sábado, 24 de julho de 2010


Left Bank
(Linkeroever, 2008)
Suspense/Terror - 102 min.

Direção: Pieter Van Hees
Roteiro: Christophe Dirickx, Dimitri Karakatsanis e Pieter Van Hees

Com: Eline Kuppens

Marie é uma jovem atleta com uma futura carreira esportiva brilhante que ao sofrer um sangramento violento, tem seu sonho de disputar o Campeonato Europeu de Atletismo interrompido. Ao mesmo tempo, ela conhece Bobby, um arqueiro que treina no mesmo clube que ela. A magia do cinema prega, e o diretor Pieter Van Hees comunga com ela, e obviamente Marie e Bobby começam a sair.

Para se recuperar de seu problema - que descobre-se tem a ver com seu sistema imunológico -  ela se muda para o prédio de Bobby, deixando sua mãe sozinha na casa/mercadinho que a solitária mulher cuida sozinha desde que se separou.

O prédio, e mais especificamente o apartamento de Bobby é recheado de mistérios já que uma mulher que ali morava sumiu misteriosamente há quase um ano. Com o sumiço da mulher, Bobby se mudou para o lugar que é administrado por sua avó.



Marie não é uma personagem tradicional dos filmes de terror (sim, o filme é um terror europeu "clássico") pois suas angústias e infelicidade não são esmiuçadas. Van Hees apenas diz ao espectador e demonstra durante a narrativa os motivos - alguns bem ruins - para toda a angústia da personagem. A interpretação da quase novata Eline Kuppens é razoável, a menina não tentou inventar demais - mesmo porque o texto não causa impacto - e saiu-se bem. Os demais coadjuvantes são fracos ou tem pouco a dizer, resultado da opção de Van Hees em centralizar tudo em cima dos ombros de sua protagonista.

Left Bank - título inglês desse filme belga, já que o filme não saiu por aqui - tenta ser uma mistura de suspense psicológico com terror europeu de bruxaria. Ao abordar Marie como o elo principal do filme com o espectador, Van Hees brinca com a sanidade da personagem, que ao adentrar no mundo misterioso daquele prédio começa a questionar tudo - como em todo filme de terror - e a sentir-se deslocada. Em determinado momento a personagem não sabe exatamente o que está procurando ou mesmo se existe algo a ser descoberto.

O terror europeu de bruxaria e afins é representado por toda a questão mitológica que vai vindo à tona por meio do personagem de Dirk, o namorado da mulher que sumira. Ele serve como "professor" da personagem e do público tentando dar base mitológica ao que o filme apresenta. Num paralelo, o filme emula Bebê de Rosemary - na questão psicológica e por usar uma mulher como condutora da trama - e The Wickerman - pelo clima de mistério em que parece que todos sabem de alguma coisa e não querem contar.



É claro que Left Bank não pode ser comparado ao impacto, e mesmo a qualidade das duas obras que citei, já apresenta alguns problemas estruturais sérios. A inserção - forçada - de um personagem professoral é uma delas, já que é um recurso canhestro que o roteirista (no caso três: Christophe Diricx, Dimitri Karakatsanis e o próprio diretor) usa para tentar explicar pelo viés do texto falado o que sua própria história não é capaz de mostrar ao público. Outro erro cabal é a "aparição" dos vizinhos gentis que apresentam a personagem elementos sobre a história de forma - novamente - professoral, e nesse caso juvenil. Sem me estender quanto ao enredo e correndo riscos de dar spoilers, digo que num determinado ponto da história, surge na porta do apartamento de Bobby uma vizinha, com a estapafúrdia justificativa de "fiz suco de fruta a mais e não quis jogar fora". Marie a recebe e a partir daí, ela apresenta uma caixa deixada pela vizinha anterior (aquela que sumiu) contendo fotos e recortes que ilustram uma espécie de investigação que ela vinha fazendo sobre o prédio e seus mistérios antes de sumir.

É um recurso válido claro, mas conduzido de forma muito abrupta e infeliz. Soa exagerado e forçado, ainda mais quando os atores não conseguem exprimir nada na cena. É tudo artificial e plástico demais.



Outro aspecto que a narrativa aborda é a sexualidade de sua personagem, e por estarmos no mundo dos filmes europeus, a censura é muito mais branda. Caso Left Bank vier a ser "remekado" - o que duvido muito - com certeza a liberdade sexual da personagem será mutilada. Não vejo como demérito nem como acréscimo, já que não existe gratuidade nas imagens, porém se elas não aparecessem não faria falta, já que a intenção das cenas poderiam ser mostradas de outra forma.

Van Hees erra em um quesito técnico básico, inserir imagens desconexas sem o menor sentido apenas com a intenção de causar choque. Propositalmente ainda por cima. O efeito é causado, sem dúvida, mas soa gratuito e banal. Talvez na ânsia de dar maiores nuances a sua obra, o diretor tenha errado a mão e exagerado nas camadas de significado.

Porém, e aqui cabe um elogio, Van Hees não cai no clichê óbvio de emocionar seu público por meio da trilha sonora. Ela passa quase despercebida porque seu diretor aposta suas fichas nas imagens que conta. É um filme de silêncios e de eventuais sons, que são bem funcionais.



A edição de Nico Leunen apesar de ser clássica durante quase todo o filme - fugindo apenas nas cenas em que vemos uma festa, onde os recursos videoclipticos são usados a exaustão - também ajuda a história. A tensão das imagens é intensificada com a edição, em especial numa seqüência de corrida pela floresta e na seqüência final.

Aliás a seqüência final é bizarra, na falta de um termo melhor. Liga-se diretamente a algumas falas que os personagens trocaram durante o início do filme - referenciado durante toda a projeção - e tenta fazer o público olhar para toda aquela situação de maneira diferente. A idéia foi bem realizada, em termos técnicos, mas narrativamente pareceu muito artificial e até óbvia, já que Van Hees não fez questão de esconder a intenções dos personagens durante o filme. A questão que precisava ser respondida era: seria isso verdade? Van Hees disse sim. O público não precisa concordar com ele e comprar sua idéia.

Left Bank não chega a ser ruim como filme de terror, mas ao querer dizer muito, soou fajuto e não conseguiu ser mais do que uma diversão passageira, que causa alguns - poucos - sustos.


Nenhum comentário:

Postar um comentário