O Exercício do Poder
(L'exercice de l'État, 2011)
Drama - 115 min.
Direção: Pierre Schöller
Roteiro: Pierre Schöller
com: Olivier Gourmet, Michel Blanc, Zabou Breitman
A política é um
meio devassado por todos. Diga-me o nome de dez políticos que confia, pergunto
ao leitor? Se conseguir me dar dez nomes dignos de louvor nacional e sem
nenhuma mancha em seus currículos, prometo que aplaudirei de pé a cada discurso
de cada um dos citados. Repercutir uma produção
que mostra o dia a dia de um político em um país como o Brasil é uma tarefa
complicada, já que por mais corrupto e desagradável que o personagem na tela seja, sempre ficamos com a impressão de que na vida real, e nesse país, a situação é
ainda mais asquerosa.
Dito isso, é louvável
que uma produção como Exercício do Poder chegue aos cinemas brasileiros.
Primeiro por se tratar de uma produção interessante (embora nunca chegue a ser
brilhante) e que merece ser conferida por suas ideias políticas, mas
principalmente por dar cores humanas e - na medida no possível - apostar em um
realismo para mostrar o dia a dia de um político profissional.
Bertrand Saint-Jean (Olivier Gourmet) é o
ministro dos transportes francês, que surge em tela sonhando com uma bizarra
representação que beira o surrealismo, o que dará o tom da historia. Ao mesmo
tempo em que vemos os meandros e conchavos políticos óbvios em uma
administração abarrotada de politicagem e burocracia, o personagem de Gourmet é
apresentado com seus medos, problemas, desejos e nunca é visto como
um típico político corrupto, mas como um homem que faz aquilo que acha
necessário ser feito para manter-se no poder.
A historia começa
quando um terrível acidente de trem vitima alguns adolescentes e o ministro é
enviado para servir como pára-raios oficial do governo. Uma vez lá, somos
apresentados a toda a politicagem envolvida no caso e os muitos conchavos
realizados para que Saint-Jean vá se mantendo no poder. A trama gira em torno da ideia
da privatização do sistema de trens do país que perdem sua credibilidade depois
do acidente. Bertrand é contra por princípios políticos, mas durante o filme suas
convicções vão sendo testadas e aquilo que parecia ser intransigente
transforma-se em uma espiral de acordos, que vão manchando a conduta do
personagem.
No bom português,
é a velha mania tão conhecida por nós, de "uma mão lava a outra", dos
muitos favores políticos que só tem como objetivo perpetuar em cargos públicos
a mesma patota de sempre, o mesmo caso do filme, que a partir desse evento vai
dissecando as camadas políticas francesas.
Infelizmente, o
filme peca por esse excesso de denúncia, tornando-se panfletário em seu
discurso, mas esquecendo quase que totalmente todo o ambiente que envolve Bertrand.
Se a cena inicial é constrangedoramente ousada, o restante do filme prefere
abordar a vida publica do personagem de Gourmet, em vez de dar voz a suas intenções
humanas, ou mesmo ao que o levou até esse ponto.
Mesmo quando o
filme humaniza o personagem, o faz de maneira incompleta. Se conhecemos a
família de seu motorista e concluímos que Bertrand é um sujeito absolutamente
solitário, muito por causa de sua profissão que criam aliados e destrói amizades
com a mesma facilidade, não sabemos mais sobre sua esposa ou mesmo seu
casamento, ou sua relação com seu staff, a exceção de seu amigo de longa data
Gilles (Michel Blanc).
Olivier Gourmet tem uma
atuação segura, restrito em uma camisa de força moral, que o faz - como todo político
profissional - medir cuidadosamente suas palavras antes de proferi-las em alto
e bom som. Apenas quando perde as estribeiras - em duas cenas, uma
pateticamente hilária e outra inesperada e muito dramática - é que o filme
parece acertar o tom do personagem. Nunca um vilão, e muito menos um santo, mas
um sujeito humano preso no emaranhado sem fim de fios que o prendem as engrenagens
políticas.
Talvez seja o
grito do diretor Pierre Schöller que aponta o dedo para o político para enxergar o
homem que veste o terno, procura saber a repercussão de seus discursos na
imprensa, monta seu gabinete para melhor conduzir o poder, tira fotos, sonha,
ama, sente dor e remorso. Esse retrato humanizado é interessante e nunca sobrepõe
a visão áspera que o diretor tem dos meandros políticos de seu país.
Ousado em alguns
momentos, honesto o tempo todo, humano na forma de abordar sua historia, mas
ainda sim frio e cheio de conversas enfadonhas que incomodam pela pasmaceira
constante (o que imagino tenha sido a ideia do filme, já que ele acompanha a
rotina de um político) e sem um objetivo claro: humanizar o homem, para que?
Enxergar por trás da máscara do Diabo o faz mais belo? Compreensível? Amigável?
Infelizmente Pierre Schöller deixa isso sem resposta, e encerra a obra de forma abrupta
deixando muita coisa ainda a ser explorada. Exercício do Poder é interessante,
mas não chega ao brilhantismo que ensaia em alguns momentos. Perde pontos pela inconstância
da narrativa e por apostar demais na redenção de um homem, que não consegue fugir
da máxima óbvia: o poder corrompe e deforma a alma.
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