Padre
(Priest, 2011)Ação/Terror - 87 min.
Direção: Scott Charles Stewart
Roteiro: Cory Goodman
Com: Paul Bettany, Karl Urban, Maggie Q, Cam Gigandet, Christopher Plummer, Brad Dourif e Stephen Moyer
O diretor Scott Stewart parece ter predileção por temas sobrenaturais. Seu primeiro filme, o desastroso Legião, já tratava de um tema sobrenatural apelativo. Mas se no filme de 2010 a guerra era contra os anjos, aqui é contra os vampiros. Stewart já tinha demonstrado ter um bom olho pra criações de mundo, afinal o design de Legião era, ainda que batido, eficaz. O design de suas criaturas do mal, combinado com a estilosa maneira de retratar os anjos, fizeram do seu debut na direção um filme com visual correto, mesmo com um tosco roteiro. Agora, Stewart se afasta do roteiro e investe suas fichas na adaptação Padre, baseada nas HQs de Hyung Min-Woo. É interessante acompanhar que o diretor, egresso dos efeitos especiais, constrói uma linguagem própria em seus longas e ao acompanhar Padre, dá pra ver que Stewart está no controle da produção, ainda que claramente não alcance a competência de um Zack Snyder. Mas é paradoxalmente interessante ver um diretor que não se submete a ser um de aluguel e ainda assim não consegue se consagrar como autor.
E Padre já mostra ao que veio nos minutos iniciais, quando lança seu arsenal de estilo numa introdução animada poderosa. Esbanjando violência, com desenhos arrojados e que lembram os de Davide Gianfelice, a sequência é responsável por situar o espectador naquele mundo futurístico, ao explicar a origem dos vampiros e dos Padres (e o que fez com que eles guerreassem). Ainda que desnecessária, ao ilustrar rapidamente algo que acaba cortando uns bons 30 minutos de introdução inteligente e calma, a animação é bem estilosa e serve como uma bela metonímia do filme: um exemplar de roteiro falho e apressado, mas que sobrevive justamente por investir em seu visual ao reconhecer sua limitação.
Cory Goodman, autor da adaptação, começa sua narrativa com certa preguiça. Ao retratar a sociedade atual, controlada pela Igreja Católica, Goodman é extremamente afobado ao se ater a pequenas revelações sobre a ambientação. Scott Stewart ainda cria belos quadros nessas cenas, ao explorar muito bem a cidade futurística, que é tecnológica e sombria por fora e opaca e esgotada por dentro. Tudo isso baseado numa belíssima direção de arte. Mas se visualmente a ambientação é satisfatória, estruturalmente ela é precária. Por que, afinal, os padres são tão odiados pelos humanos? A justificativa só se restringe a uma mera cena num elevador, quando uma mãe diz ao filho que "não se fala com os Padres". Esse preconceito seria baseado em que? Afinal, os Padres foram os grandes salvadores da humanidade quando a guerra contra os vampiros parecia perdida. A postura adotada pela sociedade para com seus salvadores não faz muito sentido e o roteiro de Goodman não faz a menor questão de apresentar uma justificativa bem construída para essa rejeição. Pior: a habilidade dos Padres nunca é explicada. Aparentemente "sobrenatural", a habilidade dos mesmos não se decide entre ser fantasiosa ou extremamente mentirosa. Basicamente, o que precisamos saber é que o Padre, interpretado no automático por Paul Bettany, é injustiçado e só quer levar uma vida calma.
Mas, como sempre, o herói errante é chamado ao dever. A tensa cena em que a sobrinha do Padre é pega, conduzida com competência por Stewart, apresenta bem o estilo faroeste que o filme quer realizar. Ainda que forçada (estamos num futuro conduzido pela tecnologia e o deserto parece ter voltado ao século XIX), a ambientação é bonita e eficiente em seus propósitos. Logo após, chega o xerife (Cam Gigandet, irrelevante) e com 15 minutos de filme, a história principal já começa, cortando totalmente uma introdução mais interessante. Os gigantes prédios da cidade, com uma estética à la Blade Runner, demonstram ser bem mais relevantes que o road movie apressado que se segue a partir daí. O Padre pega sua moto e, junto com o xerife, andam pelo deserto em busca dos tais vampiros que fugiram e raptaram sua familiar.
As introduções ágeis podem ser vistas como um belo exemplo do roteirista, que quer apenas manter uma aura de mistério ao redor do passado daquele mundo. O recurso já foi muito bem utilizado em Filhos da Esperança, mas aqui em Padre, esse recurso é claramente mal empregado, sendo atribuído a "falta de noção" do roteirista que procura encontrar soluções que procurem explicar alguma coisa daquele mundo. Uma cena emblemática é aquela em que o Xerife fala com extrema rapidez com o Padre enquanto o último prepara algumas balas. Tão afobado a ponto de destruir a cena (e a afobação tornaria incompreensível a situação se os diálogos não fossem banais o suficiente pra acompanhar sem atenção), o roteiro parece querer dar um longo salto para a ação. E o roteiro não é o único responsável por essa observação: Scott Stewart deixa de extrair qualquer emoção de Paul Bettany ao cortar qualquer enquadramento que se baseie na angústia do personagem.
Essa angústia, aliás, deriva-se de uma ótima e breve cena pré-créditos, que é bem sucedida ao servir pra dois propósitos: apresentar o porquê da tristeza do protagonista e por introduzir o antagonista, vivido por um competente Karl Urban, que antes era um Padre. Porém, se essa angústia é relevante, ela só serve mesmo pra adicionar mais um fator desnecessário ao herói da produção, que é uma colagem de tudo que já foi testado. Homem que tem que renegar seu código em prol do objetivo? Confere. Guerreiro calejado e relutante? Confere. O herói é o melhor em sua atividade? Mas é claro. E por aí vai. Desde o passado conturbado até o comportamento sombrio, nível capuz na cara, o Padre do título é um arquétipo dos mais canastras. A construção do Xerife não ajuda também. Até mesmo a batidíssima trama de mestre-aprendiz se faz presente aqui, como na cena que o Padre ensina o xerife a matar vampiros com eficiência.
E se a narrativa não apresenta nenhum novo segmento, Padre tinha que investir em alguma coisa. E Stewart, um belo esteta de cinema espetaculoso (era de se esperar, ele é especialista em efeitos), impõe seus arroubos em tela. E tome câmera super-lenta registrando coisas aparentemente banais, como as bolinhas do terço caindo no chão. Stewart é um bom diretor para espetáculo (ele, afinal, é o responsável por Padre não afundar), mas sem apresentar um estilo próprio, o diretor copia todos. A cidade é a de Blade Runner (se Stewart quisesse se distanciar do filme de 82, não filmaria um take IDÊNTICO, mostrando a cidade de cima), o deserto é dos faroestes clássicos, os movimentos de câmera são de Zack Snyder. A comparação com o diretor de Watchmen é relevante, afinal as sequências de ação (principalmente o vigoroso clímax) são mediadas por câmera lenta/acelerada e tem um visual obscuro que remete a 300. A cena em que um vampiro-guardião é morto e é acompanhado num plano por trás, de cima pra baixo, até cair morto entre as pernas de Maggie Q, é a exemplificação da "inspiração" de Stewart.
Mas ainda que anteriormente testado, o visual funciona no saladão que é Padre. A fotografia de Don Burgess, que transita em cerca de 4 paletas durante a projeção, é muito bem sucedida e é confortavelmente o fator forte do filme. O 3D, ainda que convertido, serve muito bem a esse propósito e é realmente divertido acompanhar as estilosas sequências de ação orquestradas por Stewart com profundidade. Um exemplo disso é o massacre no vilarejo, ao som de Requiem de Mozart. Estilosa, bonita e excêntrica, a cena é muito boa e, mesmo com Urban emulando um maestro de forma caricata, funciona. O vilão do filme, vivido pelo mesmo, é interessante por ser um bom nêmesis ao Padre, o que a performance de Urban capta muito bem. A cena, aliás, termina com a crucificação de 3 Padres, o que soa impactante e fecha com chave de ouro a melhor cena do filme.
Bagunçado, estranho, descompassado, mas nunca frouxo, o enérgico Padre serve pra uma sessão boba e descompromissada. Apelando sem dó pros clichês, Padre termina fraco justamente por se ver obrigado a apostar no visual ao não ter um roteiro decente. E sem ter originalidade, acaba se baseando em vários outros visuais e bate no liquidificador. Em coisas teoricamente simples, como a construção da relação da Freira vivida por Q e o Padre de Bettany, o roteiro surge incrivelmente falho. Cory Goodman patina com gosto em todo terreno que pisa, seja no do Road Movie ou do terror. Mas não era de se esperar outra coisa de uma trama tão batida e se resumir a ser um Guilty-Pleasure com ação bem realizada parece ser a opção ideal para Padre.
Que Scott Stewart copia o visual de Snyder é mais que claro. Mas utilizar a música de Mozart que já foi utilizada em Watchmen e Sucker Punch... Isso já deve ser coincidência.
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