terça-feira, 27 de março de 2012

Desenrola

Desenrola
(Desenrola, 2011)
Drama/Comédia - 88 min.

Direção: Rosane Svartmann
Roteiro: Juliana Lins e Rosane Svartmann

Com: Olivia Torres, Lucas Salles, Kayky Brito, Vitor Thirê, Cláudia Ohana

O cinema brasileiro vem polarizando-se entre os filmes de autor e as comédias rasgadas com cara e jeito de televisão, produzidas aos montes, com a idéia clara de ganhar dinheiro. Faltam aqueles filmes no meio do campo, produzidos com a intenção de ganhar dinheiro é claro, mas com uma preocupação estética maior, com interpretações mais caprichadas e principalmente com conteúdo.

É o caso de Desenrola, que conta a história de Priscila, uma garota de 16 anos e suas aventuras na tentativa de perder a virgindade, conquistar sua paixão e amadurecer. O roteiro apesar de óbvio é esperto, e conta com bons diálogos. Tentando uma aproximação bastante crível de seus personagens, o filme de Rosane Svartman acerta ao não julgar seus personagens e dar espaço aos jovens atores para transformarem o texto em algo ainda mais próximo de suas realidades.

A óbvia comparação com Melhores Coisas do Mundo, prejudica o filme que sai perdendo em muitos fatores. Primeiro: a história de Melhores Coisas trata de um assunto mais pesado (dificuldades de aceitação, suicídio, depressão), segundo que a direção de Laís Bodansky (curiosamente ambos os filmes são dirigidos por mulheres) é muito mais inspirada e criativa do que a de Svartman, que parece refém de alguns pequenos vícios das séries de tv e novelas, e terceiro é que na média os atores de Melhores Coisas são ainda mais intensos e críveis que os de Desenrola (incluo ai o Fiuk, para desespero dos "hattters").


Desenrola não é ruim por essas comparações, só é mais leve e descompromissado. O fato de o filme ser baseado em uma pesquisa sobre sexualidade na adolescência ajuda a relativizar de forma palatável e compreensiva as encanações típicas da idade. Por outro lado, "premia" o espectador com as infames cenas das entrevistas em que uma série de garotas conta de forma didática suas experiências sexuais.

Uma grata surpresa é a seleção de jovens atores, quase todos muito bem. A jovem Olivia Torres é um talento a ser visto em novas produções. Representando aqui, toda a instabilidade típica da idade, as muitas dúvidas e a falta de traquejo social que faz dos adolescentes criaturas estranhas e exóticas. Acompanha a garota (também um talento a ser visto em novos filmes) a dupla formada por Lucas Salles (o falastrão Boca) e Vitor Thirê (o abobalhado Amaral) que roubam todas as cenas em que participam. A dupla tem química, funcionam muito bem juntos e tem excelente desempenho. Lucas ainda passa por uma metamorfose durante o filme, já que seu personagem vai ganhando importância no desenrolar da produção.


Entre os coadjuvantes, uma profusão de "globais". Passando pelas participações especiais de Marcelo Novaes e Letícia Spiller como pai e madrasta de Priscila (em divertida sequencia), Cláudia Ohana (a mãe da garota, com pouco tempo de tela, mas responsável por uma cena profundamente crível no final da produção) e até Pedro Bial (constrangedor como o apresentador de reality show travestido de professor).

Mas nada é tão ruim, como a atuação artificial de Kayky Brito como o galã e interesse amoroso da personagem principal. Tentando surgir como alguém com uma aura de superioridade intrínseca ao personagem, é um desfile de olhares de peixe morto, frases feitas e vergonha alheia. Uma dos motivos do filme perder pontos vem de sua falta de naturalidade que destoa de todo o restante do elenco.

Fotografia (luminosa, apostando nas muitas cores do filme), montagem (clássica, sem grandes invencionices), direção de arte e figurinos - apostando em uma série de cores quentes para destacar a intensidade da vida da garota e em uma série de acessórios, que vão sendo customizados ao longo do filme para representar suas muitas dúvidas - são de boa qualidade. Uma pena que a trilha sonora é equivocada, incomodando em alguns momentos, por sua falta de timing com a ação na tela. Os grafismos que pipocam pela tela na abertura e nos créditos finais são uma grande sacada, assim como a brilhante sequencia pós-créditos, que é criativa, engraçada e muito atual.


Mais o mais interessante e importante em Desenrola é a forma com que o filme trata de um assunto ainda "tabu" em uma sociedade cada vez mais retrograda e politicamente correta: virgindade. Longe de banalizar a situação, no entanto, é sábio ao relativizar sua importância. Não levanta bandeiras, mas posiciona-se firmemente contra ao culto da “virgindade é tudo", tão presente (assustadoramente) em pleno século XXI. Perder a virgindade, é mais um ato de nosso amadurecimento, e negar nossa própria natureza é um ato criminoso. Desenrola entende a situação dessa forma e de maneira moderna consegue defender a ideia de que não podemos nos privar de sermos nós mesmos, vivermos e agirmos de acordo com nossas consciências. Uma postura cada vez mais rara e que merece ser incentivada.



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