quarta-feira, 4 de abril de 2012

Espelho, Espelho Meu

Espelho, Espelho Meu
(Mirror Mirror, 2012)
Aventura/Comédia - 106 min.

Direção: Tarsem Singh
Roteiro: Melissa Wallack, Jason Keller

Com: Lily Collins, Julia Roberts, Armie Hammer, Nathan Lane

Tarsem Singh é cafona e exagerado. Se você não ligou o nome a pessoa, saiba que o sujeito (que dirige esse Espelho, Espelho Meu) é o mesmo responsável por Imortais - o afetado épico grego/kitsch lançado ano passado - o desconhecido The Fall e pelo visualmente impecável, mas mortalmente vazio A Cela. Lembraram? Pois é, pela filmografia registrada, dá para perceber que Singh é um diretor que gosta de uma história de fantasia, de uma "piração" visual e tem problemas patológicos em administrar um roteiro interessante.

Em Espelho, Espelho Meu, Singh tem a chance de apostar em uma narrativa mais leve, e levar suas invencionices visuais para o mundo dos contos de fada. Sai a afetação pós-moderna de butique e entra a pura cafonice, com sua direção de arte descabida (que trás um castelo que emula os palácios dos marajás indianos, vilas medievais tiradas da série Contos de Fada e uma floresta sem escopo algum e claramente produzida em estúdio) e figurinos medonhos, que a exceção da Rainha Má, são de um mau gosto atroz. Mesmo que a ideia seja divertir-se com um baile a fantasia claramente exagerada, a concepção das fantasias de animais, apesar de causarem risos, são muito ruins.

O mesmo vale para os demais personagens que surgem aqui e ali, como uma mistura de Oompa Loompas grandes com figurantes da Capital de Jogos Vorazes. Uma coisa sem pé nem cabeça, que só reforça a ideia de que Singh não sabe o que fazer com suas ideias. É muita coisa misturada e que parece desconjuntada. Mistura-se o exagero palaciano, com os figurinos pobres das vilas que circundam o castelo, mas o figurino "realista" dos anões e a tentativa de transformar Branca de Neve em uma versão afetada de Audrey Hepburn, que definitivamente não combinam. Muita informação visual para pouco resultado em tela.


Já o enredo tenta pelo menos fugir da obviedade. Contando com uma narrativa em off da Rainha Má - a verdadeira protagonista da história, segundo ela mesma - que explica os princípios da historia a ser acompanhada, deixa claro que a ironia e o bom humor serão marca do filme. Branca de Neve aqui, não chega a ser uma mocinha inocente como na historia tradicional, mas não foge muito dos estereótipos das princesas encantadas. Mesmo com uma ligeira dose de revolta, é nas mãos dos anões que o filme ganha terreno. Caracterizados aqui como uma trupe de ladrões que usa pernas de pau para assaltar os incautos visitantes da floresta, são os personagens mais engraçados do filme. A ideia das pernas de pau é ótima, apesar de percebermos claramente que durante as cenas de ação,  dublês - de estatura "normal" - estão realizando as proezas acrobáticas. Outra boa ideia é a de usar o espelho mágico como uma passagem para um mundo fantástico diferente, onde a Rainha encontra uma gêmea que funciona como a verdadeira agente dos desmandos da vilã. Em um desses desmandos faz aparecer criaturas de madeira que atacam determinados personagens o que também é uma ideia visual interessante.

Os problemas, no entanto, são muito maiores do que o figurino e direção de arte fora do tom. Nessa mesma sequencia citada em que surgem essas criaturas de madeira, por exemplo, o diretor peca por falta de capacidade de resolver a contenda envolvendo suas criações de forma inteligente. Quando surgem em tela, os seres se movimentam tais quais marionetes, porém, não vemos os fios que os movimentam. Reparem, que apenas quando outra personagem surge na ação é que os tais fios ficam visíveis, o que indica uma solução fácil para o andamento da ação. Ou seja, Tarsem engana o espectador, apresentando uma realidade, para subvertê-la na cena seguinte, simplesmente por que não conseguiu pensar em nenhuma resposta para resolver sua sequencia.

O mesmo vale para a ideia infeliz de repetir piadas, mesmo quando o efeito cômico já foi provado. Determinado personagem fica preso dentro de uma casa, e por duas vezes, o roteiro de Melissa Wallack e Jason Keller, aposta na piada requentada da "chave que surge do nada". E mesmo que os anões sejam os personagens mais interessantes do filme, o reforço de certos estereótipos e certas frases feitas emperra a narrativa, como o anão sempre apaixonado, ou o metido a estilista, ou aquele que sempre parece emburrado.


Lily Collins, exageradamente séria em sua interpretação como Branca de Neve é outra que deixa o ritmo do filme frouxo. A atriz, diferente de todos os demais, parece ter levado a sério demais a aventura romântica de Singh. Parecendo presa a um estereótipo da "princesa que canta com animais" enquanto todo o resto do elenco entra na ironia com o tema, que parece ser a intenção do filme, embora mal conduzida.

E é só por isso que Espelho, Espelho Meu não é ainda mais abobalhado. A minha impressão é que no primeiro dia de filmagem Julia Roberts, Armie Hammer e Nathan Lane se sentaram com os interpretes dos anões e concluíram que não era possível levar aquilo a sério e que iriam improvisar, tentando transformar aqueles diálogos ruins e história infantil em uma coleção de momentos de puro guilty pleasure.

Roberts é feliz em sua composição da Rainha Má. Retratada como uma mulher arrogante, má de fato, mas muito irônica e parecendo saída de uma novela ruim, é cheia de humor negro, colocações ácidas e momentos de pura arrogância, fazendo da vilã, uma personagem a se torcer. O mesmo vale para Armie Hammer, que distante dos papéis sérios que protagonizou até hoje, é muito feliz em fazer do Príncipe, um sujeito assustado, quase infantil e com aquele ar indulgente e afetado. Lane faz o que acostumamos a ver do ator, o que não é ruim, mas que parece estar no automático, criando as mesmas inflexões e gestual que estão em seus filmes desde sempre.


Espelho, Espelho Meu é uma comédia que tenta ser irônica e não consegue. Tenta seguir o caminho traçado pelo ótimo Encantada, em que os contos de fada são parodiados, com um acréscimo feliz de piadas "adultas" e referências a contemporaneidade, mas peca pelo humor duvidoso, pela protagonista que destoa do restante do elenco e de um diretor sem controle visual sobre a obra que quer contar. Uma piada que causa um riso amarelo constante, poucos sorrisos verdadeiros e raras risadas (embora quando aconteçam sejam vistosas).

Nenhum comentário:

Postar um comentário