sábado, 13 de agosto de 2011

Super 8
(Super 8, 2011)
Aventura/Sci Fi - 112 min.

Direção: J.J. Abrams
Roteiro: J.J. Abrams

Com: Joel Courtney, Elle Fanning, Riley Griffiths e Kyle Chandler

Nostalgia é um sentimento comum. Talvez seja inerente ao ser humano ter essa sensação de que o passado, nossa memória, nossa infância sejam mais interessantes, vibrantes, excitantes e divertidos do que o nosso presente. Almejamos sempre que possível recriar as mesmas sensações que fizeram parte desses momentos tão especiais. E para isso todo tipo de artifício é utilizado, dentre eles, o cinema. Pipocam por todos os lados, os revivals, atualizações, remakes e reinvenções de sucessos dos anos 60, 70 e 80. Em sua grande (imensa) maioria não passam de caça níqueis com único propósito de ganhar dinheiro à custa dos nostálgicos de plantão.

Esse era o perigo que corria a produção de Super 8. Amparada por Steven Spielberg, em um filme da Amblin (famosa por clássicos dos anos 80 como: Gremlins, Goonies, Enigma da Pirâmide, A Cor Púrpura, Um Dia a Casa Cai, De Volta para o Futuro entre muitos outros) e dirigido por J.J. Abrams (criador de Alias, LOST e diretor da mais recente versão de Star Trek), o projeto foi cercado de um frisson pré-lançamento enorme, catapultado pela falta de informações a respeito do filme e de uma divulgação que apontava para esse viés nostálgico, apelando diretamente para os fãs de Goonies, ET, Conta Comigo e afins.


E então? - pergunta o leitor. O filme é nostálgico?

Sim, e não. Existe uma clara tentativa de soar nostálgico em seu tema, na forma como seus personagens são apresentados e nas muitas pequenas homenagens aos clássicos da época, aqui e ali. Mas não é nostálgico, pois tem a assinatura do diretor, e apesar de ter uma idéia nostálgica (e ser um filme pipoca também) é construído e amarrado como uma homenagem ao período e não como uma mera cópia, algo que o mesmo Abrams já tinha realizado em sua versão de Star Trek. Existe o respeito, existem as homenagens, mas existe personalidade na forma de contar a história.

A história de Super 8 é ao mesmo tempo simples e ambiciosa. Fala sobre a cidade de Lilian, uma pequena e simples comunidade durante o final dos anos setenta. Lá vivem alguns garotos que simbolizam a inocência de uma época e de uma geração que hoje forma boa parte da critica e dos "fazedores" de cinema mundo afora. Diferente dos garotos de Goonies, que tinham por volta de 12 ou 13 anos de idade, em Super 8, a molecada já tem os seus 15 anos e muitos hormônios em explosão. Esse excesso de energia é catalisado pelo grupo de personagens principais para o cinema. Muita gente que hoje vive de, e para, o cinema começou da mesmíssima forma que os garotos Charlie (Riley Griffiths), Cary (Ryan Lee), Martin (Gabriel Basso), Preston (Zach Mills) e Joe (Joel Courtney).


A história mistura a produção de um filme de zumbis em Super 8 (aquelas câmeras populares que durante boa parte do século XX fizeram a alegria de muitos futuros cineastas) com um estranho acidente de trem que os garotos presenciam durante a filmagem de uma cena. A trama ganha escopo quando o acidente violentíssimo (e brilhantemente registrado pela câmera de J.J. Abrams) passa a ser investigado pelos militares e um clima de mistério e questionamentos toma conta da cidade. Não ajuda em nada, o fato de uma série de eventos estranhos começarem a acontecer do dia para a noite, como a fuga em massa de animais, faltas de energia constantes e a aparição de cubos estranhíssimos que parecem não ter função alguma.

Um filme como esse, entrega sua sorte aos seus interpretes, já que os efeitos e as explosões estão lá a serviço da história, algo cada vez mais raro nos chamados "pipocões". E é uma ótima notícia saber que todos os atores mirins apresentam momentos de puro brilhantismo. Seja o alívio cômico Martin e sua aversão a dor e seu péssimo - e nojento - habito de passar mal durante as dificuldades e que serve como ator para a produção do filme, passando pelo piromaníaco em potencial e zumbi nas horas vagas Cary, ao medroso, apagado (o mais fraco da turma) e figurante de corpo e alma Preston, passando pela dupla principal, os amigos Charlie, um gorducho pretenso diretor mandão mas hilário e o nosso herói, uma espécie de mini Spielberg ou mini J.J. Abrams, Joel que cuida da produção dos efeitos visuais do filme, enquanto tenta curar um trauma e conviver com o pai, um policial severo e que parece deslocado em sua vida.


Se junta a trupe dos garotos, a talentosa e graciosa Alice, interpretada com grande sensibilidade pela grande atriz (já podemos dizer isso, sim) Elle Fanning que é apresentada desde o primeiro take (um bonito travelling que sai do capo de um carro para dentro da janela do motorista para ilustrar a beleza e a paixão platônica que Joel sente por ela) como uma pequena Valquíria, uma angelical representação da beleza e da paixão. Ajuda muito o fato da garota, além de ter presença marcante em tela ser extremamente talentosa. Alice é uma garota que vive com um pai aparentemente bruto, mas que faz parte daquela categoria clichê do cinema: "os brutos de coração de ouro". Alice e o pai foram abandonados pela mãe e isso reflete (apesar de no momento da cena não soubermos dessa informação) em sua primeira aparição como atriz no tal filme em super 8 dos garotos, onde ela é a atriz principal (e única). Sua cena envolve - tentando não soltar spoiler - declarar seu amor e pedir a um determinado personagem que não vá embora. A garota emociona aos garotos em tela e aqueles que estão do outro lado. Isso se repete em outra cena mais a frente quando ela faz um singela e verdadeiramente emocionante confissão a outro personagem. Elle - se nada der errado em sua carreira e escolher projetos com cuidado, o que ela parece ter - tem tudo para ser uma das grandes atrizes de sua geração.

Outra grande surpresa é o garoto Joel Courtney, que vive o garoto Joe, que é o personagem principal da trama. Tentando se reerguer depois de um trauma (que é mostrado na primeira cena do filme de maneira delicada e que culmina na apresentação de todos os personagens de forma dinâmica e funcional, estabelecendo já o "quem é quem" do filme), o garoto é o bastião da inocência - não no sentido politicamente correto da palavra - mas no sentido de caráter. Puro e inocente a ponto de se doar pelos amigos mesmo não querendo estar presencialmente ali, mesmo que isso lhe custe algo que ame e mesmo que isso o faça enfrentar perigos maiores do que sua pouca idade possa indicar. Ao mesmo tempo, o garoto precisa lidar com um pai ausente, que por sua vez precisa se desdobrar como pai e policial.


Os adultos no filme são encarados da mesma forma como Spielberg os via em ET. São criaturas estranhas e que pouco ou nada tem a acrescentar ao mundo dos adolescentes (ou pré, defina como quiser). Embora não os mostre da perspectiva forçada dos garotos (debaixo para cima, criando a sensação de que os adultos estão fora de quadro e portanto fora daquela realidade), tematicamente o "diálogo" é o mesmo.

Apenas dois personagens fogem a essa idéia. Jackson (Kyle Chandler), o pai de Joe, que representa a lei e a ordem em meio ao caos perpetrado em sua cidade e Louis (Ron Eldard), o pai de Alice, que surge como o bruto com coração mole como disse acima, mas que vai se tornando importante para a trama. Jackson é uma versão atualizada do personagem de Roy Scheider em Tubarão, que questiona a versão oficial e pacificadora das ditas autoridades legais, embora ele mesmo seja uma autoridade.


Outra característica que referencia as produções do período em que o filme se passa (e até alguns mais recentes) é o uso primoroso do som para criar tensão e desenvolver uma sequencia de ação. Homenageando Contatos Imediatos, ou ET, J.J. Abrams e equipe realizam proezas ao utilizar de maneira mais que eficiente esse elemento que muitos cineastas encaram apenas como veiculo para explosões sem sentido. As explosões de Super 8 - e elas são várias - além de fazerem sentido para a narrativa, são brilhantemente realizadas e o som amplifica ainda mais cada uma delas. A primeira grande sequencia que envolve um acidente de trem, fará - seguramente - a sala de cinema em que o leitor estiver vendo esse filme chacoalhar, tamanho acerto técnico em impactar o espectador. Em outro trecho (o que homenageia Contatos Imediatos) o som nos informa antecipadamente que um determinado personagem será atacado em um posto de gasolina de maneira sutil e bastante eficiente.

Assim como em Star Trek, a fotografia de Super 8 abusa dos flares (exposição dos reflexos na película), o que é quase uma assinatura em filme do diretor. As luzes e as contraluzes têm papel fundamental em seus filmes, e aqui além de abusar desse recurso característico de sua filmografia, ele ainda sabe contar sua história com segurança sem abusar de "invencionismos". Larry Fong, depois do "estágio" com Zack Snyder (com quem fez 300, Watchmen e Sucker Punch), aqui surge mais contido (ainda bem), ilustrando com enorme qualidade as idéias de Abrams. Nas seqüências de ação é bastante seguro e não cai na vala comum (e um tanto chata) da câmera na mão, apostando em dar escopo, criando planos grandiosos para ilustrar a idéia de batalha campal. Também acerta na granulação que fica num misto entre a homenagem e a noção de que está fazendo um filme em 2011, e na forma criativa de ilustrar o tal mistério que envolve o acidente de trem.


J.J. ,nas seqüências de ação, consegue mostrar ao espectador tudo o que ocorre em tela sem confundir o espectador. Também mantém os seus característicos travellings circulares e sua tendência a misturar uma sequencia musical emocional com uma cena de explosão (nos moldes do nascimento do capitão Kirk em Star Trek). J.J. mostra aqui que é sim um diretor de cinema (e que Star Trek não fora um acidente), sabendo escolher seus planos com cautela e que tem olho para escolher atores jovens (uma nova qualidade a ser explorada). Outra qualidade cada vez mais clara é sua habilidade para montar suas seqüências de forma mais que compreensível, tornando-as dinâmicas, sem apelar para o piscou-perdeu ou a clipagem, ainda, tão na moda em seqüências de ação. As montadoras Maryann Brandon (da série Alias, Missão Impossível 3, Como Treinar seu Dragão, Kung Fu Panda 2 e Star Trek) e Mary Jo Markey (das séries LOST e Alias, Missão Impossível 3 e Star Trek) conduzem o trem desgovernado com freios de aço. O grande destaque vai para as sucessivas - e funcionais - seqüências de suspense que o filme apresenta. Minha favorita é a do ônibus em fuga, que mistura humor, suspense, ação e horror sem errar na mistura. 

A trilha é outro destaque e assim como o som é extremamente valorizada. Contando novamente com o parceiro Michael Giacchino, a trilha de Super 8, se não contém um tema épico como em outros trabalhos do compositor, é sólida e tocante quando precisa ser. A sequencia final funciona de maneira mais do que emocional, emulando o melhor da parceria Spielberg/Williams. Outro acerto está na escolha das canções da época do filme que são utilizadas com muito cuidado e assertividade.


E a tal ameaça que move toda a trama? Novamente, pisando em ovos para não estragar a graça de ninguém, basta dizer que funciona como elemento criador de tanta tensão. Seguindo a escola "Scottiana" vai sendo apresentado em doses homeopáticas e mesmo quando surge totalmente em tela, ainda assim mantém a aura de mistério. Outra idéia da cartilha Amblin é a de dar alguma profundidade a ameaça, que não surge como vilão do filme, mas como alguém que age de determinada forma em virtude das conseqüências da vida.

Os vilões são os militares que simbolizam a mentira, a automação, o cumprir ordens sem medir as conseqüências, a sede de poder, a falta de escrúpulos e mais uma série de adjetivos. Por esses motivos, não existem como "personagens", mas como estereótipos que nesse tipo de filme até funcionam, já que para a história andar é necessário a inclusão de um agente externo, um motivador, algo, ou alguém, que motive os personagens a seguirem em frente.


Além dessa característica, o espectador também pode questionar algumas soluções um tanto simplistas ou mesmo ruins para alguns momentos do filme. Um determinado personagem que sobrevive milagrosamente quando mesmo em filmes muito menos "cerebrais" teria sido partido ao meio em uma sequencia semelhante, ou a incompetências dos militares que não descobrem as crianças e seus mirabolantes planos, ou a facilidade para aquela molecada chegar até o "covil" da tal ameaça. São pequenos buracos, ou falhas no roteiro que podem incomodar os mais céticos, ou aqueles que talvez tenham problemas com o tipo de filme que Super 8 é.

De minha parte, encaro-os como charmosas imperfeições. Não prejudicam o festival divertido e cheio de energia, bom humor e o tocante encerramento que Super 8 tem. Não sei se fará o que seus companheiros de prateleira na produtora fizeram com duas gerações seguidas, transformando-os em fãs neófitos das produções da Amblin, mas é inegável que corre nas veias do filme o mesmo DNA que fez da produtora a favorita de muita gente.






2 comentários:

  1. Blog Maravilhoso, é impossível deixar de assistir os filmes que são tao bem analisados, como Super 8.
    Já os favoritei e creio que serão minha página Inicial logo ..logo.
    Parabéns!

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