segunda-feira, 5 de março de 2012

Motoqueiro Fantasma: Espírito da Vingança


Motoqueiro Fantasma: Espírito da Vingança
(Ghost Rider: Spirit of Vengeance, 2012)
Ação/Thriller - 95 min.


Direção: Mark Neveldine e Brian Taylor
Roteiro: Scott M. Gimple, Seth Hoffman e David S. Goyer


Com: Nicolas Cage, Violante Placido, Ciarán Hinds, Idris Elba, Johnny Whitworth



Desde a estreia de Adrenalina, em 2006, o cinema dos americanos Mark Neveldine e Brian Taylor foi marcado pelas escolhas estéticas absurdas, o ritmo narrativo surtado e um retorno á vertente mais rasa do gênero mais popular dos anos 80: a ação. Porém, o que diferencia o honesto cinema da dupla dos exemplares blockbusters que pairam pelas telonas toda semana é o tratamento quase satírico com que os americanos tratam a si mesmos. Fanáticos pela geração noventista, Neveldine e Taylor trabalham desde seu debut de uma forma com que a época entre na narrativa de forma fácil, orgânica até. Se em Adrenalina 1 e 2 o protagonista Chev Chelios parecia viver dentro de um videogame, em Gamer esse jogo da dupla entra em metástase.

Logo, trabalhar com mitologias sérias e afins não é o forte da dupla. Não foi por falta de competência que Jonah Hex (roteirizado por eles) fracassou; o estilo de Neveldine/Taylor apenas não coube em um faroeste atmosférico e baseado numa pesada (tanto graficamente quanto dramaticamente) HQ. E o que esperar, então, de uma outra adaptação dos quadrinhos pela dupla?

A excelente noticia, principal fator de tornar Motoqueiro Fantasma - Espírito de Vingança um filme digno do personagem, é que os surtados diretores receberam controle total sobre o projeto e, de quebra, ignoraram tudo o que erraram em Jonah Hex.




 Mesmo que uma continuação do fraquíssimo filme de 2007, Motoqueiro 2 nada tem a ver com seu antecessor (e todo o universo Marvel, por sinal). Logo de início, se esquece a introdução típica de um projeto criador de mundos. Depois de um frenético prólogo, não se perde tempo para relembrar ao público quem é o tal Motoqueiro possuído: uma montagem estilizada toma a tela, com o humor típico da dupla e a dedicação dos roteiristas Scott Gimble, Seth Hoffman e David S. Goyer estampada na simplificada narração inicial, que encaixa o espectador mais desavisado na historia. Obviamente, o recurso é batido. Porém, é a maneira debochada com que os envolvidos tratam seu material original que faz o roteiro funcionar tão bem em suas pretensões.

Esse deboche, obviamente, é potencializado pelo espírito dos diretores. Se até o mais problemático dos arcos, a criação e desenvolvimento da mitologia do personagem, é resolvido da maneira mais leve (a já citada montagem com narração de Cage), arcos típicos de filmes de super-herois são cortados em prol da fluidez do ritmo frenético característico dos próprios Adrenalinas. A mulher presente na história não é feita de interesse romântico; os capangas do vilão passam sem ao menos nos lembrarmos; a introdução do demônio vivido por Ciaran Hinds é definida apenas por enquadramentos imponentes e pela presença de cena do ator; atalhos funcionais são privilegiados para agilizar as perseguições (como o Motoqueiro poder sentir a presença de Danny).

Isso tudo acaba tornando Motoqueiro 2 um legítimo filme de ação e, não tanto, um filme de super-heroi. Até mesmo o antagonista do filme, o oriundo dos quadrinhos Blackout, adota o visual típico das páginas de HQ por um motivo narrativo (bem simples, até). Nada se desperdiça na concisa filmografia dos diretores - e não seria diferente aqui. Talvez isso explique o fracasso do filme perante aos fãs. A mitologia simplificada acaba diminuindo a responsabilidade do protagonista, mas não sua importância.




E, como era de se esperar, Neveldine e Taylor não exaltariam o Motoqueiro de outra forma senão tornando-o um ícone do barato, um pop noventista como Chev Chelios. Nicolas Cage surta tanto quanto em O Sacrifício e Vício Frenético, mas é o crânio flamejante que acaba roubando a cena, ao mesclar o exagero de seu intérprete com sua aura cool, construída pelos diretores. Andando com um rastejar (sim, RASTEJANDO em pé) contagiante, a expressão despojada do Motoqueiro (como quando ele engole as balas e as cospe na cara de um capanga qualquer) contrasta brilhantemente com a urgência ameaçadora do ataque do demônio. Ao se aproximar de um desavisado empregado de Ray Carrigan, o anti-herói segura a cabeça da vítima com propriedade. A trilha de David Sardy sobe e ali descobrimos o solene tratamento que os diretores deram ao personagens. Mesmo raso, o Motoqueiro tem aqui sua apoteose pop.

E se é pra ser um ícone noventista, que seja da maneira mais fiel possível. Muita coisa no filme exala anos 90, ainda que essa incursão na cultura da década seja algo mais presente nos trabalhos anteriores da dupla. Desde a construção de Moreau (lentes de contato, jaqueta de couro) até o novo visual do Motoqueiro (muito mais sujo e ameaçador que no filme de 2007), passando pelo visual cafona de Blackout (de cabelos brancos e grandes, parecendo o guitarrista de uma banda estilo Europe), os reflexos da cultura dos 90's entram na alma da película por toda a projeção. O ápice dessa proposta de Neveldine/Taylor acontece na aparição do Motoqueiro e no ato final: como se não bastasse trazer Christopher Lambert para o terceiro ato, o Motoqueiro ainda possui a sonoplastia do Predador quando está prestes a atacar.

Nisso, o estilo skatista descontrolado de Mark Neveldine filmar auxilia tudo, tornando as sequências de ação completamente satisfatórias. A sacada de tudo o que o Motoqueiro toca se tornar chamas é fantástica, tanto estruturalmente quanto visualmente. Não poder encostar em ninguém enquanto transformado torna o Motoqueiro mais distante, angustiado, ameaçador. E, querendo ou não, é empolgante ver uma seqüência final de ação tão bem realizada. Fora que poucas coisas são tão criativas quanto a criação de um Guindaste Fantasma.




A loucura da dupla contagia e confere emoção para a película, sem esforço. Apesar de não serem  muito talentosos como escritores sérios (Jonah Hex fracassou justamente por ser solene demais para o tratamento que a dupla dá a seus filmes), como realizadora visual a dupla funciona bastante. Desde o anúncio carregado de ironia no contrato com o demônio ("Please Sign"), se nota a influência da proposta deles. E a sátira se estende até as crenças de seus personagens: Moreau diz ter sido salvo por Deus, mas foi um hilário golpe de sorte. E o anjo caído só se tornou mal porque foi influenciado por desejos humanos (numa espetacular montagem que parece egressa diretamente de Adrenalina, com armas, sexo, poder e dinheiro envolvidos). E essa predileção pelo surto se dá na transformação ultra-surtada de seu protagonista, naquele que é um dos melhores momentos do filme. E totalmente vindo de Adrenalina. Apenas troque Chev Chelios por Johnny Blaze, Harry Nilsson por Death From  na trilha, e voilà.

O segundo segmento da jornada do Motoqueiro nos cinemas acaba empolgando justamente pela energia de seus diretores. Apesar de econômico e conciso, o script não é dos melhores. Sua estrutura é totalmente correta e sem buracos, mas sem ousadia alguma. O diferencial, claro, vem da maneira irônica com que o Motoqueiro é tratado. Drama por causa do pai ou da namoradora do colégio? Não. Para Neveldine e Brian Taylor, o que nosso anti-herói tem de melhor é sua jaqueta estilosa, sua cabeça flamejante e um ar rock 'n' roll trash que não se vê em nenhum personagem da Marvel. Ao privilegiar esse lado kitsch de seu personagem, o filme é quase sua ressurreição. Tirando sarro com as convenções do cinema sério de ação, os diretores surpreendem e entregam uma obra descompromissada, ágil, direta e divertida.

No final das contas, não é sobre isso que trata o Cinema deles?


2 comentários:

  1. Concordo plenamente. Personagem surtado, igual ao ritmo dos diretores, e roteiro limitado, mas eficiente. Até pq como a ação é o foco central, a trama fica mesmo em segundo plano. Sem dúvidas o resultado final é anos luz melhor do que o anterior.

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  2. Nossa.... realmente o personagem é surtado, o roteiro limitado, na verdade nem sei se há um roteiro, eficiente no que, me pergunto? É chato, cansativo, sem sentido.... desperdicei dinheiro indo ao cinema... prefiro o primeiro, pelo menos tinha roteiro, fraco ou não é outra história.

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