quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O Homem do Futuro
(O Homem do Futuro, 2011)
Comédia/Romance/Ficção Científica - 103 min.

Direção: Cláudio Torres
Roteiro: Cláudio Torres

Com: Wagner Moura, Alinne Moraes, Maria Luísa Mendonça, Gabriel Braga Nunes e Fernando Ceylão

Cláudio Torres é um sujeito criativo e ousado. Em um país dominado pelo cinema-novela, é salutar encontrar um cineasta que consegue ser popular e ainda sim, manter a originalidade e ser tecnicamente quase irrepreensível. Também é necessário dizer que Cláudio é dos poucos cineastas do país que pensa "fora do quadrado", ousando misturar o mais popularesco (a comédia romântica) com a realidade fantástica (sejam super poderes e vozes divinas, mulheres que não existem e, agora, a viagem no tempo).

Seu primeiro filme, Redentor, a história de um jornalista que se envolve com a corrupção nas altas escalas do poder nacional, apenas por vingança contra o homem que destruiu o "sonho da casa própria" de seu pai, apesar de irregular, tinha ótimo momentos. Já entraram para a história da cinematografia nacional as seqüências onde o personagem de Pedro Cardoso conversava com a estátua do Cristo Redentor ao som de O Guarani, de Carlos Gomes. Cláudio, teve o gosto do sucesso com sua produção seguinte, a comédia A Mulher Invisível, que colocava Selton Mello como o controlador de tráfico deprimido que encontra o amor em uma mulher invisível.


O Homem do Futuro é uma mistura desses dois lados da carreira de Cláudio e é seu longa mais correto, que melhor equilibra a doçura romântica e a ficção cientifica em uma história coesa, tecnicamente correta e com momentos inspirados de seu protagonista e de alguns coadjuvantes. Entretanto, não é um filme perfeito, e perde alguns pontos com os diálogos um tanto declamados e a dificuldade que é explicar o conceito de viagem no tempo, física quântica, elétrons, nêutrons, vórtices e afins de maneira mais simplista.

O filme começa com o cientista Zero (Wagner Moura) em meio a um experimento que pretende criar uma nova forma de energia. Zero é um personagem amargo, assombrado pelo passado e que não sabe conviver com suas frustrações. Em meio às pressões de sua chefe e financiadora (Maria Luisa Mendonça) e a desconfiança de todos, Zero resolve testar o experimento, que não funciona como ele esperava. Em vez de criar uma nova forma de energia, acidentalmente ele desenvolve uma forma de voltar no tempo, indo direto ao momento em que suas frustrações e seus traumas foram marcados a fogo em sua mente.


Como em todo filme de viagem no tempo, alguns elementos técnicos precisam ser analisados aqui. O visual da máquina e de todo o complexo científico é muito interessante e bem realizado. Apesar dos óbvios excessos (menus em português, uma simplificação de processos na criação da máquina e em seu manuseio) tudo funciona direitinho. A fotografia do mundo real hoje, azulada, propositalmente asséptica dá a entender que a vida do personagem é um longo martírio sem cor e sabor. E os efeitos visuais são excelentes. A idéia "watchmeniana" de dissolver o organismo em partículas quando Zero viaja no tempo é uma sacada ótima.

Quando chegamos ao passado - além das óbvias referências quanto à época (1991) em que o filme agora se passa - conhecemos a versão jovem de Zero, aqui ainda chamado de João. Diferente do homem amargurado e encurvado, uma quase caricatura de cientista maluco de história em quadrinho que Zero/João é em 2011, a sua versão mais jovem é inocente, pura, quase ingênua e sofre de uma gagueira crônica, apesar de já aparentar ser um gênio. É nesse período que o filme se desenvolve melhor e que conhecemos mais intensamente os coadjuvantes, como o amigo (seu único) Otávio, a mulher dos sonhos Helena e o vilão (embora não seja tão vilão assim como o filme mostra no decorrer do filme) Ricardo, além de presenciarmos o trauma que marcou a vida de João.


Falar que Wagner é um ator fabuloso é chover no molhado. Em Homem do Futuro ele interpreta três versões dele mesmo (sim, três, já que existe uma versão que equilibra a ingenuidade do passado e o amargor do presente que surge do decorrer da trama), conseguindo caracterizar cada personagem de forma diferente. Outro mérito da produção do filme, já que em determinados momentos os três Zeros estão na mesma cena, é a excelência da experiência de acompanhar os personagens interagindo, e por mais que saibamos que possivelmente dois deles são dublês, a "magia" da cena não é quebrada.

Também não é difícil entender a fascinação de João/Zero pela personagem de Alinne Moraes. Se a atriz não é a mais completa atriz de sua geração, não compromete em momento algum, é carismática e ainda apresenta outra faceta de seu talento: a de cantora. Já Gabriel Braga Nunes não me convence. Seu Ricardo é um vilão fraco, sem humor e que parece estar em outro filme, muito mais sério do que os demais colegas de cena. Mesmo quando vemos as "versões alternativas" do personagem, em momento algum Gabriel funciona como vilão. Não causa medo, nem piedade, nem funciona como alívio cômico.


Já Fernando Ceylão (que interpreta Otávio) até tem alguns bons momentos, mas o humor do filme não é do tipo que precisa de um alivio cômico. O humor está presente na situação em si. Um homem que volta no tempo e tenta resolver sua própria vida deveria render momentos engraçados, como de fato proporciona, embora na segunda metade do filme, o humor dê lugar a "dramédia" e ao romance, num misto de Efeito Borboleta (e sua indefectível teoria do Caos), Carrie, a Estranha e os filmes sobre amores impossíveis como Tarde Demais para Esquecer - para quem não lembra é aquele em que um homem (Cary Grant) se apaixona em um transatlântico por uma mulher (Deborah Kerr) e resolvem se encontrar no alto do Empire State, e não conseguem por uma série de fatores e acasos do destino. Homem do Futuro tem uma idéia parecida, sobre essa questão de amores adiados e o destino interferindo na vida das pessoas.

A direção de arte, peça fundamental na criação de realidades, passados e futuros é muito boa. Tanto quando retrata 1991, ou precisa mostrar o interior da universidade, ou diferenciar os mesmos cenários em períodos históricos diferentes. Os figurinos também ajudam muito ao filme, principalmente se contarmos com o fato de que boa parte do mesmo acontece durante uma festa a fantasia. A fotografia segue o padrão da filmografia de Torres com ambientes esverdeados ou azulados, uma assepsia em alguns momentos e muito contra luz. Tudo para diferenciar épocas. 1991, por exemplo, é quase sépia e por apresentar cenas que em maioria se passam em ambientes fechados, tem muitas cores quentes e contrastantes; já o início do filme (o nosso presente) como disse na crítica é asséptico e a terceira realidade é opaca e sem vida. A trilha acerta quase sempre, em especial quando ilustra as seqüências com efeitos visuais, mas as cenas mais engraçadas (ou que tentam ser engraçadas) sofrem com uma trilha descompassada que tenta acompanhar os diálogos pretensamente cômicos e que não ajudam ao filme.


O maior problema de Homem do Futuro é que por vezes chegamos a nos empolgar com o filme (a cena de Wagner e Alinne cantando é contagiante) mas ele não consegue manter-se equilibrado. Sempre que alça voo é metralhado por uma piada mal colocada ou um momento de ligeira vergonha alheia (a idéia de piada que envolve uma coleção de revistas Playboy e um camarada vestido de papel higiênico é medonha). Mesmo em sua resolução, o filme escorrega ao subverter a idéia do personagem de certo e errado pelo bem do happy ending. Não compromete, mas o romantismo puro e o desapego que João 3 pregava, fica um pouco manchado.

Homem do Futuro é mais um passo na carreira de Claudio Torres, um dos poucos diretores brasileiros que transitam no cinema comercial, que é capaz de assinar verdadeiramente uma obra cinematográfica. Vejam bem, cinematográfica. Como é bom constatar que existem produções assim ainda no Brasil, comerciais até o osso e cinematográficas até a alma.




2 comentários:

  1. Eu A-D-O-R-E-I este filme!
    Recomendo a todos que curtiram os anos 80 e também a todos que gostam de uma boa comédia romântica, o que me parece ser mais o caso deste filme.

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  2. O filme parece que vai acabar em meia hora,mas depois agente vê que ainda tem muita história pela frente.Lógico que é cheio de clichês mas achei bom

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