O Gosto do Dinheiro
(Do-Nui Mat, 2012)
Drama - 114 min.
Direção: Im Sang-Soo
Roteiro: Im Sang-Soo
com: Kim Kang-Woo, Baek Yoon-Sik, Youn Yuh-Jung, Kim Hyo-Jin, Maui Taylor, On Ju-Wan
Logo no início da projeção, uma negociação da
máfia entra em curso. Não
se sabe muito bem sobre o que é, mas envolve muito dinheiro. O motorista, que
está ali também para recolher o dinheiro, recebe a sugestão de pegar um pouco
desse montante exorbitante á sua frente. O primeiro, um zé-ninguém, pega um
pouco e continua seu trabalho. Entra no carro do chefe e o leva embora. Ao chegar em casa, um local absolutamente elegante e sóbrio, com
transparências e decoração de luxo, quase nada se é comentado sobre o que
ocorreu. O que mais aparece são as interações entre os familiares e o jogo de
poder entre eles.
E é nesse nível que O Gosto do Dinheiro opera. O filme do diretor coreano Im Sang-Soo investe nos absurdos que o poder inspira o homem a fazer e na estrutura familiar hipócrita e repleta de cicatrizes de seus personagens.
No que diz questão a organização de atos da narrativa, o filme é bem trivial em sua trama linear. A entrada de Young-Jak, mero motorista sem expressão, no mundo complicado dos negócios mafiosos mais importantes não tem muitas surpresas e até os conflitos morais do protagonista (envolvimento amoroso com alguém da família, se matar em nome desta faz sentido, o dinheiro corrompe) são arquétipos. O que torna O Gosto do Dinheiro levemente acima da média é a capacidade de Sang-Doo de debochar em cima das situações ali criadas. A briga entre os familiares no final é farsesca; os sentimentos expressados pelos Baek são exagerados; o grito de Young-Jak no final é quase doloroso de tão previsível. E tudo isso visto com a ironia imposta pelo realizador.
São leves, mas importantes, as utilizações da técnica no filme. A direção é calculada, com seus travellings calmos e uma câmera estática acompanhando as ações, o que causa a impressão de que todo aquele ambiente charmoso e tido como civilizado, na verdade, é um grande teatro. Até mesmo nas horas dramáticas, Sang-Soo faz o possível para ressaltar o absurdo: o morto ri depois do funeral, uma chuva torrencial cai no melodramático final do filme e a mãe fica no topo da piscina como se fosse um trono.
Com essa proposta, O Gosto do Dinheiro até diverte, mas é pouco esclarecedor. Os conflitos, como dito, são comuns e a ironia - uma hora - cansa ("Toxic Parents", mesmo?). A ideia de rir de uma família com poder já foi bem empregada no Cinema, mas é preciso ousar mais que Im Sang-Soo para transformar um filme engraçado em um projeto realmente diferenciado.
Planeta Solitário
(The Loneliest Planet, 2011)
Thriller - 113 min.
Direção: Julia Loktev
Roteiro: Julia Loktev
com: Hani Furstenberg, Gael Garcia Bernal, Bidzina Gujabidze
Obras que possuem uma abordagem essencialmente visual são encantadoras. No cinema recente, dois exemplos vêm logo á memória: Shame e Somewhere. Se o primeiro retratava a rotina do viciado em sexo de uma maneira que um enquadramento dizia tudo sobre a situação, o segundo utilizava de sua atmosfera e dos takes estáticos de Sofia Coppola para discursar sobre o tédio. Nesse caminho, a diretora Julia Loktev concebe cada situação de Planeta Solitário, seu dramático walk-movie. A investida busca tratar do assunto do casal em tela da forma mais sensorial e sugestiva possível.
E, sem dúvidas, Loktev encontrou a melhor forma de encontrar essa história. O casal de protagonistas, vivido de forma correta por Gael García Bernal e Hani Furstenberg, está nos meses que precedem seu casamento. Eles se aventuram na última viagem como solteiros de suas vidas e, para isso, investem em um isolamento típico de duas pessoas em uma busca por descoberta maior sobre si mesmas. Acompanhado deles, um guia local.
O idioma é estranho e os habitantes daquela distante província na Georgia parecem viver em um outro ritmo. O clima também é complicado (a primeira cena retrata justamente esse problema) e a inadequação acaba servindo para tirar a personalidade de ambos do lugar comum. Nunca é explicado de forma textual o motivo da viagem, o que reforça a ideia de interpretações e confiança no espectador que a diretora-roteirista possui. Ao mostrar os pequenos detalhes de cada elemento de preparação dos viajantes, Loktev acerta, tornando mais verossímil a situação e aproximando ainda mais seus personagens do público.
A atmosfera inquietante das montanhas, sempre
serenas mas dispostas a reservar surpresas, é fundamental para ressaltar as
incertezas da viagem. E se a decisão de manter os diálogos na língua local sem
tradução torna mais imersiva à incomunicabilidade entre os personagens, a
ausência de diálogos acaba tornando o drama quase um suspense.
Mas se Loktev demonstra ser uma competente criadora de mundo, é ao desfazer a tensão que o problema se instala. Sem muito que contar a diretora apenas segue o trio andarilho por cerca de 70 minutos, sem que nada de relevante aconteça. A inicial atmosfera se esvai e transforma a misteriosa jornada em apenas um tédio maquiado. Se a dúvida tornava-se gradativamente maior no início, com o tempo apenas se percebe que aquilo tudo não chegará a lugar algum.
A frágil estrutura se pontua com interlúdios, com a boa trilha ao fundo. Mas se os violinos são agradáveis ao ouvido, essas cenas se revelam um fim em si mesmo. O término é abrupto e não possui significado algum. A repetição e o escopo vazio são tão gritantes que, lá pra terceira cena com intervenção musical, o corte se torna cômico.
Perto do final, Loktev inventa uma situação bem
instintiva para pontuar o conflito entre os personagens. Quando Bernal se
demonstra mais racional-machista do que amoroso-altruísta em uma situação de
tensão, o humor dos envolvidos vira. E um novo ato se inicia, mas com os mesmos
erros da projeção até ali: são pessoas que sabem o problema, mas se negam a
discuti-lo. O porquê disso, talvez nem a diretora saiba.
O diálogo final só causa uma catarse esperada para a problemática postura defensiva do casal. Uma situação manjada, mas que provoca certa reação. Porém, não se engane: qualquer ação afirmativa perante tanta passividade provocaria impacto. O fato de a diretora impedir seus personagens de prosseguir com a trama apenas para dar seu parecer sobre uma ação instintiva não vale 113 minutos de projeção. O que poderia ser resolvido em um ato, acaba se arrastando por todo o roteiro. E digamos que uma ação carnal não é a melhor resposta para um erro instintivo. Isso apenas torna todos igualmente isolados e vingativos. Pode até parecer que Loktev sabia o que estava fazendo, mas é dolorosamente infantil construir toda uma atmosfera e estrutura apenas para dizer que humanos são... Humanos.
Assistir Planeta Solitário é como assistir um suspense whodunit onde não houve assassinato.
Obras que possuem uma abordagem essencialmente visual são encantadoras. No cinema recente, dois exemplos vêm logo á memória: Shame e Somewhere. Se o primeiro retratava a rotina do viciado em sexo de uma maneira que um enquadramento dizia tudo sobre a situação, o segundo utilizava de sua atmosfera e dos takes estáticos de Sofia Coppola para discursar sobre o tédio. Nesse caminho, a diretora Julia Loktev concebe cada situação de Planeta Solitário, seu dramático walk-movie. A investida busca tratar do assunto do casal em tela da forma mais sensorial e sugestiva possível.
E, sem dúvidas, Loktev encontrou a melhor forma de encontrar essa história. O casal de protagonistas, vivido de forma correta por Gael García Bernal e Hani Furstenberg, está nos meses que precedem seu casamento. Eles se aventuram na última viagem como solteiros de suas vidas e, para isso, investem em um isolamento típico de duas pessoas em uma busca por descoberta maior sobre si mesmas. Acompanhado deles, um guia local.
O idioma é estranho e os habitantes daquela distante província na Georgia parecem viver em um outro ritmo. O clima também é complicado (a primeira cena retrata justamente esse problema) e a inadequação acaba servindo para tirar a personalidade de ambos do lugar comum. Nunca é explicado de forma textual o motivo da viagem, o que reforça a ideia de interpretações e confiança no espectador que a diretora-roteirista possui. Ao mostrar os pequenos detalhes de cada elemento de preparação dos viajantes, Loktev acerta, tornando mais verossímil a situação e aproximando ainda mais seus personagens do público.
Mas se Loktev demonstra ser uma competente criadora de mundo, é ao desfazer a tensão que o problema se instala. Sem muito que contar a diretora apenas segue o trio andarilho por cerca de 70 minutos, sem que nada de relevante aconteça. A inicial atmosfera se esvai e transforma a misteriosa jornada em apenas um tédio maquiado. Se a dúvida tornava-se gradativamente maior no início, com o tempo apenas se percebe que aquilo tudo não chegará a lugar algum.
A frágil estrutura se pontua com interlúdios, com a boa trilha ao fundo. Mas se os violinos são agradáveis ao ouvido, essas cenas se revelam um fim em si mesmo. O término é abrupto e não possui significado algum. A repetição e o escopo vazio são tão gritantes que, lá pra terceira cena com intervenção musical, o corte se torna cômico.
O diálogo final só causa uma catarse esperada para a problemática postura defensiva do casal. Uma situação manjada, mas que provoca certa reação. Porém, não se engane: qualquer ação afirmativa perante tanta passividade provocaria impacto. O fato de a diretora impedir seus personagens de prosseguir com a trama apenas para dar seu parecer sobre uma ação instintiva não vale 113 minutos de projeção. O que poderia ser resolvido em um ato, acaba se arrastando por todo o roteiro. E digamos que uma ação carnal não é a melhor resposta para um erro instintivo. Isso apenas torna todos igualmente isolados e vingativos. Pode até parecer que Loktev sabia o que estava fazendo, mas é dolorosamente infantil construir toda uma atmosfera e estrutura apenas para dizer que humanos são... Humanos.
Assistir Planeta Solitário é como assistir um suspense whodunit onde não houve assassinato.
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