sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Amor


Amor
(Amour, 2012)
Drama - 127 min.

Direção: Michael Haneke
Roteiro: Michael Haneke

com: Jean-Louis Trintignant, Emanulle Riva, Isabelle Huppert

Michael Haneke é um sádico. Só um sádico consegue realizar uma obra chamada Amor sendo tão duro e - porque não - honesto sobre os reais significados dessa palavra. E digo isso sem nenhum ranço do sentimento, ao contrário, já que vejo o filme de Haneke como uma verdadeira elegia ao sentimento mais complexo do escopo dos seres vivos. Haneke nos faz uma pergunta simples e que todos nós nos fazemos, com maior ou menor grau de medo e dúvida: o que acontece com o amor quando ficamos velhos? O que acontece com o amor quando o nosso corpo não nos entende mais? O que acontece com o amor quando vemos aquele a quem dedicamos anos de nossa vida (alguns quase uma vida inteira) se esfarelar diante de nossos olhos?

São perguntas difíceis, densas, dolorosas de ser serem respondidas. E Haneke colocando em frames sua visão de seu próprio futuro (ou presente) faz uso de um casal para dar sua interpretação de uma eventual resposta. Outros certamente transformariam o calvário seguido pelo personagem de Jean-Louis Trintignant em uma obra melodramática recheada de momentos de comoção, de cachoeiras de lágrimas, de abraços sinceros e de resoluções esperançosas.

Muitos fariam isso, mas não Haneke. Famoso por suas obras sem concessões, sem medo de entrar em um campo sempre minado e apostando na teoria de que o ser humano é uma coleção inesgotável de complexos e problemas, sua filmografia não cede espaço para o melodrama aberto (talvez o vejamos transformado em alguns momentos, mas sempre depois da "plástica" aplicada pelo diretor).


Amor, curiosamente, talvez seja o mais "humano" e acessível dos filmes do diretor. Saindo do microcosmo de um casal de idosos absolutamente ativos (ele, ao que parece, um aposentado de posses e ela, uma professora de piano talentosa), Haneke analisa o ser humano tendo de provar o tamanho de seu amor diante da tragédia. Georges (Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva) passam por essa provação, quando Georges começa a perceber que sua amada sofre de algum mal. A historia, praticamente uma longa e lenta transformação de uma rotina comum em tragédia, é filmada com igual voyeurismo que é comum aos outros filmes do diretor. Porém, Haneke parece mais tocado pelo que mostra e por mais que a historia tente nos deixar distanciado daquilo, com seus longos planos estáticos e a dificuldade em percebermos com certeza sobre o que sente Georges ao ver sua mulher naquele estado (apesar de tocado, seu humor varia entre o transtornado com a situação, chocado, resignado, mas quase nunca emocionado), existe ali uma pontinha de carinho por Georges, quase uma posição de alter-ego.

A trama toma forma quando o que antes era uma simples dificuldade se transforma em uma trágica operação mal sucedida que transforma a ativa Anne em uma mulher confinada a uma cadeira de rodas. É ai que vemos pela primeira vez a personagem da filha do casal (Isabelle Huppert) que é a que mais transparece o desespero comum em situações dessa natureza.

Amor é doloroso de ser visto, cansativo e por vezes até assustador, mas é um tremendo trabalho de seu elenco. Se Isabelle Huppert mostra-se inconformada com o rumo da historia e do sofrimento de sua mãe, Trintignant tem uma interpretação fenomenal que transmite sua inconstância de sentimentos pelos olhos e pelos momentos de solidão em que o personagem parece se perguntar sobre que caminho tomar. E finalmente Emanuelle Riva, que no momento em que essa crítica está sendo escrito, já foi laureada com a indicação ao Oscar de melhor atriz. Um trabalho solitário de transformar-se diante de nossos olhos, de mulher ativa, a frustrada, a entristecida, a revoltada e por fim envolvida na insanidade. Tudo isso de forma sutil, mas muito real e dolorosa.


Vê-la sucumbir diante da tela é um aceno triste para todos nós, de uma possibilidade bastante próxima de todos. Ver a reação de seu esposo (um verdadeiro desmoronamento interno) é a perfeita representação de uma possibilidade bastante crível, e talvez por isso ele machuque tanto e seja o filme mais humano de Haneke. Os personagens são tão bem construídos em suas introduções simples e objetivas que nos comovemos com eles e por nos enxergarmos ali, possíveis intérpretes daquele drama.

Claro, que como em todo filme do diretor (não darei spoilers, embora o espectador consiga adivinhar nos primeiros minutos de projeção) a tragédia é gloriosamente apresentada sem nenhuma dose de pudor e, portanto os finais amargos são oferta da casa. E tudo é conduzido com enorme controle por Haneke que nos priva de sentimentalismos nos afundando em agonia.

Amor talvez seja um dos mais honestos filmes já realizados sobre o tema. Ver envelhecer alguém que se ama e ter de lidar com todos os problemas e privações decorrentes dessa condição é uma verdadeira batalha. Agir de forma extremada pode ser visto como maligno, mas a questão que Haneke quer que seu público responda é: você, ali, naquela situação, agiria como? Haneke nos dá uma violenta aula de amor, sádica e poética, como os maiores e mais gloriosos contos sobre o tema que o cinema já contou.

3 comentários:

  1. Amor é daqueles filmes que merecem ser visto, por todos nós, pela boa abordagem que faz dos dramas da terceira idade.

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  2. Apesar de "Amor" ser muito bom, ainda prefiro o "Longe Dela", do qual Haneke chegou a desistir de rodar "Amor" na época do lançamento do segundo.

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  3. : Fazia tempo que não saía de uma sessão de cinema tão pertubardo . Já na primeira cena quando a Anne(Emanuele Riva), aparece morta deitada na cama, já me incomodou , o que se segue foi uma sensação de angustia ao ver uma senhora que até então era boa de saúde definhar e detalhe percebendo que sua doença e irreversivel se recusa a um tratamento que pouco surtir efeito e prefere ser tratada em casa, aqui se começar um outro drama o marido Georges(Jean-Louis Trintignant) demonstra uma certa crueldade não tendo paciencia para enfrenta a situação da esposa a cena do tapa na cara de Anne dada por Goerges, quando ela já não aguentando todo o sofrimento se recusa a beber água é impactante, quando se pensa que as surpresas já acabaram , Georges toma uma atitude extrema mataa esposa sufocando-a com o travesseiro.Toda essas questões me fizeram refletir até que ponto vale a pena prolongar o sofrimento de alguem que viveu intensamente a vida e chega sua velhice vitima de uma doença incuravel e irreversivel e me lembrou um fato bem recente ainda vivo em nossa memória o suícidio do ator Wamor Chagas que tomado por uma serie de doenças, resolveu ele mesmo da fim a sua vida a ficar dando trabalho para outros.

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