Fruitvale Station
(Fruitvale Station, 2013)
Drama - 85 min.
Direção: Ryan Coogler
Roteiro: Ryan Coogler
com: Michael B. Jordan, Octavia Spencer, Melonie Diaz, Ahna O'Reilly, Kevin Durand
É véspera de Ano Novo. Na Califórnia, Oscar Grant e os
amigos vão ao metrô, tomar a condução até a festa que haverá no Centro. Assim
que eles entram em um dos vagões, a câmera para de se mover e os acompanha ir
embora. O plano dura mais alguns segundos, como se houvesse algo de diferente
naquela estação comum. Parece que algo assustador acontecerá.
Construindo um duro conto de realidade, Ryan Coogler estreia
na direção em
Fruitvale Station. O novato é preciso ao estruturar o roteiro
sem privilegiar uma divisão de atos, definindo as situações com o olhar de quem
observa majoritariamente o protagonista, desenvolvendo-o através de pequenas
cenas; um estudo de personagem, em suma.
Nessa busca por definir o drama de Oscar através da
tentativa de se redimir do passado – e a tentação de voltar a ele –, Coogler
aposta nos conflitos morais dos quais o personagem passa. Os antigos contatos
com o tráfico se mostram ainda presentes, mas o senso de proteção de Oscar com
seus familiares é mais forte. Além disso, cenas como a do protagonista na
prisão – excelente do início ao fim – realizam uma relação de causa e efeito
que tornam Oscar mais reticente na hora de se entregar à saída mais fácil. A
trilha e o design de som são executados à perfeição na hora de traduzir os
sentimentos do personagem, e isso só aumenta no catártico clímax, que parece
concretizar um movimento de elegia.
Elegia essa concebida com um cuidado notável por parte de
Coogler, uma visão madura sobre a perda. De maneira sutil, o diretor chama
atenção para detalhes aparentemente banais, mas que terão tremenda importância
emocional no clímax: a corrida com a filha é eternizada, em câmera lenta; o
encontro com a filha na casa da tia é filmado em close; a já citada estação é
filmada com mais cuidado que o normal; um plano no metrô, passando rápido,
revela temíveis faces de pessoas, numa dissonância eficiente. É difícil
alcançar esse nível melancólico do luto sendo discreto, ainda mais quando se
estrutura uma narrativa inteira em volta dele, mas o diretor entrega a
responsabilidade ao excelente Michael B. Jordan – digno de premiações – e
consegue remeter até ao Elefante de Gus van Sant.
Os cortes abruptos (a cena de mãe e filha no banho é
notável), impactantes, ajudam a causar o desconforto que a história provoca,
junto do trabalho de câmera naturalista, com belíssima fotografia em 16mm para
se manter o mais documental possível. As intenções do diretor se revelam
satisfatórias principalmente no clímax, que não deixa de causar tensão por um
segundo sequer.
Não é um trabalho perfeito, porém. Já que Oscar é uma vítima
das consequências, Coogler não se contenta apenas em fornecer a visão em volta
do jovem, manipulando o ambiente para deixar sua maldade mais clara; pesa a mão
demais no drama e acaba o atenuando. O cachorro atropelado do início até
consegue dar uma visão desesperançosa ao ambiente, mas de nada serve para a
jornada do personagem além de vitimizá-lo nesse mundo frio e cruel. A festa no
metrô também é de uma inocência sem vez naquele pano de fundo; não é normal ver
pessoas apertadas no metrô dançando do nada. Só soa dissonante em tom, como o
plano dos parentes reunidos com fotos na geladeira: procura expor o forte
conceito de família do filme, mas não deixa de ser um didatismo previsível.
Ryan Coogler e Michael B. Jordan constroem um personagem
multifacetado. Oscar soa vivo nas telas, lidando com questões éticas até haver
uma intervenção. Coogler pode ainda ser desmedido em suas metáforas, mas
consegue, através dos cortes secos e da presença marcante de B. Jordan, criar
uma digna jornada a um personagem dolorosamente real.
E é na hora de traduzir essa dor em réquiem que Fruitvale
Station mostra seu poder.
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