quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A Mulher de Preto

A Mulher de Preto
(The Woman in Black, 2012)
Terror/Suspense - 95 min.

Direção: James Watkins
Roteiro: Jane Goldman

Com: Daniel Radcliffe, Janet McTeer e Ciarán Hinds

Desde que a Hammer Filmes voltou a produzir filmes de terror, vem se mostrando irregular, parecendo ainda estar encontrando seu caminho em meio às novidades do cinema moderno, cheio de efeitos CG e de sustos fáceis, bem distantes do estilo clássico e cheios de climas que marcou a primeira fase do famoso estúdio inglês. Nessa retomada, um remake bem sucedido (Deixe-me Entrar), um filme de horror clássico (Wake Wood) e um filme tomado por uma produtora interessada em mostrar ao público como era gostosa (A Inquilina).

A Mulher de Preto é o quarto filme da retomada, e é o mais próximo daquilo que o estúdio produzia em seus melhores dias, embora pareça anacrônico e derivativo, já que muito do que é visto na tela, parece ter saído de filmes mais modernos e mais bem realizados.

O filme conta a história de um advogado (Arthur Kipps, interpretado por Daniel Radcliffe) que vive deprimido desde a morte de sua esposa, quatro anos antes, durante o parto de seu único filho, Joseph. Colocado contra a parede por sua firma, é enviado com o objetivo de encontrar documentos perdidos de uma viúva em um casarão a beira do mar em uma cidadezinha esquecida pela vida e sem muito contato com o mundo exterior. Soma-se a isso, o fato de que a produção de Mulher de Preto, insere essa história em meados do século 20 (talvez anos 20, mas isso não fica claro no filme), o que impõe automaticamente um ar etéreo e misterioso que acompanha Mulher de Preto até o seu final.


Uma vez lá, Kipps descobre que todos naquela aldeia quase medieval querem impedi-lo de chegar à mansão abandonada, considerada perigosa e assombrada. Entra em cena a tal mulher de preto, que o jovem advogado - ignorando os apelos de toda a cidade - vislumbra em seu primeiro contato com a casa a beira mar. Por motivos óbvios não vou contar os motivos para que a tal mulher de preto amedronte tanto a população da cidade, mas o plot é bastante simples (simplório até) e em menos de vinte minutos, o espectador mais atento vai juntar as peças e entender o que diabos a mulher de preto faz.

O que Mulher de Preto tem de melhor é seu segundo, e muito bem realizado ato, quando o jovem advogado se vê dentro da tal mansão e precisa conviver com o que seus olhos lhe mostram e não enlouquecer. Quase sem diálogos durante os mais de trinta minutos centrais, é o que filme oferece de melhor, com a direção de James Watkins abusando dos clichês dos filmes de casas assombradas, com direto ao surgimento de imagens no canto da tela, portas que se abrem fora de foco e que obviamente chamam a atenção do espectador, carregando no clima de mistério quase sufocante e confiando em seu protagonista para transmitir todas as dúvidas sobre sua sanidade que são necessárias para o espectador compreender e comprar a ideia, de que a tal casa assombrada realmente está mexendo com o personagem.

Outra ótima sacada é a ambientação do trabalho. Apesar de não fugir do óbvio em termos de filmes de casa assombrada, e utilizar pouco o espaço que a casa - vista de fora - parece ter, Watkins consegue criar ambientes recheados de pequenos objetos intrigantes e que a luz do dia parecem apenas estranhos e excêntricos, mas que durante a noite adquirem "vida própria". Um desses elementos são os brinquedos que o personagem encontra em um dos quartos da mansão. Além de terem sido escolhidos a dedo, já que nenhum daqueles brinquedos parece "divertir" uma criança, a fotografia deixa-os ainda mais perturbadores, o que auxilia o clima do filme, dando ares de pequenas criaturas presas em corpos de plástico a espera da libertação. 


Em um determinado plano, o diretor mostra Kipps levantando-se da sala de estar - onde ele verifica os papéis da viúva e descobre seus segredos e a motivação para toda aquela história - e seguindo o som de passos no andar de cima. Quando Kipps se levanta, auxiliado por uma vela, o diretor aponta sua câmera para o reflexo da luz nos olhos de duas pequenas estátuas de macaco, que conforme o personagem se movimenta dão a impressão ao público que estão seguindo o personagem com seu olhar. Um exemplo do bom uso dos objetos de cena durante o filme.

Esse segundo ato é muito bem realizado, e consegue prender a atenção do espectador, mesmo quando ele já sabe todos os pormenores da situação (como disse, bastante óbvia) e somente aguarda o próximo susto. Outro detalhe curioso, e que o filme utiliza muito bem durante a sua primeira metade do filme, é a localização da tal casa, que além de ser mal cuidada, fica distante da pequena vila, só conseguindo ser acessada por uma estrada construída a beira mar e que durante o dia é inundada pelo mesmo, impedindo que os locais possam chegar até a residência. Essa ideia (e mesmo utilizando um elemento óbvio, as imagens da estradinha de terra sendo coberta de água são bem realizadas) auxilia o diretor a isolar ainda mais seu personagem principal.

Radcliffe tem uma atuação razoável, e talvez isso impeça o segundo ato de ser um desbunde dos sustos, já que além do ator ainda parecer muito jovem (e não convencer como pai de um garotinho de quatro anos) ainda parece preso ao personagem de Harry Potter, o que o impede de mudar algumas características de sua performance como o bruxo adolescente. O próprio gestual de Radcliffe depõe contra o ator, em especial quando ele precisa utilizar o olhar para demonstrar medo e temor. A impressão que dá é que a qualquer momento Daniel vai tirar uma varinha mágica de seu blazer e atacar a tal mulher de preto.


Os coadjuvantes não atrapalham o filme, e seguem os clichês básicos de uma produção de casa assombrada (embora não vivam nela dessa vez). O cético (Dailly, vivido por Ciarán Hinds) que tenta ver a lógica na situação enfrentada e a crente, a ótima atriz inglesa Janet McTeer - indicada ao Oscar de atriz coadjuvante por Albert Nobbs - que é uma mãe que parece incorporar o espírito do filho.

Esse é um das muitas questões que derrubam o filme. Além das obviedades do gênero, alguns elementos soltos durante o filme prejudicam a produção. A personagem de McTeer é mal aproveitada, surgindo em duas cenas muito boas, mas que verdadeiramente funcionam muito mais como choque visual (ambas envolvem desenhos) do que como auxílio ao desenvolvimento da história. Outro problema, é que uma vez que o plot é revelado (ou descoberto) você precisa mostrar as conseqüências daquela revelação, e elas surgem apressadas e novamente sem causar impacto emocional no personagem principal. Em determinado momento, quando todas as peças se encaixam, Kipps chega até um telegrafo, onde é imperativo que ele envie uma mensagem para Londres. O recurso utilizado pelo roteiro é dos mais óbvios: tudo está fechado e Kipps se conforma sem dar uma demonstração de frustração, ódio ou raiva. É tudo muito fleumático e os pequenos traumas vão se acumulando sem nenhum momento de catarse dos personagens.

O grande problema é sua resolução. Além de muito, mas muito óbvia (inclusive com um epilogo bastante previsível) tudo é muito corrido e facilmente explicado. Kipps diz a seu amigo, e agora ajudante, Dailly que o que impedia os habitantes do lugar de resolver seus problemas sobrenaturais, era o fato de que ninguém por ali tinha um automóvel capaz de retirar certo personagem de seu túmulo na lama. Ora, a lógica dessa situação é absurda. Ignora a decomposição do tal personagem, além de mostrar que o corpo é facilmente encontrado (a lógica aqui é: o fantasma do mesmo apontou sua sepultura, portanto Kipps sabia exatamente onde procurá-lo). E o calcanhar de Aquiles do filme, e que é outro clichê de filme de terror em lugarejos perdidos: ninguém tinha pensado em resolver a situação daquele jeito? Ninguém pensou que fazendo o que o personagem de Radcliffe fez poderiam encontrar um fim para tudo aquilo?


O próprio filme nos dá a resposta da forma mais óbvia e patética possível, incluindo um epilogo digno de risadas involuntárias. Uma pena que Mulher de Preto tenha se mostrado um filme mais do que previsível (eu não esperava coisa diferente), mas fracote em sua tentativa de terror - que é curta e poderia mostrar mais da relação personagem/mulher de preto - e com uma resolução óbvia e que dá a sensação de já termos visto aquilo dezenas e dezenas de vezes.


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