sábado, 13 de fevereiro de 2010

A Estrada
(The Road, 2009)
Drama/Thriller - 111 min.

Direção: John Hillcoat
Roteiro: John Penhall

Com: Viggo Mortensen, Kodi Smith-McPhee, Robert Duvall, Charlize Theron, Guy Pearce

Quando em dezembro nós elaboramos os filmes para serem vistos em 2010, citei A Estrada e disse "que A Estrada seria o Filhos da Esperança de 2010". Pra quem não lembra Filhos da Esperança, um mix entre ficção científica e crítica a sociedade, foi um dos melhores filmes de 2006, mas foi absurdamente mal vendido, mal comprado e compreendido. Entrou para a categoria de filmes cults e hoje, graças aos deuses do cinema, vem recebendo o devido crédito.

A Estrada de John Hillcoat, deve seguir o mesmo caminho. Baseado no livro de Cormac McCarthy, a história visceral de pai e filho que cruzam os Estados Unidos dizimado por uma praga/doença numa tentativa desesperada de sobrevivência, não tem mesmo o perfil de sucesso de público. Talvez de crítica, mas com certeza encontrará entre aqueles, que como eu, admiram o espírito humano, seu público.


A história, apesar de extremamente cinzenta, pessimista e amarga em boa parte de sua narrativa, é profundamente atrelada aos conceitos mais profundos de humanidade.

O que nos diferencia dos animais ? Nosso intelecto, dirão alguns, nossa capacidade de sobreviver em sociedade dirão outros ... pra mim, o que nos diferencia de todas as outras formas de vida é nossa capacidade de, em iguais proporções, amar e odiar. De num mesmo ser conviverem internamente a mais pura compaixão e a mais mesquinha inveja. Isso nos torna diferentes, e durante a jornada de pai de filho (identificados apenas como Pai e Garoto no filme) os personagens vão encontrando as duas facetas que qualificam os seres humanos. De um grupo de pessoas que estão presas num porão e que para sobreviverem tem de apelar para o canibalismo, até um velho homem quase cego que passa uma noite com os dois.


Ao mesmo em que vemos o desespero desse pai (Viggo Mortensen, em uma atuação impressionante) para conseguir salvar o corpo e alma de seu filho, em flashbacks acompanhamos a vida pregressa desse homem, e os motivos para que ele tenha uma eterna desconfiança de tudo e de todos.

A relação de amor entre os personagens principais é no mínimo, emocionante. E tudo isso funcionando para o bem da história, e não como uma “muleta” para o desenvolvimento do filme.

Impressiona a habilidade com que Hillcoat conduz uma história basicamente com duas pessoas e que se passa quase que no mesmo monocromático cenário acinzentado e mesmo assim, em nenhum momento me senti entediado, ou senti uma quebra de ritmo.


Os flashbacks são outro ponto importante no filme, que não se importam em contar o que realmente aconteceu com o planeta, mas sim em mostrar quem era esse pai e o que o fez atravessar o país em busca de esperança. São os momentos mais tocantes do filme, em que Hillcoat mostra o personagem de Mortensen como um homem perdidamente apaixonado e completamente impotente diante das situações.

É bastante impressionante também a interpretação do garoto Kodi-Smith McPhee em especial na meia hora final, quando o garoto passa de menino a homem, num rito de passagem deverás doloroso.

Hillcoat é habilidoso em conduzir esse momento de forma sensível e emotiva, e mesmo assim fugindo da “melação”. O diretor aposta em sua história, seu conceito visual que mesmo nos inúmeros espaços abertos assume o tom acinzentado que dá a sensação de que a desolação enfrentada pelos personagens não terá fim jamais.


Destaque fundamental para a fotografia do filme (o eclético Javier Aguirresarobe, de Vicky Cristina Barcelona, Mar Adentro, Os Outros e de Lua Nova) e para a direção de arte impecável na construção de um planeta sujo e condenado.

A trilha sonora minimalista e emotiva cortesia de Nick Cave (sim O Nick Cave) e Warren Elllis é bastante acertada. Apostando nos pianos, a trilha acerta no tom e “casa” perfeitamente com cada frame do filme.

Além de Mortensen e do garoto Smith-McPhee, o filme conta com as participações de Robert Duvall e de Guy Pierce (esse numa ponta de luxo).


Alguns poderão reclamar da sobriedade do filme, e da falta de uma solução final ou mesmo de um início mais tradicional. Hillcoat nos joga literalmente no meio da história, e por meio de uma narração em off bastante pertinente ilustra alguns pontos obscuros da “mitologia” do filme. Mesmo assim, não será supresa se o filme não fizer absolutamente nenhum sucesso por aqui, e que muitos o achem “chato”, “parado” etc.

A essa ultima reclamação, faço aqui a defesa impiedosa do filme. Acho que o ponto mais interessante quanto a narrativa de A Estrada é justamente sua paciência em expor os personagens, contar suas histórias e não se propor a amarrar bem firme todas as pontas, dando margem a que muitos interpretem o final do filme (que obviamente não vou contar) de forma dúbia.

Pontos mais que positivos para essa obra que merece ser vista na tela grande, mas que provavelmente deverá ter seu nicho de sucesso nos dvd’s e na propaganda boca a boca.

TRAILER:


 

4 comentários:

  1. É o típico caso de um filme que nunca vai conseguir captar a essência da obra literária, porque não pôde desvendar o interior de seus personagens, apenas tentar traduzir isso visualmente. Não é a mesma coisa.

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  2. Fábio, infelizmente ainda não li o livro, mas o filme me impressionou bastante. Esperava muito menos do que vi.

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  3. PS: Mas é um bom filme, partindo do princípio que uma obra de cinema é, antes de tudo, ela em si própria, e não um organismo dependente de um livro. É um problema na maioria das adaptações para mim, essa dificuldade de separar o alpha e o ômega (!!!)

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  4. Ai sim ... achei que vc tinha achado uma porcaria rsrs

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