tridimensionalidade em alguns momentos. Ai entra a diferença entre um bom ator (McAvoy) e um excelente (Giamatti). Giamatti vai além do que o texto conta, em especial quando o personagem se emociona ou mesmo fala, com grande crença em suas palavras, sobre os ideais daquele movimento. Por mais que o espectador não compre a pregação, é de reconhecer a força das palavras e principalmente do orador.
Talvez, por termos tantos bons atores que o filme de Hoffman não decole como poderíamos imaginar. Apesar de todo o apuro técnico, em especial da direção de arte (Andreas Olsahausen e Erwin Pub), o filme não trás nada de novo na forma de contar a história, e parece verdadeiramente obcecado em seus interpretes, o que prejudica de forma crítica a narrativa apresentada. Hoffman parece ter (assim como a Academia) se encantado com Plummer, Mirren e Giamatti e esqueceu que aqueles homens e mulheres não eram meras figuras de cera com grande talento. Havia uma história a ser contada, que ficou no meio do caminho, ou na sala de edição.
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