quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Reino Animal
(Animal Kingdom, 2010)
Thriller/Drama - 113 min.

Direção: David Michôd
Roteiro: David Michôd

Com: Ben Mendelsohn, James Frecheville, Jacki Weaver e Guy Pearce


Pequeno e pouco visto filme australiano que deve chegar apenas em dvd (se chegar) ao cinéfilo brasileiro, Animal Kingdom (ou Reino Animal) é o retrato de uma família de criminosos australianos, mas que são acima de tudo uma família, com suas idiossincrasias, crises e momentos de carinho e alegria.


Disfuncional e apresentando diversos personagens interessantes e moralmente dúbios, Animal Kingdom se destaca pela naturalidade com que apresenta sua fauna de gente com problemas e apresenta pelo menos dois personagens realmente marcantes: a avó Janine Cody (interpretada magistralmente por Jacki Weaver), uma bizarra senhora que tem o hábito desagradável de beijar apaixonadamente seus filhos e netos e o psicopata neurótico e gelado Andrew "Pope" Cody (Ben Mendelsohn) um dos "vilões" mais odiados no cinema em 2010.



Mas a história não tem foco nem na matrona da família nem no psicopata "líder" da matilha, mas sim no abobalhado J Cody (um dos netos de Janine, que passa a morar com a avó e os tios depois que sua mãe morre de overdose). James Frecheville interpreta J como se o garoto tivesse sempre pisando em ovos, o que é natural quando vemos o mundo em que ele é incorporado. Frecheville mistura a inocência com uma continua expressão que denota que no fundo ele tem um plano, ou que sua idéia é apenas cuidar de si mesmo, mesmo que para isso precise matar ou passar por cima dos outros.


O filme, apesar de não ser original no que se propõe a fazer (acompanhar uma família de bandidos) é bastante interessante por apostar muito mais no desenvolvimento da parte familiar do que em focar nas ações criminosas. Quando são mostradas, são em repercussão a uma ação anterior que prejudicou a família. Quase todos os personagens são mostrados como "bons ladrões" até a chegada da cobra que envenena o grupo, Pope.



Do outro lado do espectro temos o personagem de Guy Pierce (o ator mais conhecido internacionalmente da produção) que vive um oficial da lei disposto a pegar a gangue e que usa o desajuste de J para infligir nele um sentimento de inadequação que é só aumentado por seus parentes. Pope é um psicótico que usa de tudo para se safar e seu tio Leckie (Luke Ford) um completo covarde mimado que nunca consegue se impor por mais que discorde da idéia.


O garoto (Frecheville) tem boa atuação ao conseguir mostrar suas inúmeras dúvidas. É um garoto preso em sua falta de perspectiva. Filho de uma junkie suicida e abrigado em uma casa de criminosos, J tem poucas perspectivas quanto ao seu futuro e por isso a atuação de Frecheville reflete isso. Desajeitado, instável e aparentando uma incapacidade mental séria pode ser encarado também como o reflexo de uma vida de excessos de sua mãe que resultaram nessa vida medíocre.



Mas o grande destaque é a dupla Pope e Janine. Mendehlson mistura a psicopatia nítida de seu personagem com uma neurose profunda e assustada. Weaver por sua vez faz de sua matrona detestável e compreensiva, interesseira e defensora ferrenha de sua família, a ponto de não pensar duas vezes em sacrificar membros da mesma para manter o "núcleo" intacto.


Li em alguns lugares comparações com Poderoso Chefão e mesmo com Cidade de Deus. Discordo de ambas, já que me parecem comparações vazias. A única semelhança entre os três filmes é que ambos tratam o submundo como algo corriqueiro, sem defender lados e dando tridimensionalidade aos personagens. Mas Animal Kingdom não é tão intenso quanto o filme brasileiro ou narrado com a maestria da trilogia de Coppola. É um excelente estudo de caso, sobre a vida nos patamares mais baixos da sociedade, com bons personagens e uma narrativa enxuta e contemporânea.


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