quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

As Aventuras de Tintin

As Aventuras de Tintin
(The Adventures of Tintin, 2011)
Ação/Aventura - 101 min.

Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Steven Moffat, Edgar Wright e Joe Cornish

Com as vozes e performances de: Jamie Bell, Andy Serkis, Daniel Craig, Nick Frost e Simon Pegg

2012 começa muito agitado para o mais conhecido diretor de cinema do planeta. Depois de anos afastado da cadeira de direção (Indiana 4 é tão fraco que ignoro sua existência), Spielberg voltou com dois projetos novos e completamente diferentes, tanto em sua proposta narrativa, quanto em seu clima e energia.

Se o Cavalo de Guerra era um modorrento e previsível dramalhão destinado ao aumento do número das vendas dos lencinhos de papel no mundo, As Aventuras de Tintin é o melhor do escapismo "spielberguiano", como há anos o diretor não conseguia fazer. Desde o fantástico Jurassic Park, no paleológico ano de 1992, um blockbuster com sua assinatura não funcionava tão bem. Também marca a primeira incursão do diretor pela até então fracassada técnica da performance capture (que transfere as interpretações dos atores com sensores grudados ao corpo e em frente a uma tela verde para um computador, onde essa performance dá vida a um personagem animado, que por sua vez pode ter a aparência que o diretor quiser) com resultados fabulosos.

Nada melhor do que entregar um "brinquedo novo" a alguém que sabe brincar direito. Robert Zemeckis, o principal lobista dessa técnica e responsável por O Expresso Polar, Beowulf e Fantasma de Scrooge, apesar de ser um diretor competente (afinal um camarada que dirige a trilogia De Volta para o Futuro e Contato não pode ser ruim) não tem nem um décimo do talento de Spielberg. Por isso, é quase "mágico" acompanhar as soluções visuais encontradas pelo diretor para utilizar essa técnica, que pela primeira vez, é realmente bem utilizada.


Spielberg consegue caminhar com grande competência entre o cartunesco e o realismo, assim como a obra original de Hergé, notória pelo trabalho que tinha ao unir a ação típica das tirinhas de quadrinho com uma preocupação estética e histórica na retratação dos cenários onde as aventuras do intrépido repórter aconteciam, como nenhuma outra em seu tempo. Spielberg segue essa cartilha, pois ao mesmo tempo em que vemos deslumbrantes cenários criados pela equipe de animadores (a fantástica cidade portuária no Marrocos é o grande destaque) a ação é tipicamente dos quadrinhos, com pequenos detalhes e "inside jokes" colocadas aqui e ali para divertir o espectador, como por exemplo uma sequencia curta em que um batedor de carteiras perseguido pela polícia tromba na rua com outra pessoa e sobre sua cabeça uma série de canários amarelos surgem voando, para segundos depois, serem resgatados pela dona da loja de animais que fica em frente à ação acontecida.

Spielberg recheou seu filme com essas pequenas piadas e homenagens ao quadrinho original, desde sua abertura, quando um desenhista de rua (talvez o próprio Hergé) faz um retrato de Tintin que é igual ao traço do quadrinista belga. Quando o plano abre vemos uma série de outros personagens também mostrados em retratos com o mesmo traço típico de Hergé. Adiante na projeção, o diretor recheia a sala de Tintin de uma série de recortes de jornal que mostram outras aventuras famosas dos quadrinhos (reconheci duas de saída: O Cetro de Otokar e As Múmias do Faraó). São detalhes que mostram a reverência e o cuidado que o filme foi concebido.

Mas é nas sequencias de ação que Tintin entrega todo o seu potencial. Ficam claros os motivos para que Spielberg tenha optado em criar seu filme com essa técnica, já que seria impossível apresentar sequencias tão energéticas e até cansativas aos olhos - já que muita coisa acontece ao mesmo tempo - caso o filme tivesse sido realizado com as técnicas cinematográficas "comuns". A sequencia de perseguição entre Tintin, o vilão Sakharine e um tanque de guerra é impressionante, de um escopo monstruoso e de uma realização estética impecável. Mas não é só. Mesmo quando precisa diminuir o ritmo, Spielberg o faz com grande competência. Existe toda uma sequencia no deserto que ao mesmo tempo em que desacelera a ação incessante até então, e usada para explicar a história de todo o complô que envolve a história.


História essa, que para quem conhece o quadrinho (ou mesmo a série animada de tv) é muito fiel, apesar de misturar duas histórias diferentes de Hergé. O filme tem o subtítulo de "O Segredo do Unicórnio", obra famosa do autor belga e também trás diversos elementos (em especial no segundo ato, que introduz o personagem de Haddock) de outra obra do quadrinista: O caranguejo das Tenazes de Ouro. Nessa mistura a história começa quando Tintin compra um barco em miniatura que está ligado a um antigo tesouro que era disputado entre o pirata Rakham, o Terrível e o capitão a serviço da coroa inglesa François Haddock. Entra em cena, o misterioso Sakharine que quer a todo jeito o tal barco, já que escondido nele está uma das pistas que leva ao tesouro escondido. Ao mesmo tempo, o coadjuvante mais famoso das histórias de Tintin também aparece por aqui, o famoso Capitão Haddock, um descendente do famoso capitão britânico e um bêbado inveterado, que é famoso por sua incrível habilidade de construir xingamentos inusitados e por seu temperamento explosivo.

A perfeição só não atingida por problemas encontrados na própria historia original, que foi concebida como uma historia em quadrinho ágil, onde alguns acontecimentos são auxiliados por uma mistura de coincidências, acaso e pura sorte, como a própria revelação da pista escondida pelo barco de Tintin. Lembro-me que quando Segredo do Unicórnio foi adaptado para a animação, os dois episódios somavam cerca de quarenta minutos em seu total. O filme de Spielberg tem mais de 100, ou seja, muitas e muitas sequencias de ação foram ampliadas, o que incomoda um pouco, já que o filme tem muito pouco "respiro", seguindo em uma espiral de aventura (de ótima qualidade é verdade), sem tempo para conhecermos melhor nosso protagonista por exemplo.

Essa foi outra saída inteligente dos roteiristas (Steven Moffat produtor executivo de Doctor Who e criador da série Sherlock, Edgar Wright de Scott Pilgrim, Chumbo Grosso e Todo Mundo Quase Morto e Joe Cornish de Chumbo Grosso e Ataque do Bloco) que inteligentemente não optaram por uma história de origem, mas um conto solto no tempo sobre o repórter, assim como os quadrinhos de Hergé. Por outro lado, mesmo em uma aventura solta, pouco nos é revelado sobre a personalidade de Tintin, além de que ele é curioso e muitíssimo inteligente. Quem rouba todas as cenas no entanto, é o Capitão Haddock, um personagem engraçado, espirituoso, cheio de defeitos e impagável. O vilão da trama, o misterioso Sakharine também cumpre o papel de vilão da vez com competência, assim como os detetives mais atrapalhados do planeta, Dupont e Dupont.


Por trás da animação e da movimentação de cada personagem estão atores competentes e um gênio. Jamie Bell (o eterno Billy Elliot e que também esteve em King Kong do produtor Peter Jackson) vive Tintin com a petulância dos quadrinhos e a curiosidade incessante do repórter. Daniel Craig (Bond, James Bond) é Sakharine, e dá ao vilão um misto de charme britânico e a sensação de perigo e astúcia típicas de um bom vilão de quadrinhos. A dupla Dupont e Dupont é interpretada pela dupla número um do mundo, os ótimos Nick Frost e Simon Pegg, repetindo a parceria de Todo Mundo Quase Morto, Chumbo Grosso e Paul.

Mas o grande destaque do filme é Andy Serkis. Já passou da hora de alguém olhar para o trabalho que esse talentoso ator realiza em cada filme que faz e perceber o brilhantismo de cada inflexão de voz, cada movimento realizado e notar que muito mais do que um transmorfo virtual, Serkis é um ator da mais alta qualidade. Seu Capitão Haddock é impecável, grosseiro, mal humorado e engraçadíssimo.

Aventuras de Tintin é o verdadeiro retorno de Spielberg. Leve, escapista até o tutano dos ossos, previsível e profundamente divertido. O primeiro - espero que de muitos - blockbuster de qualidade que chega aos cinemas brasileiros em 2012. Que venha o próximo, quando Peter "Hobbit" Jackson assumirá a cadeira de diretor.


4 comentários:

  1. Caramba que legal eu era fã desse moleque muito bom mesmo a garotada de hoje precisa conhecer esse pequeno herói do passado que muito nos encantou com suas aventuras

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  2. Alexandre é verdade que o filme foi um fracasso de bilheteria nos EUA

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  3. Alexandre é verdade que o filme não bem nas bilheterias americanas

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  4. Alex, é verdade sim. O personagem é quase desconhecido por lá. Em compensação o filme "estourou" em toda a Europa, onde a popularidade de Tintin é tão grande que ele tem até parque temático.

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