sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Bravura Indômita

(True Grit, 2010)
Western - 110 min.

Direção: Joel e Ethan Coen
Roteiro: Joel e Ethan Coen

Com: Jeff Bridges, Matt Damon, Hailee Steinfeld e Josh Brolin


Em 2007, os Irmãos Coen, famosos pela excelência cinematográfica e destreza inconfundível na criação de sátiras aos mais variados gêneros, trouxeram ás telas dos cinemas de todo o mundo a adaptação do belo livro escrito por Cormac McCarthy, Onde Os Fracos Não Têm Vez. Na ocasião, os Coen optaram pela abordagem séria de um faroeste moderno - moderno se tratando de um western, já que o filme se passava nos anos 80 - e obtiveram o sucesso de um novo clássico do gênero, que se encontrava na ''geladeira'', se assim podemos dizer, de Hollywood. Com praticamente nenhum similar das consagradas histórias do velho oeste até então, Joel e Ethan Coen arrancaram aplausos com a película, e fizeram a indústria dar o braço a torcer, e ter que reconhecer o talento nato da dupla premiando o filme com quatro carecas dourados.

Depois disso, passando por duas comédias geniais - Queime Depois de Ler e Um Homem Sério, respectivamente - os irmãos-cineastas parecem ter sentido falta do sabor de coordenar mais uma vez o set de um faroeste. Agora, em 2011 - tendo estreado nos Estados Unidos em 2010 -chega ás telas do Brasil mais um longa da dupla, o remake do clássico de 1969 - o qual teve direito á presença de ninguém menos que John Wayne como protagonista - Bravura Indômita . Desta vez, os Coen parecem ter escolhido desfrutar do prazer de dirigir um western á moda antiga, um digno exemplar dos faroestes clássicos passados á pelo menos dois séculos atrás. E depois de assistir a uma sessão de Bravura Indômita, fica cada vez mais verdadeira a afirmação de que não há ninguém mais preparado para mexer nos temas do velho-oeste hoje em dia do que os dois talentosos irmãos.





A trama, uma estrutura de western típica, é narrada por Mattie Ross (Hailee Steinfield) já adulta, relembrando eventos da época que tinha 14 anos. Na época, Mattie perdeu o pai, assassinado por motivo torpe, por um bandido procurado em várias regiões, o meliante chamado Tom Chaney (Josh Brolin). Inconformada, a jovem vai até a cidade tratar de procurar um homem para efetivar a caça a Chaney. Ela encontra o U.S. Marshall Rooster Cogburn (Jeff Bridges) famoso pela sua bravura indômita ante os marginais. Juntam-se a eles na caçada de Chaney o Texas Ranger LaBoeuf (Matt Damon) , que persegue o bandido por crimes cometidos no Texas .

Sem ter assistido ao original, procurarei aqui avaliar o filme de maneira isolada, levando-o em consideração de forma independente ao filme de 1969. E, é preciso ser dito, que de maneira clássica, Bravura Indômita coloca suas cartas na mesa. Como nos melhores westerns que costumavam ser feitos há décadas atrás, o longa nos introduz no universo mais típico do faroeste. Uma narrativa de vingança, que busca desenvolver seus personagens pouco a pouco, com toda uma temática de honra inerente aos filmes de bangue-bangue. Afinal, não se constroem os grandes filmes de faroeste apenas pela presença de cavalos, chapéus de cowboy e revólveres carregados. Fica nítido para o espectador estar vendo um produto cristalino e muito valoroso do gênero quando percebemos as atitudes singulares dos personagens. Ora, todos estão atrás de Chaney, e mesmo assim, a preocupação de Mattie é que o criminoso seja preso pelo assassinato de seu pai, e que ele esteja ciente disso. Essa sensação de punição, justiça e retribuição á moda antiga permeia toda a exibição e nos faz ter completo discernimento que a intenção dos Coen ao lançarem o filme é trazer de volta, com a marca de qualidade dos dois, toda a essência única que só o mais puro faroeste pode exalar.

Mas nada fica na superficialidade ou sequer esbarra no lugar-comum - os Coen nunca deixariam isto acontecer. Temos elementos clássicos e indispensáveis para todo filme do gênero, e nesse aspecto, não há falhas ou meias-palavras. A repulsa criada quando vemos a face do personagem de Josh Brolin é de retorno aos vilões e facínoras clássicos, nada mais emblemático para montar a áurea do vilão típico do que uma mancha negra na cara. Mas também há conceitos empregados neste Bravura que não são tão fáceis de encontrar pelos arquivos do velho oeste - o próprio fato de uma menina acompanhar uma jornada de vingança exemplifica bem isso . Desse modo, misturando conceitos já testados e consagrados com outros mais diferenciados, os Coen conseguem esculpir uma homenagem a um gênero que gostam, atribuindo-lhe detalhes que fogem do padrão, e nesse aspecto, não poderia haver trama mais precisa para se fazer um remake do que a de Bravura Indômita.

E a cereja no bolo para a homenagem ficar completa é a direção da dupla. Partindo de takes abertos, que valorizam os belos cenários de época, uma compreensão de plano e contra-plano estático muito eficiente, podemos ter uma noção de que Joel e Ethan estão fazendo uma direção interessante, mas não ao nível que já realizaram em filmes anteriores. Evidencia-se então, ao longo do desdobramento do filme, e principalmente na seqüência de tiroteio final, que a homenagem ao gênero não poderia ser mais clara e elegante do que aqui. A câmera que pega da espora do cowboy antes do confronto frente a frente é o olhar da dupla, embasado nos grandes mestres de antigamente. Preciso. E podemos incluir neste olhar saudosista a trilha de Carter Burwell - que por ter referencia tão forte ao século XIX e a westerns antigos, foi retirada da disputa do Oscar - e a fotografia de Roger Deakins, que dificilmente poderia estar mais referencial e sutil do que está.


E se o original de 1969 tinha John Wayne encabeçando seu elenco, neste aqui temos Jeff Bridges. No ano seguinte ao que recebeu o Oscar por Coração Louco, Bridges trás uma interpretação absoluta e definitiva. Modifica a voz, a postura, o modo de falar, e é impossível encontrar no Rooster dele algo parecido a Kevin Flynn, de Tron Legacy, por exemplo. Este é um exemplo de ATOR DE VERDADE. O resto é outra história. E o melhor, Bridges não interpreta em nenhum momento imitando um estilo John Wayne. De igual, fica apenas a intensidade. Original e competente, ele engole o filme. Merece pelo menos uma indicação ao Oscar desse ano. Mas o filme não se resume apenas a Bridges. Matt Damon tem seus momentos, confirmando seu talento. E Hailee Steinfield é mais um daqueles achados que prometem muito, como uma Chloe Moretz, por exemplo.

Fica um verdadeiro sentimento de gratidão ao terminar de assistir esta versão de Bravura Indômita. O prazer de poder saborear um western no dias de hoje é cada vez mais restrito, e é muito reconfortante saber que dois gênios consagrados têm interesse pelo gênero e talento de sobra pra conseguir trazer experiências sensacionais até nós. Se em 2007 eles nos premiaram com um faroeste moderno que media a força de dois opostos, aqui, eles nos trazem uma homenagem belíssima e diferenciada a um gênero tão interessante. Se alguém algum dia pensou que o faroeste tinha morrido no cinema, então esse alguém está um pouco enganado. Ainda existem Joel e Ethan Coen, e neles nós podemos acreditar.






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