sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Lovelace

Lovelace
(Lovelace, 2013)
Drama - 93 min.

Direção: Rob Epstein e Jeffrey Friedman
Roteiro: Andy Bellin

com: Amanda Seyfried, Peter Sarsgaard, Sharon Stone

Linda Lovelace entrou para a história do cinema por ter participado de um único filme. Parece absurdo, pensarmos que na década de 70 um filme pornográfico faria tanto sucesso e receberia tanta atenção da mídia. Se hoje, estamos a um clique de todo tipo de material (inclusive pornográfico), na década de 70 a situação era muito diferente e "Garganta Profunda", o filme estrelado por Lovelace, era de fato completamente novo para o público da época.

Lovelace tinha talento para a pornografia e habilidade para fazer uma coisa que na tela poucas vezes tinha sido vista (se é que tinha sido). Isso catapultou o filme a um sucesso estratosférico. Dizem que faturou impensáveis 600 milhões de dólares, o que me parece um completo absurdo. Mas sim, faturou um dinheiro alto e entrou para a história.

Porém, à margem de tanto glamour, dinheiro e sexo estava a jovem e ingênua Lovelace, uma garota criada em uma família religiosa e tradicional e que se sentindo castrada por sua mãe sai de casa, e encantada com um jovem sedutor embarca em uma vida complicada e sofrida, que geraria traumas e que no futuro faria dela ativista contra a violência contra a mulher e a pornografia.



Lovelace é um filme esperto em sua montagem (a grande qualidade do filme), pois brinca com as expectativas do espectador sobre a produção. Dividido quase que formalmente em duas partes, o filme nos apresenta primeiramente uma história cheia de glamour sobre aquela garota inocente, com cara de menina que consegue atingir o sucesso, conhecer celebridades e entrar para o hall das pessoas interessantes naquele período. Depois, quase que sadicamente, o filme retira o véu de beleza e aprofunda os traumas enfrentados pela garota e tudo aquilo "que as câmeras não mostraram", reproduzindo as mesmas cenas e acrescentando elementos que dão força a tragédia de Linda.

Amanda Seyfried faz um trabalho competente, embora o roteiro de Andy Bellin, não lhe de tempo para desenvolver sua personagem. Apesar de vermos seu sofrimento, a personagem permanece ingênua e frágil mesmo diante de tantos abusos e quem acaba roubando a cena são os coadjuvantes. Sarsgaard, que vive seu marido abusivo, é ao mesmo tempo obcecado por Linda, como violento e dependente. Existe uma gama maior de características nesse homem detestável que como todo sedutor enlaça sua vitima ao ponto dela ver-se prisioneira daquela situação. Outro destaque é Sharon Stone, que vive a mãe da protagonista. Ironicamente (duvido que isso não tenha sido pensado) Stone, que se consagrou com filmes absurdamente eróticos, aqui é a mãe recatada e que tem uma visão de mundo bastante patriarcal, mesmo diante dos claros problemas da filha. Auxiliada por uma maquiagem pesada que a deixa ainda mais severa, reforçando linhas de expressão, Stone é a personagem mais interessante da trama.

Se o roteiro não ajuda Seyfried a ir muito além do retrato raso da protagonista, faz o mesmo com Stone e os coadjuvantes ao escolher um retrato que não responde muito bem as perguntas levantadas pela trama: o que acontece com seu marido, Chuck? Como Linda conheceu seu novo marido? Quando teve a vontade de escrever um livro? Como se transformou em ativista? Como a indústria pornográfica enxergou esse movimento? E a máfia - parte integrante da trama - onde estava? E os diretores/produtores, que são retratados de forma simpática, como reagiram a "nova Linda"?



Esse tipo de cine biografia tende a ser criticada exatamente por esse tipo de escolha. Optar por um recorte da vida do biografado tende a não responder perguntas importantes sobre o mesmo. No caso do filme, falta-lhe ainda um fator importante em toda a narrativa: sensualidade. Estamos falando sobre um filme que retrata a maior sensação do cinema pornográfico na história, e mesmo assim muito pouco é mostrado a respeito. Parece que a intenção era seguir o ideal de Linda de que isso "é feio", mas se você está contando essa história como abdicar disso? Mesmo tentando emular Boogie Nights (a comparação mais óbvia pelo período retratado), o filme não consegue de fato nos convencer que esse mundinho pornô é de fato um ambiente tão cruel como Linda pregava. O que é cruel, sem dúvida, é o tratamento dado a ela por seu marido. Isso é sem dúvida, uma afronta, e mesmo assim, com todos esses problemas, não existe sequer um desfecho competente para essa situação.

Lovelace é uma biografia que poderia ir muito além. A partir da personagem poderia ter entrado de cabeça no mundo que a biografada tanto criticou. Prefere no entanto, ir para o lado mais fácil e chocante: mais uma história triste - e que o cinema já contou melhor, com mais emoção e impacto - sobre uma garota ingênua que sofreu abusos de um sujeito que merecia passar o resto da vida preso.


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