terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Onde Vivem os Monstros
(Where the Wild Things Are, 2009)
101 min. - Drama

Direção: Spike Jonze
Roteiro: Spike Jonze e Dave Eggers

Com: Max Records, Catherine Keener. Vozes de: James Gandolfini, Chris Cooper, Paul Dano, Catherine O'Hara, Forest Whitaker, Lauren Ambrose e Michael Berry Jr.

Spike Jonze conquistou o respeito de um bom número de amantes do cinema graças aos seus inventivos Quero Ser John Malkovich, Adaptação e os clipes visualmente arrebatadores de Bjork e dos Chemical Brothers.

Onde Vivem os Monstros é um livro infantil de grande popularidade nos Estados Unidos escrito por Maurice Sendak, que conforme pesquisei não contém mais de 10 frases.

Só pelo trabalho que deve ter sido adaptar e criar um enredo que funcionasse como longa metragem o filme já mereceria no mínimo uma atenção especial.O bom é que o filme não vale apenas pela curiosidade quase mórbida em avaliar se a intenção de Jonze foi bem sucedida.


O filme é belíssimo, e não tenho medo de afirmar de saída que é um dos filmes obrigatórios para se ver no cinema nesse primeiro semestre. Jonze é poético, delicado e extremamente bem sucedido na sua tentativa de criar emoção de forma simples e verdadeiramente tocante.


Onde os Monstros fala sobre o garoto Max (vívido com doçura e sensibilidade por Max Records) que após o divórcio de seus pais se vê perdido entre uma irmã adolescente mais preocupada em sair com seus amigos (o que é absolutamente normal) e uma mãe que precisa sustentar a casa (outra realidade comum a muitos). Max quer ser aceito, quer viver como qualquer criança deseja viver, imerso por sua gigantesca imaginação e cercado por amigos e brincadeiras criadas por ele.


Após uma discussão severa com sua mãe, o garoto foge e acaba indo parar numa espécie de ilha “onde vivem os monstros” e acaba tornando-se o rei do país/ilha.


A parte técnica é um desbunde. Desde a abertura com os rabiscos sobre os logos da Warner, a fotografia urbana que se transforma em “ode a natureza”, a trilha sonora (cortesia aos nossos ouvidos de Karen O. dos Yeah! Yeah! Yeahs!) que é extremamente bem colocada, funcional e com qualidade musical acima da média.


A direção de arte é impecável (trabalho para prêmios por aí para K.K Barrett, Jeffre Thorpe e equipe) e as imagens da “toca” dos monstros com flores vermelhas crescendo é lindíssima. Os monstros apesar de não terem a intenção de parecerem “reais” são expressivos e se emocionam e nos emocionam.


Esses monstros lembram e muito os Muppets da TV, com traços que realmente nos fazem crer que aquilo só poderia ter sido criado pela mente de uma criança. Jonze e equipe não querem e nem buscam o realismo nas caracterizações físicas dos personagens (quando um deles perde um braço, não jorra sangue mas areia) mas a identificação da criança com eles e por conseqüência a nossa.


Os brilhantes monstros são interpretados com enorme realismo, numa simulação de uma comunidade humana, com direito a intriga, humor negro, inveja e raiva, tal qual os humanos fazem. Não a como não destacar as excelentes interpretações de James Gandolfini (da série Sopranos) como Carol, Paul Dano (Sangue Negro, Pequena Miss Sunshine) como Alexander, Catherine O’Hara (Esqueceram de Mim) como Judith, Forest Whitaker (Ultimo Rei da Escócia, Bird) como Ira, Chris Cooper (Adaptação, Beleza Americana) como Douglas e Lauren Ambrose como KW. Todos excelentes, transbordando credibilidade e não se importando se suas personas seriam monstros que parecessem ursos, bodes, ou qualquer outra coisa.

Esses monstros, e isso fica tão óbvio que qualquer espectador perceberia, representam o próprio Max e seus inúmeros "momentos" dentro de sua vida infantil. Uns representam sua raiva infantil, outros a visão que ele tem da mãe e da irmã (que "abandona" a família para ficar com os amigos), suas dúvidas, seu medo de crer no outro, sua solidão entre outros.


O mais incrível em Onde Vivem os Monstros é sua impressionante capacidade de transmitir conceitos de forma velada e ainda sim sendo efetivo e a delicadeza com o que Jonze consegue transportar os marmanjos barbados de volta a infância e a “confrontar” suas próprias identidades, e concluir o quanto a infância deve ser aproveitada até o último e finito segundo.


Como as relações que criamos quando pequenos devem ser protegidas e como o amor e a imaginação devem sempre estar presentes na vida de todos, adultos e crianças.


A relação estabelecida entre o monstro Carol e o pequeno Max é mais verdadeira do que quase a totalidade das ditas comédias românticas/dramas que são vendidos como “retratos de uma paixão”, “histórias de pai e filho”, “dramas de superação” e afins. O amor, essa palavra tão usada, e de forma tão mentirosa no cotidiano das pessoas e nas telas de cinema, é mostrado de maneira simples, objetiva e óbvia. Sem frescuras, sem complicações desnecessárias, somente um garoto e seu grande amigo se divertindo. Não a como não se emocionar na cena da praia e confesso que nesse momento, as lágrimas já estavam tomando conta e que o filme tinha realmente me “pegado”.


No fim, Onde Vivem os Monstros versa sobre crescimento, seja ele adquirido por meio de evolução tranquila e emocionalmente segura, ou como no caso de Max e de muitos, forçada pelas situações a que somos defrontados. Max encontra suas respostas entre os Monstros um anorme e complexo amálgama de seus sonhos, ilusões e alegrias.

Spike conseguiu de novo. Se com Malkovich ele brincou com o ciúme e uma relação doentia, e em Adaptação ele versou sobre crises existenciais e profissionais, em os Monstros ele voltou a infância onde tudo era mais simples, belo e divertido nesse tocante conto sobre o crescimento do ser humano.









Em 1963, o escritor Maurice Sendak criou uma típica obra infantil. Aquelas do tipo em que crianças leem, que apresentam uma frase e um grande desenho por página. Uma obra que poderia cair como mais um livro educativo de formato panfletário. Mas Onde Vivem Os Monstros não era isso. Escondia algo a mais, e mais profundo. E de primeiro olhar, esses detalhes que mostram o crescimento de uma criança criativa e mal-criada, podem não ser vistos. Mas na adaptação de 2010, é simplesmente impossível não captar as referências, compostas com qualidade máxima e muito aumentadas do livro, de forma maravilhosa.



Afinal, o objetivo dessa adaptação nada mais é do que captar os sentimentos levemente velados na obra literária e expo-los em tela, aumentando os quadros e situações do livro. E , definitivamente, esse objetivo é alcançado. O filme é belíssimo, e conta sua história de forma completamente diferenciada. Acompanhando a formação da obra original, o longa se constrói de forma completamente diferente das produções normais. Algo que poderia dar problema a produção nas bilheterias, se ela já não tivesse com problemas suficientes devido a seu todo do roteiro. Afinal, Onde Vivem Os Monstros é uma obra que dialoga sobre a infância, as invencionices das crianças - não das crianças modernas, mas das mais antigas, que trabalhavam mais seu cérebro do que o controle de TV ou video-game - mas tudo de forma muito adulta e artística.


Porém, se nas bilheterias a produção corre perigo, é só por aí. A história além de ser interessantíssima no modo de ser contada, é costurada com muita destresa. O menino Max, na história, é um garoto com imaginação muito fértil. Brinca com sua "fortaleza" iglu, manda nas cercas da casa e se auto - entitula seu rei, e foge para seu abrigo na cama quando o chão jorra falsa lava. Mas um dia, quando seus ânimos se exaltam e ele desobedece sua mãe, é castigado, e mandado para seu quarto sem jantar. Ele então foge , entra num barco e viaja até uma ilha distante e descobre que lá vivem criaturas, monstros selvagens. Lá, Max fala que era um rei, e se torna rei das criaturas, dando regras que ele proclama e tendo sua liberdade.


A história conta toda essa aventura de Max com os monstros, mas fala na verdade sobre crescimento e rebeldia juvenil. Muitos filmes com esses temas já surgiram, mas esse tem sua didática diferenciada já que mostra todo o aprendizado de Max direto da fonte, sua mente. A história em si, é uma grande metáfora, já que todos os monstros na verdade são as facetas de Max. Mas não é preciso usar mais metáforas na sua execução. Tudo é mostrado com clareza na frente de nossos olhos. Um exemplo : numa das sequencias iniciais, Max se decepciona com sua irmã, destrói o quarto dela por raiva, explode e põe todo seu lado selvagem pra fora, logo depois, recolhe seu ímpeto, e em sua racionalidade reflete sobre a realidade, que ela é a irmã dele, e se amam. Ao conhecer o Monstro Carol (o ótimo James Gandolfini) , que representa seu lado impetuoso e selvagem, Max retorna a essa lição.


Não é preciso usar mais metáforas disfarçadas, já que vemos sua mente de perto, e seu amadurecimento e relacionamento com os monstros ocorre explicitamente. E é esse um dos diferenciais de Onde Vivem Os Monstros : sua didática "reta", que espeta o público de maneira que muitos outros filmes não fariam. Além disso, o filme exibe várias homenagens á infância. Se em Toy Story, o filme da Pixar fala da fase mais tenra, Onde Vivem fala sobre seu final onde a imaginação extrapola qualquer limite, mas siginifica um rompimento, uma rebeldia de uma mente que quer ser escutada, mas ainda precisa amadurecer.


E o relacionamento de Max com os monstros é de beleza fenomenal. Todo o movimento tomado tem um por que e explicação, e é desenvolvido vagarosamente, que não é uma perda de ritmo, já que todo o ritmo do filme é assim, "calmo". A descoberta de sua responsabilidade e muitas outras acontece junto com as criaturas, que são ao mesmo tempo figuras infantis, mas servem de parâmetro para eventos que ocorrem na fase adulta. As atuações dos atores travestidos de monstros (muito simpáticos, até mais que os azulões de Pandora) são fenomenais e dão mais valor ainda ao filme.


Spike Jonze, por sua vez, nos premia com uma direção sublime. Não erra a mão, e prova que pode executar tanto a direção dramática quanto a de ação (mesmo que essa seja pouca). Opta por um estilo "câmera na mão", onde ela treme como num filme caseiro . Nas poucas cenas de ação, ele acompanha sem muitos cortes, mas com muita correria e captando todos os atores. E os efeitos visuais não são algo para se contemplar isoladamente,- apesar de serem muito bons- mas para se misturar com a história.


A trilha sonora e a fotografia são também de esmero aplaudível. Karen O. cria uma trilha própria para o filme, e que se destaca com louvor. Um filme sobre criança pede uma trilha agitada, melodiosa e com sons que remetem a criança cantando. E é isso que a trilha nos trás. Já a fotografia de Lance Acord coloca de cara um tom muito belo, e não oscila muito nas paletas - Nos desertos e áreas descampadas um tom amarelo , nas florestas, um verde claro delicado. Muito elegante e nada over.


Enfim, é preciso dar o crédito a produtora Warner Bros. Depois desse filme e de muitos outros trabalhos corajosos - como Watchmen - o estúdio parece entrar num outro patamar, e sai da loucura por dinheiro que o resto do mundo se encontra (como os caras da Fox). É, em outras palavras, um estúdio independente e mesmo assim o com mais dinheiro que existe, ou quase isso.

Digo isso não por que esse é um filme pesado ou com censura alta. É simplesmente um filme que dialoga sobre a infância, mas não é destinado ás crianças. É algo artístico, um cult que teve um orçamento de 100 milhões. Onde Vivem Os Monstros simplesmente é um filme único, sem nenhum atrativo para o público alienado que leva seus alienadinhos para ver Alvin e os Esquilos 2.


O retorno nas bilheterias, como disse anteriormente, pode ser um fracasso total, mas os produtores devem pelo menos se orgulhar do grande material que tem em mãos. Uma homenagem aos bons tempos de criança que todo o adulto já passou. Merece ser visto , e sentido tanto com seu cérebro quanto com seu coração.







TRAILER:



(Obs do Editor: Não tem muito a ver com o Fotograma, mas depois de zilhões de anos, voltei a escrever no meu outro blog o Palavras Tóxicas. Quem quiser ler, o endereço é: http://toxicaspalavras.blogspot.com )

3 comentários:

  1. Ok. Quero muito ver esse filme. Parece ser do tipo que emociona pela simplicidade. Espero que a estreia seja logo para poder conferir na telona como vc disse
    Boa resenha
    =P

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  2. Eu achei tipo, o trailer, FASNTÁÁSTICO, mas o filme em si, não é lá grande coisa, mas mesmo assim, vale a pena.

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  3. Essa resenha me deixou com mais água na boca ainda. Após ver o trailler já tinha imaginado que o filme parecia ter o mesmo estilo de AS CRÔNICAS DE NÁRNIA e PONTE PARA TERABÍTIA dois filmes que amei, por isso a vontade de vê-lo, mas agora estou louco pra sair daqui e ir correndo pra primeira sala que estiver passando.
    Óitma resenha!!!

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