sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Repo Men - Os Coletores
(Repo Men, 2010)
Ficção Científica/Ação - 111 min.

Direção: Miguel Sapochnik
Roteiro: Eric Garcia e Garrett Lerner

Com: Jude Law, Forest Whitaker, Liev Schreiber e Alice Braga


Esse é mais um caso de um filme razoavelmente interessante que não vai chegar aos cinemas nacionais, que apostam - com alguma razão mercadológica - em Marmadukes, comédias de Jennifer Aniston, animações quaisquer e filmes de terror baratos e risíveis. Mais o caso é que Repo Men é um filme redondinho que poderia encontrar seu público no cinema, e que merecia uma chance numa semana mais fraca de lançamentos.

O filme do diretor Miguel Sapochnik é um sci-fi com um pé e meio cravado na realidade sobre esse grupo de caras - os tais Repo Men, ou Coletores - que trabalham para uma empresa (A União) que comercializa órgãos artificiais.

E onde entram os Coletores? Eles funcionam como os cobradores bancários. Ou seja, não pagou seu fígado, eles vão lá e arrancam de você. Literalmente.
 

O diretor, percebendo a trasheira que isso poderia virar, recheou seu filme de um humor cáustico que beira o doentio para amenizar a idéia perturbadora e, por que não, plausível.
Se hoje os órgãos artificiais - marca-passos por exemplo - são uma quase realidade, num futuro não tão distante não seria estranho que uma empresa privatize esses inventos e por conseqüência lucre com eles. Assim como hoje se vendem carros e casas, no mundo de Repo Men os órgãos também são vendidos - por crediário, o que causa divida já que o preço é alto e abusivo - e numa eventual falta de pagamento, coletados.

Os Repo Men funcionam como uma espécie de anjos da morte, que circulam sua presa e amedrontam os devedores somente com sua presença. O filme usa e abusa dessa idéia.
O tal humor já fica claro na abertura que combina uma ação extremamente violenta com a trilha sonora latina contrabalanceando o que é visto na tela.
 

O filme apresenta algumas opções narrativas na primeira metade interessantes, o que faz o filme crescer para quem assiste. Ao inserir um "conflito em casa" para o personagem principal e ao transformá-lo em vilão (com direito a uma passagem violenta de um massacre liderado pelo Coletor) o filme ganha alguma - pouca - originalidade e se afasta do festival de referências que o filme é.

Uma mistureba de: Eu Robô, Blade Runner (na ambientação), O Fugitivo, Quinto Elemento (no humor non-sense) e até Oldboy, que tem uma de suas seqüências mais famosas copiada sem dó pelo filme.

Um detalhe neófito, porém muito interessante, é a inserção de um pequeno - menos de cinco segundos - trecho de O Sentido da Vida de Monty Python, exatamente a seqüência em que os coletores visitam a casa de uma família para recolher os órgãos não pagos.Imediatamente a referência fica clara e a homenagem é bastante válida.
 

Assim como em Daybreakers - que criticamos aqui anteriormente - o filme também aposta na explicação para seu ambiente de forma orgânica, dentro da narrativa, por meio de anúncios publicitários ou na fala de personagens que funcionam como guias para a história.
Jude Law encabeça o elenco, ele vive Remy, o coletor que se transforma em herói. Não é uma atuação digna de prêmios, mas Law parece à vontade no papel. O restante do elenco conta com um Liev Schreiber cartunesco abraçando o humor do filme, Forest Whitaker se divertindo muito como o parceiro valentão e sem escrúpulos e Alice Braga - cada vez com mais currículo internacional - vivendo uma cantora cheia de órgãos substituídos que é responsável pelos piores momentos do filme. Não, a culpa não é dela, que faz o papel direitinho, mas da falta de imaginação dos roteiristas Eric Garcia e Garrett Lerner que optaram pela solução mais manjada e ao mesmo tempo mais infeliz para usar a personagem de Alice.

O segundo ato do filme - quando o caçador se torna caça - é bastante equivocado em termos narrativos. As motivações dos personagens surgem desencontradas e - no bom português - não fazem sentido. O uso da esposa do personagem de Law é estúpido e o filme caminha para um banho de sangue final, que apesar de divertido e bem montado, é grosseiro e não causa nenhuma comoção.
 

O filme ainda tem um plot twist agressivo nos minutos finais, que é interessante sim, mas pode causar ódio nos espectadores, pois ele subverte o que vínhamos vendo durante a projeção. Uma opção arriscada e que transforma o filme num conto agridoce.
A parte técnica e estilística do filme é razoável com destaque absoluto para a trilha sonora de Marco Beltrami e as canções - todas boas - selecionadas. A fotografia e edição (Enrique Chediak e Richard Francis-Bruce respectivamente) não saem do "feijão com arroz". Chediak cai na vala comum dos imitadores de Blade Runner na concepção da cidade à noite, cheia de outdoors gigantescos e muito neon.

O diretor Sapochnik - um desconhecido para mim - sai-se bem em algumas seqüências de ação (a última em especial, realmente empolgante apesar de "inspirada" em um grande filme) e não confunde o espectador com idas e vindas do roteiro. Ele ainda é "generoso" ao inserir uma pista durante a segunda metade do filme que indica o plot twist final. No restante não inventa e mantém as rédeas do filme. Opta por transformar um filme que poderia caminhar para o existencialismo de botequim em um bom thriller de perseguição.
 

Porém essa mudança, narrativamente, é truncada e não agrada. Parece que tudo foi pensado as pressas e falta química aos protagonistas e a óbvia referência a um determinado produto da The Union, incomoda e minimiza o "final surpresa" preparado.

Entre mortos e feridos, Repo Men se salva. Difere de boa parte dos sci-fis por evitar ser sisudo e encarar sua realidade com bom humor e tranqüilidade, mesmo quando o sangue espirra na lente.


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