sábado, 21 de maio de 2011

Rio
(Rio, 2011)
Aventura - 96 min.

Direção: Carlos Saldanha
Roteiro: Don Rhymer, Joshua Sternin, Jeffrey Ventimilia e Sam Harper

Com as vozes de: Jesse Eisenberg, Anne Hathaway, Rodrigo Santoro, Jamie Foxx, Will I Am e Jemaine Clemant

Um exemplo de sucesso brasileiro no exterior é o diretor carioca Carlos Saldanha. Depois de passar pelos três Eras do Gelo, fazer muito dinheiro com a franquia e chegar até a experimentar o 3D já no terceiro longa da série, o cineasta deve ter reparado que foi muito bom enquanto durou, mas não dava para tirar mais leite daquela pedra. Para seguir no seu sucesso de bilheteria sem mais o ás na manga que foram os filmes gelados, Saldanha então recorre a uma idéia antiga, e também certeira para inflar seu bolso - o potencial do Brasil de exportação.



E então temos Rio, uma animação que utiliza o ''charme brasileiro'' - que hipnotiza qualquer estrangeiro desde os anos 50 com Carmen Miranda - como arma principal para sua vendagem, não só para o público geral (que se delicia com a visão "pseudo-festeira" que se tem daqui) mas também para muito crítico estrangeiro que obviamente não possui conhecimento a fundo do nosso Brasil, muito menos do Rio de Janeiro em si. Nada estranho de se fazer, e por dinheiro vale pintar uma imagem caricata da ''cidade maravilhosa'' e colocar como cerne uma trama esperta sobre dois animais carismáticos. O que atrapalha em Rio são duas coisas: o fato dessa pintura míope do Rio de Janeiro ser feita justamente por um brasileiro - carioca! - e a tal trama esperta que esperávamos, simplesmente não aparecer.



O grosso da história não era mesmo muito inventivo. Nela , Blu , uma ararinha azul nascida no Brasil e levada ainda filhote para os Estados Unidos, enfrenta um dilema: Por ser o último exemplar macho de sua espécie no planeta, tem a tarefa de acasalar com a última fêmea da respectiva espécie, e assim evitar sua extinção. O único problema é que essa fêmea está no Brasil, no Rio de Janeiro, e Blu terá que vir para o clima tropical para realizar sua missão. Para complicar? Blu não sabe fazer o que qualquer ave deveria - voar.


No entanto, mesmo com uma trama inicial tão básica, era possível tirar muito proveito do seu desenvolvimento - coisa que o roteiro simplesmente não faz. Rio entra pela via do fracasso, pois duplica seus fardos de clichê. Explico. Se não bastassem apenas seus problemas narrativos, de uma trama esquematizada, com personagens por vezes sem brilho, e o lugar-comum rotulado na testa, o novo filme de Saldanha ainda se arrebenta mais por abordar um pano de fundo de Rio de Janeiro de maneira cretina. E se engolir Rio já era difícil só considerando seus problemas estruturais de script, seus erros concordância com a realidade carioca só dificultam mais a deglutição. Não é perseguição ou implicância, mas já se repara pelo nome do filme, que o longa tem como objetivo caracterizar a cidade de maneira verossímil, e tomando isso por base, ficam irritantes detalhes como o próprio samba - criança negra sambando dentro de casa sem motivo aparente? Como carioca digo, isso não ocorre no Rio. Carnaval parando a cidade da maneira mostrada? Isso tampouco partilha da realidade.



Mas tudo bem, uma visão embaçada sobre a cidade maravilhosa é comum, e já devemos ficar acostumados com abordagens deturpadas do nosso país e de nossa região. O problema é quando um brasileiro, natural do próprio Rio de Janeiro, realiza um filme que tanto tem de imagético estereotipado, típico da visão de um estrangeiro deslumbrado. O que poderia elevar o longa a um patamar diferenciado, ao tomar a cidade pelo que ela REALMENTE é, tira pontos do filme ao confirmar uma cosmovisão completamente comum e batida. Não é difícil enxergar em Rio, o filme, aquele super otimismo tropical que os gringos tem assim que pousam em terras brasileiras. Muito desse otimismo do filme de Saldanha existe no hip-hop imbecil e marginal de Don Blanquito, também chamado Rio - que o link segue aqui http://migre.me/4yHBH . Don Blanquito pinta o Rio como o harém perfeito, uma festança dos diabos. Um humor involuntário, mas compreensível, já que Blanquito obviamente é só mais um estrangeiro deslumbrado e imbecil a cruzar nossas fronteiras. O inaceitável é que Carlos Saldanha não consiga tirar seu filme desse patamar tão previsível, condenando-o, inevitavelmente, a semi-irrelevância no seu contexto de ambientação urbana, um dos alvos claros da produção.


Ofensas ao modo de ambientar o Brasil á parte, Rio, infelizmente, não apresenta também muitas qualidades no modo de guiar sua própria história. O estilo esquematizado, viradas previsíveis, isso tudo era esperado, e de certo modo até obrigatoriamente relevado pelo crítico que vos fala - é um filme infantil e da Blu Sky, ora bolas. Acontece que Rio não leva muito mais ingredientes no seu preparo. Para no limiar do basico, e não envolve seus espectadores para levá-los um degrau adiante. Desculpem, mas com a safra de animações adultas e inteligentes que desembocam nos cinemas freqüentemente - Rango é só o exemplo mais recente - era de esperar muito mais. Os personagens não são trabalhados com o esmero necessário - apesar de lindos graficamente - e as situações são as clássicas máximas.



Optar pelo clássico, aliás, é o principal problema de Rio, que flerta com várias opções consagradas, onde todas indicam erros claros. Tome por exemplo a introdução da ave vilã. Um momento musical completamente avulso, sem um pingo de necessidade. Blu aliás, é preciso ao apontar ao vilão exatamente isso logo após ele acabar seu número . '' Desnecessário''. É através de erros assim, que Rio estaciona no limbo das animações, no lugar-comum. A verdade é que mesmo com seu colorido belíssimo - e o visual que Saldanha emprega no filme é caprichado - o longa da ararinha azul revela-se narrativamente monocromático, acinzentado e extremamente normal.


É triste dizer isso, mas Rio não aproveitou todo o tema volumoso que podia destrinchar com níveis "semi-pixarianos". Como de costume da Blu Sky, a produção sai meio capenga, mas é divertido o suficiente para alegrar os pequenos - e fazê-los comprar muitos ingressos, já inflacionados pelo 3D. Mais triste que isso, só a maldita metáfora que Rio faz com seu realizador: Assim como Blu, Saldanha é um brasileiro nato, mas, por ter sido criado nas tetas dos EUA, se esquece um pouco do requebrado verdadeiro de sua terra natal. A única diferença é que Saldanha ainda deve se lembrar do que o Brasil é de verdade, mas por uma visão mais lucrativa e estereotipada, porque não fazer vista grossa ?


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