Serra Pelada
(Serra Pelada, 2013)
Drama - 100 min.
Direção: Heitor Dhalia
Roteiro: Heitor Dhalia, Vera Egito
com: Júlio Andrade, Juliano Cazarré, Wagner Moura, Matheus Natchtergaele, Sophie Charlotte
O garimpo de Serra Pelada, localizado no
estado do Pará, é um dos símbolos mais pulsantes da ganância humana e do
desespero do brasileiro em busca de uma melhor condição de vida. Durante o auge
da "corrida do ouro" brasileira, mais de 80 mil pessoas moravam ou no
garimpo, ou próximo a ele. Literalmente transformaram o que antes era uma
região coberta de vegetação em um imenso buraco que atingiu absurdos 200 metros de
profundidade em meados de 1984. As autoridades creditam a extração de 30
toneladas de ouro, o que o torna o maior garimpo a céu aberto do mundo.
O potencial para histórias nesse cenário é
praticamente inesgotável. Poderíamos acompanhar uma trama de viés político,
sobre como o governo (primeiramente militar e depois civil) tomou para si o
ouro encontrado no garimpo, ou mesmo sobre o primeiro sujeito que encontrou
ouro ali, entre tantas outras histórias que poderiam surgir. Heitor Dhalia optou
por aproveitar um tema universal - a ganância - e criar
uma história original e ficcional a partir desse elemento misturando-o as
coisas que se sabe que aconteciam no garimpo paraense.
Acompanhamos então os amigos Juliano e Joaquim,
que saem de São Paulo rumo ao Pará em busca de fortuna. Júlio Andrade, é Joaquim, um professor
de classe média baixa com uma mulher grávida e que se vê cansado de lutar todo
dia e não conseguir dar nada de mais substancial para sua família. Juliano Cazarré é Joaquim,
um sujeito que vivia de lutas de boxe clandestino na cidade e que sem nenhum nó
que o ate, parte rumo ao desconhecido.
Serra Pelada é mais um conto sobre como o
poder e a ganância corrompem o homem. Uma vez no garimpo, os amigos logo
encontram ouro e decidem fazer aquele dinheiro render ainda mais. A narração em
off de Júlio Andrade, apresenta-nos aquele mundo e nos diz que uma vez com condições financeiras,
o próximo passo é comprar um lote e administrá-lo. Porém, a ganância faz com
que a dupla comece a entrar em conflito e o que antes era harmônico passa a ser
uma disputa por poder, com Juliano tentando voltar pra casa o quanto antes e Joaquim sem nada a fazer em São
Paulo , tentando conseguir ficar cada vez mais rico.
O filme tem boa reconstrução de época e
nos coloca em uma típica cidade de fronteira - cenário normalmente visto em um
faroeste - que ao lado do ambiente inóspito do garimpo é recheado de
violência. Como Juliano diz a seu amigo durante o filme, um ambiente que faz
florescer o pior de cada um. As privações aliadas às diversas tentações obtidas
com o dinheiro, são um cocktail de problemas em potencial.
O grande problema de Serra Pelada, e que
faz o filme patinar é seu roteiro truncado. As diversas passagens no tempo em
determinado momento parecem incompreensíveis (saltam-se meses entre algumas
cenas) e o excesso de didatismo e a falta de ousadia na retratação daquele
ambiente deixam o filme cansativo. Que pese, termos uma atriz global utilizando
uma boa quantidade de termos chulos - chocando apenas aqueles que não
estão acostumados a palavrões - já que a personagem em si é mais um caso de
"mulher de malandro" que passa de mão em mão sem conseguir achar um
rumo.
Os atores no entanto estão bem, mesmo a
citada global (Sophie Charlotte que se esforça genuinamente para dar algum estofo
a uma personagem rasa). Se Júlio Andrade é o mais próximo do público leigo e serve - por
esse motivo - como condutor da trama com seu off é Juliano Cazarré que faz
muito bem seu papel. Sendo muito natural, faz de Joaquim um sujeito que vai deixando seu carisma ser tomado por uma aura de podridão que o arrasta para uma existência
triste e solitária. Enquanto Matheus Nachtergaele está correto mas sem brilho,
Wagner Moura apresenta uma de suas melhores interpretações em anos. Seu Lindo Rico, levemente
fora de forma, careca e de fala mansa é cruel, inteligente, sagaz e
verdadeiramente assustador. Se existe um grande destaque em Serra Pelada esse é o
ator baiano, que está em estado de graça roubando todas as cenas em que está
presente. Outro destaque do grupo de atores é a escolha inteligente para a
criação de antagonistas dos dois amigos. Utilizar-se de travestis vingativos e
"sangue ruim" é ousado por dar uma botinada no "certinho" e
por fugir do clichê do homossexual fragilizado.
Heitor Dhalia, diretor que pessoalmente
gosto, não está em um bom momento. Se inicia seu filme numa (na minha
interpretação) referência a Scarface de Brian DePalma e insere uma
"vendetta" típica da trilogia Poderoso Chefão filma as sequências de
ação de uma forma a quase causar epilepsia nos espectadores. A maldita mania de
"tremer tudo" para transformar aquilo em "verdade" aqui
está muito bem representada com sequências praticamente incompreensíveis e que
fariam Michael Bay e McG se orgulharem. Além disso, o uso excessivo de imagens
de arquivo deixa a produção cansativa e diminui a escala construída para o filme por sua produção.
Esquecendo-se de elementos importantes da
historia do lugar e focando-se apenas na história dos amigos, Dhalia e equipe
tentaram aproximar a situação do público. Em partes conseguem, já que os atores
fazem o seu trabalho com competência. Uma pena, no entanto, que a produção não
consiga entregar palavras tão fortes e inspiradas quanto os melhores momentos
de seus interpretes.
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