Guerreiro
(Warrior, 2011)
Drama - 140 min.
Direção: Gavin O'Connor
Roteiro: Gavin O'Connor, Anthony Tambakis e Cliff Dorfman
Com: Tom Hardy, Joel Edgerton e Nick Nolte
O MMA - as famosas artes marciais mistas - não é recente, e tem uma história que vem através do século XX, ganhando uma grande organização em um campeonato mundial no início dos anos 90, com a formação do UFC. Dentro desses quase 20 anos de evento, o UFC ganhou muita popularidade - em escala mundial - principalmente nos últimos anos. Grandes astros formados, incríveis campeões, muitos deles brasileiros, como Anderson Silva, José Aldo, etc. Por se tratar do "esporte que mais cresce no mundo" e possuir um índice de aprovação muito grande em nossas terras, é de se perguntar por que Warrior, filme que retrata o mundo do MMA com estilo e energia, não tenha estreado nos cinemas no Brasil.
Largado por aqui
A envolvente história nos apresenta a Paddy Colon (Nick Nolte) um simpático senhor com um passado em frangalhos por seu antigo alcoolismo. Regenerado, ele reencontra o filho , o ex-marine e antigo lutador Tommy Riordan (Tom Hardy), que o convida pra voltar a treiná-lo, para o "Spartan" um torneio internacional de MMA que dará ao campeão 5 milhões de dólares. Enquanto isso, o outro filho de Paddy, Brendan Colon (Joel Edgerton) vive como um pacato professor de física com sua família, até o momento em que a hipoteca de sua bela casa vence, fazendo com que ele busque lutas clandestinas para angariar a renda necessária para quitar a dívida da residência. Com a notícia do torneio e a possibilidade de participar para conquistar o valioso prêmio, o ex-lutador de UFC que lecionava em escolas volta aos ringues. Na disputa, ele, o irmão Tommy e o pai, que são elementos do campeonato, voltam a se relacionar, e reavivam velhos fantasmas do passado que atormentou um dia a devastada família.
O roteiro escrito a seis mãos por Gavin O'Connor, Cliff Dorfman e Anthony Tambakis é inteligente e bem construído, criando uma narrativa que, em essência, retrata um grande drama familiar através da didática do "filme de lutador". David O. Russel fez isso de maneira muito esperta
Warrior trás, entretanto, personagens muito mais realistas em suas cargas dramáticas, passando emoções bem mais verossimilhantes que as do filme estrelado por Mark Wahlberg. Não por acaso o conflito familiar em Warrior é muito mais melindroso: aqui os personagens são afastados pelo tempo, por atitudes erradas, e vivem em um constante isolamento sentimental. Se
Esses problemas nos trazem aos ringues. O diretor Gavin O'Connor usa o octógono como uma terapia, e utiliza da lógica de que a melhor maneira de se conseguir uma reconciliação em um caso tão grave é através da catarse. Uma rede de ressentimentos tão fortes só pode ser destruída de forma catártica. Ora, para que possamos construir novos sentimentos, ou recuperar antigos, é preciso despejar a mágoa entalada na garganta, limpar a sujeira e recomeçar a relação "descarregado". Nenhum lugar pode ser melhor para extravasar um rancor de anos do que no ringue, num saco de pancadas, no corpo-a-corpo e no grito. A cena onde o personagem de Nick Nolte volta a se embriagar é um exemplo claro do extravasar pelo qual os membros daquela família passam.
E, é claro, devemos citar a cena da luta dos irmãos. Neste caso, o duelo entre Tommy e Brendan ultrapassa uma mera catarse. À medida que os personagens trocam golpes, se ferem e travam uma batalha corporal, percebemos que não ocorre apenas o "descontar" de uma raiva encubada. Os socos, chutes e estrangulamentos executados nada mais são do que a transmissão do afeto que um sente pelo outro. Quando o orgulho é maior, e não temos a capacidade de dar um abraço e pedir desculpas, então damos o carinho através da pancada, estabelecemos o contato pela dor. A cena explicita isso de forma clara, e produz uma sequência profundamente emocionante.
Obviamente requisita-se certa suspensão de descrença quanto ás anormalidades dentro do universo das lutas (como dois ex-lutadores, há muito parados, vão derrotar campeões mundiais em pleno ritmo e vigor físico?) mas como o fator crucial é mesmo a resolução das questões familiares, é possível relevar tais exageros sem forçar a barra . A cada confronto, a energia do longa renova-se, e fica muito bem ilustrada nas feições de cada personagem a "purificação" que cada luta faz para seu corpo, queimando sua raiva. E para encarnar tais sensações, sem dúvida, precisa-se de um elenco afiado. É por isso, justamente, que Warrior consegue sucesso: tem atores talentosos, mas que possuem principalmente a presença de cena necessária para interpretar a explosão que cada persona desenvolve durante a projeção. Joel Edgerton possui muito bem essa presença, e Tom Hardy, além de transfigurar-se como a revolta em pessoa, é a mais clara encarnação da fúria, apenas confirmando sua habilidade, principalmente para papéis desse tipo.
Mas o grande destaque é mesmo Nick Nolte. Incorpora um sujeito aos cacos, que, apesar de tentar mostrar força e determinação pela voz, demonstra fragilidade e fraqueza absoluta quando frente a frente com os filhos. Revelando a tristeza e arrependimento pelos olhos, Nolte consegue criar um Paddy Colon tridimensional e realista, atraindo o foco do filme para si a todo o instante. Ajuda também na atmosfera a funcional fotografia, que, saturada, simboliza bem o desgaste de cada elemento da família, além de criar um ar documental quando assistimos às lutas, o que facilita a imersão naquele universo.
Com uma direção repleta de closes sangrados, fato que promove o dissecar das emoções de cada personagem, Gavin O'Connor entrega aqui um filme profundo, porém nunca aborrecido, que se mantém enérgico e inclusive divertido. Com cenas inesquecíveis, Warrior é um louvável estudo sobre reconciliação - beirando a antropologia em certos momentos - com análise perfeita das reações humanas, e defendendo a tese de que, para certas situações, a catarse é a melhor solução para um problema sentimental.
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