quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Chico Xavier
(Chico Xavier, 2010)
Drama - 124 min.

Direção: Daniel Filho
Roteiro: Marcos Bernstein

Com: Nelson Xavier, Angelo Antônio, Matheus Costa, Tony Ramos, Christiane Torloni, Giulia Gam e Letícia Sabatella

Chico Xavier é uma figura pública, conhecida em cada canto no país como um homem que falava com o além, e a partir de sua fé conseguia trazer mensagens dos que já se foram para as famílias desoladas.


Foi o grau de detalhamento dessas cartas que fizeram de Chico respeitado e até hoje, mesmo depois de sua morte, venerado e admirado por muitos que crêem na fé do chamado, médium.


Que fique claro - já que na internet, ninguém consegue perceber as nuances de nada - que a crítica não é sobre o homem Chico Xavier, sua vida, história e acontecimentos. Mas sobre o filme, a obra de ficção que narra à vida desse personagem.


Dirigido por Daniel Filho - o mais prolífico diretor brasileiro da atualidade - Chico usa uma entrevista do médium num famoso programa de TV (Pinga Fogo, possível de ser encontrado na integra na internet, para os que tiverem curiosidade) para contar - com muitos flashbacks - a vida desse homem.



Diferente do que faz na maioria de seus filmes, Daniel Filho não transforma Chico Xavier numa série "chique" da TV Globo (embora no momento em que essa crítica estiver publicado ela já tenha se "transformado" em uma). É um filme, com todos os cacoetes e vícios do cinema, sem concessões a TV (como fez o medíocre Jaime Monjardim com seus enquadramentos que "sangravam" os protagonistas no terrível Olga). Vindo de Daniel, um homem nascido na TV e que nos últimos anos - com exceção a Tempos de Paz - vem fazendo comédias ligeiras com cara e gosto de série de televisão, é uma mudança na forma de produzir seu filme.


Tecnicamente tudo funciona realmente muito bem. Fotografia de bom gosto, sabendo usar de enquadramentos inteligentes e o uso dos flaschbacks com maturidade suficiente para - apesar da profusão dos mesmos - não tornarem o filme enfadonho.


Os atores também estão bem, em especial a "dobradinha" Angelo Antonio e Nelson Xavier, que vivem o personagem título em dois períodos diferentes de sua vida. Dois grandes atores, conscientes de seu papel e que mantém uma regularidade bastante incomum em biografias em que os personagens são divididos entre atores. Angelo faz seu Chico mais "mineiro", mais tímido, mas consciente de seus "poderes" e aprendendo a lidar com o povo que o cerca. Nelson faz o Chico conhecido pelas multidões, sereno, confiante de cada palavra que profere e muito modesto em sua forma de se colocar perante a opinião pública.



Mas o grande destaque, apesar do trabalho de alto nível dos dois atores, é Tony Ramos. Talvez o maior ator brasileiro dos últimos trinta anos, é emocionante seu desempenho como o diretor de TV Orlando, um personagem ficcional, que serve como ancora para o público. Daniel usa o personagem como pendulo da mediunidade de Chico. Seu filho falecera a pouco, e sua mulher (Cristiane Torloni) desesperada recebe uma das famosas cartas de Chico, quando em visita a seu centro espírita em Uberlândia.


Orlando, cético não crê naquelas palavras e numa cena bastante poderosa começa a repensar suas idéias. Daniel assim, justifica seu personagem para o público. É como se ele dissesse: "hei, esse tal Chico é real. Creiam nele e no meu filme".


O problema é que a história não faz jus à grandiosidade que o diretor imagina ter seu personagem. Chico foi um mobilizador de credos, estudos e multidões. No filme, o  destaque fica em momentos intimistas, que apesar de "tridimensionalisar" o personagem, esquecem de apresentar a força daquele homem e os motivos de tantos o seguirem.



Os flashbacks prejudicam - ainda mais quando são inseridos na história de forma forçada (usando o recurso da transmissão de TV em estática) e Chico e sua história começam a perder força quando a família de Orlando entra em cena. A partir daquele momento, apesar de continuar contar a história do médium, o personagem passa a ser um coadjuvante deixando toda a carga dramática da conclusão do filme para Tony e Cristiane.


Daniel talvez tenha escolhido essa solução, pois em termos narrativos é mais simples encerrarmos uma história fictícia onde temos o controle total de seus padrões e momentos do que tentar encontrar um "final" para Chico, um personagem real. Em seus últimos momentos em tela, Nelson participa de um epílogo, já que o filme em si se encerra na cena tocante do julgamento, com o depoimento de Orlando.



Longe de ser ruim, e muito mais interessante do que possa parecer, Chico Xavier não é - ainda bem - uma pregação doentia e fanática sobre os credos de seu personagem. É a história desse homem, com defeitos e qualidade.


Uma pena que a forma de contarmos essa poderosa historia tenha sido enfraquecida por um diretor esforçado, mas apenas isso. Deixando todo o trabalho para os atores, que fazem o que podem com uma narrativa episódica, frouxa e que perde muito ao se tornar arrastada e perder o foco em seu mote: a vida de um homem considerado santo ou louco.

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