quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Malu de Bicicleta
(Malu de Bicicleta, 2010)
Drama/Romance - 90 min.

Direção: Flávio R. Tambellini
Roteiro: Marcelo Rubens Paiva

Com: Marcelo Serrado, Fernanda de Freitas e Marjorie Estiano

Falar de um relacionamento pretensamente adulto é uma coisa complicada no cinema. Primeiro é difícil definir corretamente, o que diabos é relacionamento adulto. Envolve dois maiores de idade? Envolve um relacionamento baseado na confiança, na compreensão? Envolve uma mutua parceria entre casal? Ou talvez fale sem preconceitos sobre desejo, sobre fantasias e sobre a percepção de que por mais que amemos profundamente nossos parceiros, não é errado de repente olhar a grama do vizinho, e se for de comum acordo entre parceiros, adicionar uma nova sementinha a relação?

Por isso, minha teoria é que existem realmente muito poucos filmes que falam sobre  relacionamentos de uma ótica verdadeiramente adulta, mesmo porque essas características que citei acima, fazem parte do mundo de sonhos do relacionamento perfeito, e não conheço ninguém que consiga a todo tempo, durante todo o relacionamento manter todas essas características citadas. O ciúme, o medo, inseguranças mil, sentir-se inadequado, a rotina, tudo isso tempera um relacionamento dito, adulto.


É muita pretensão minha, tentar julgar se o filme x ou y fala de um relacionamento adulto, mas, é possível sim analisar se o filme x ou y consegue - diante de sua proposta - ser importante na discussão do tema, ou engraçado, ou romântico, ou assustador ou simplesmente blasé, desinteressante, banal ou fútil.

Malu de Bicicleta é irregular, e como tal tem momentos de profunda sensibilidade e outros de profunda nulidade. Falamos do vazio e solitário empresário paulistano Luis (Marcelo Serrado), um mulherengo assumido que não tem vergonha (deveria?) de "usar" as mulheres como parceiras sexuais de forma consensual e aparentemente sem muito stress. É "perseguido" por uma das muitas parceiras de alcova, que parece profundamente transtornada com seu charme ou algo assim.


Marcelo Serrano dá dignidade a Luis, embora recorrentemente vocifere alguns diálogos pretensamente engraçados que são profundamente patéticos. Toda a idéia dele ouvir os corpos femininos convidando-o para os conhecerem melhor é mal realizada, não funciona de forma erótica e muito menos de forma hilária. Obviamente Luis está em busca de alguma coisa que não sabe, mas que sente falta. Essa "coisa" é representada por Malu (Fernanda de Freitas), uma jovem ciclista que Luis cai perdidamente apaixonado em uma viagem de reflexão/autoconhecimento (coisa de gente rica) que o personagem faz ao Rio de Janeiro.

O relacionamento começa e boa parte do filme acompanha a relação de Luis com essa nova situação em sua vida: a de homem comprometido. É comum no cinema, aliás é até um clichê, o relacionamento estável e comum, ser pintado como a manifestação dos grilhões da escravatura que impedem o homem de seguir sua natureza predatória. Esse é um traço, para mim claro, de que muita gente tem os mesmíssimos problemas de nosso herói. Aceitar a condição de estar "preso" a um relacionamento é complicada, principalmente se isso não é parte integrante de sua idéia de vida feliz. Luis manifesta isso claramente, com arroubos de ciúme desnecessários, uma profunda falta de compreensão para com as necessidades da parceira e uma falta de capacidade - comum - de notar os sinais que as mulheres (esse bicho complicado) mostram quando estão felizes ou não.


Não existe propriamente um roteiro, uma jornada, mas um acompanhamento da rotina desse casal, com Luis cada vez mais neurótico com as ações de Malu. Malu por sua vez, é caracterizada como uma mulher sensata, apaixonada por seu namorado, mais que não quer (e nem deveria) abrir mão de sua individualidade e de sua vida pregressa.

Luis, no fundo, é um personagem detestável. Detestável por que é impossível não notarmos traços de nossas próprias personalidades em suas ações. Todos nós já tivemos crises de ciúme sem sentido, desconfianças e nos sentíamos intrigados com o fato de sermos amados. Nós (espero que os leitores sejam assim, ok?) vencemos essas crises, já Luis, torna-se cada vez mais neurótico.


O problema de Malu é a rigidez com que uma história tão solta é apresentada. Alguns momentos não deveriam ter sido mantidos na versão final do filme, como a aparição de um marido traído chorando e desesperado para com Luis, implorando de forma pavorosa para que o Bon vivant deixe de estar presente na vida de sua mulher. Ou mesmo a montagem que falha ao não mostrar ao espectador o tempo daquele relacionamento, ou o crescimento daquele namoro que culmina em uma relação estável (não sei se chegam a se casar realmente). Vendo o filme parece que tudo acontece de forma abrupta e apressada. Que a paixonite se transforma em casamento em questão de minutos. Um maior cuidado com a direção de arte (talvez, até apelando para um objeto de cena que marcasse a passagem de tempo) talvez resolveria esse problema. O filme tem um epilogo que diz ao espectador o tempo em que aquela história se passa, o que comprova a tese da pressa e da completa falta de maturidade de Luis.

Malu, como disse no começo da crítica, não ofende, mas também não consegue ser brilhante. O único brilhareco notável no filme, é a sequencia que batizei de "consumação do apocalipse" que ocorre no final do filme e que, além de bem pensada, tem um ritmo envolvente, é muito bem montada (criando realmente tensão) e apresenta ótimos momentos dos atores envolvidos na cena.


Flavio Tambellini (do interessante Buffo e Spalanzani) dirige com uma mão pesada desnecessária para uma produção que se deixa levar pelo vento, com um roteiro que apenas sugestiona (Marcelo Rubens Paiva) e que talvez funcionasse melhor e de forma mais intensa se fosse adaptado para o teatro, onde os episódios de crise de casal teriam ainda mais impacto, sem ter de concorrer com todos os elementos ao redor.

Apesar de tentar falar de um relacionamento adulto, Malu o faz de maneira juvenil e escorrega na forma de apresentar os sentimentos daquele casal ao público. Falta uma cena forte, uma interpretação visceral ou uma resolução menos cíclica e óbvia.

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