A Caixa
(The Box, 2009)
Thriller/Ficção Científica - 115 min.Direção: Richard Kelly
Roteiro: Richard Kelly
Com: Cameron Diaz, James Marsden e Frank Langella
Richard Kelly é uma das pessoas mais egocêntricas e prepotentes da história do cinema. Só isso pode explicar seus dois últimos filmes. O medonho Southland Tales e o mediano A Caixa. Em ambos ele não consegue contar uma história sem apelar para reviravoltas mirabolantes e explicações estranhas e sem sentido. Tá certo, Southland Tales talvez seja um dos piores filmes da história recente e qualquer filme comparado a esse já sai ganhando de uns 10 a zero, mas A Caixa, é mais um dos fracassos do ano e mais uma boa idéia mutilada e estragada por seu diretor e roteirista.
Tudo começa até bem, com uma caixa largada na porta de um casal comum (Cameron Diaz e James Marsden). Dentro dela existe um dispositivo estranho (uma cúpula com o botão vermelho no centro), e uma carta indicando que um tal de Steward apareceria ainda naquela tarde com instruções. Durante o dia somos informados que a personagem de Diaz (Norma) é uma professora de segundo grau que tem uma certa deficiência física (numa cena medonha de tão gratuita e sem sentido) e que Arthur (Marsden) trabalha na NASA, numa das filiais em Langley, onde se passa o filme.
Quando o tal Steward aparece ele diz: apertem o botão e alguém que vocês não conhecem morrerá e vocês receberam 1 milhão de dólares (o que devia ser uma grana inacreditável para 1976, época em que se passa o filme). Não apertem e tudo é esquecido. Steward é Frank Langella, que com auxílio da tecnologia tem uma enorme deformidade no rosto, causada por uma espécie de queimadura.
Tirando a cena dispensável que apresenta a deformidade de Norma, a premissa e os primeiros 30 minutos do filme são bem interessantes. E quando pensei que acompanharíamos as discussões entre o casal e os problemas morais que envolvem o ato de apertar o botão, Kelly simplesmente resolve a situação e parte para o “filme de mistério”. O que acontece com a caixa? Quem é Steward? Porque ele faz aquilo? O que acontecerá com Norma e Arthur?
Nada contra, mas quando se caminha nessa direção alguns riscos são corridos. A possibilidade das respostas não agradarem são enormes, principalmente tratando-se de um diretor que adora misturar coisas que não combinam. Ao ver o filme, (e odeio usar outros filmes como comparação, já que acho que cada obra é única, em sua magnificência e mediocridade, mas nesse caso acho que facilita a compreensão), lembrei-me de O Apanhador de Sonhos e principalmente do (com perdão do trocadilho infame) esquecível, Os Esquecidos. Pra quem não lembra é aquele com a Juliane Moore, que tem seu filho seqüestrado e no fim descobre-se que é tudo culpa de et’s.
A comparação cabe, pois, ambos partem de uma premissa interessante para entregarem trabalhos medíocres, cada um com sua particular imbecilidade.
O filme de Kelly peca no ritmo, no atropelo e na quantidade inacreditável de personagens “misteriosos” que surgem na tela. E peca, quase mortalmente, ao explicar os mecanismos da caixa e as motivações por trás do deformado Steward.
Faltam palavras para descrever a colagem de elementos absurdos na tentativa de demonstrar coesão que o diretor usa e abusa. Eu não vou soltar spoilers, mas quem tiver visto o filme e quiser comentar abaixo sobre suas impressões terei o prazer de me estender sobre isso.
Tecnicamente o filme não é ruim. A fotografia que emula os suspenses setentistas é bastante eficiente e talvez seja o único ponto de destaque incontestável. Granulado, mais apoiado pela tecnologia misturando o "clima" de uma década espetacular para o cinema com as técnicas atuais de filtros e coloração.
Por outro lado o que falar dos medonhos efeitos visuais? A impressão é que toda a verba foi gasta na “cara” de Langella e esqueceram que o filme apresentaria pelo menos mais três sequencias com efeitos visuais. As três são dignas de aparecerem num livro de como NÃO fazer efeitos visuais em cg. São dignos de filmes da Saban (lembram dos Power Rangers, então nesse nível) e acabam de enterrar o filme de Kelly.
Outro erro cabal: apostar que o público vai se identificar, acompanhar e gostar de um casal insosso como Cameron Diaz e James Marsden é brincadeira. Diaz, que não é uma atriz ruim, mas é muito irregular alternando atuações consistentes com outras muito fracas, e Marsden que é um eterno coadjuvante. Nem nas cenas mais tensas e que dependiam pouco dos atores, pois toda a situação já era por si só magnética, o casal se sai bem.
Langella, apesar da atuação no automático, é a melhor coisa do filme. O “ar de superioridade” de seu personagem condiz perfeitamente com o que lhe é pedido, e principalmente depois que a tal “revelação” acontece.
É verdade também, que na meia hora final Kelly volta ao clima de análise de comportamento, mas o caldo já tinha sido entornado e assisti ao filme só pra saber o que ia acontecer e pra que lado o barco ia ser tocado.
Kelly está agora, numa “sinuca de bico”. Dos seus cinco filmes, um virou Cult, outro é um dos piores da história e os outros três (A Caixa é um deles) vão pro limbo.
Em 2000, um roteiro de ficção-científica dramática circulava pelo circuito independente de Hollywood. Depois de ser recusado por grandes estúdios, o roteiro foi aceito por Drew Barrymore, dona da Flower Films, que se propôs a financiar o filme. Com orçamento enxuto de 4 Milhões, Donnie Darko era lançado em 2001.
O filme, com uma passagem boa pelo cinema, acabou ficando na memória dos cinéfilos, se tornando um instantânio cult. Assim, estava sacramentada a entrada de Richard Kelly no cinema. O diretor-roteirista, na época com 25 anos, estava sendo moldado para uma carreira vitoriosa. Porém, depois só veio "tragédia" pra carreira do talentoso Kelly. Primeiro, o roteiro do execrável Domino. Segundo, Southland Tales, tido como um dos filmes mais bizarros e pretenciosos da história, envolvendo de fim do mundo até reflexo atrasado no espelho. Mesmo com o baque, Kelly continuou. Agora, surge A Caixa nos cinemas, a chance de redenção dele. Será que houve a redenção?
Bom. Digamos que o talentoso Kelly agora é o pretencioso Kelly.
A trama, baseada no conto do genial Richard Matheson, segue o casal Norma (Cameron Diaz) e Arthur Lewis (James Marsden), dois perfeitos exemplos da classe média do subúrbio americano em 1976. Ela, professora. Ele, engenheiro da NASA. Mas, sua vida sem sal começa a mudar quando a falta de dinheiro aparece e quando um homem chamado Arlington Steward (Frank Langella) bate em sua porta e deixa uma caixa, junto com um bilhete, dizendo que Arlington aparecerá ás 17 horas. Então, quando ele chega faz uma proposta pro casal. Se eles apertarem o botão, duas coisas acontecerão: alguém no mundo irá morrer e eles receberão uma maleta com 1 Milhão de dólares. Logo, eles têm 24 horas pra decidir.
Vendo a trama, dá pra perceber facilmente que nas mãos de um Michael Haneke, de um Park Chan-Wook ou de um Darren Aronofsky, teríamos um suspense psicológico sobre moral e bons costumes, com a tensão lá em cima. Porém, estamos falando de Richard Kelly, que entrou na fase "quero colocar o maior número de referências sci-fi nos filmes". Em A Caixa, temos um absurdo número de referências desnecessárias que só fazem parecer que Kelly é cineasta de um só filme. Quando James Marsden, em uma cena chave que envolve sobrevivência ou escuridão eterna, fica fascinado com o fato na tela e cita Arthur C. Clarke, toda a naturalidade se esvaiz.
O roteiro de A Caixa é o que afunda o filme em mais de 10 momentos. Kelly pega a trama principal, sobre a tal caixa e a resolve em ridículos 20 minutos. A partir daí, começa o famoso "jogo de gato e rato", a "corrida contra o tempo" ou o "vamos desvendar o passado do personagem". O pior de tudo é que esse resenhista, fã de Kelly, resolveu dar uma chance ao filme, afinal, se ele escolheu trilhar o caminho de descobrir o passado de Arlington, que o faça com destreza. Mais um ponto negativo. A trama de Arlington envolve desde experiência pós-morte até os ETs. É a tal mania de Kelly em colocar todas as referências Sci-Fi possíveis. Fora a estrutura, os diálogos de A Caixa são interessantes de acompanhar. Eles vão do sublime (não explicar o que a imagem já diz) ao desatroso ("Você é real?" Cameron Diaz para Langella).
As interações entre os personagens são pontuadas por esse contraste do diálogo, o que torna A Caixa uma experiência estranha e bizarra. Seja para o bem ou para o mal. Mesmo na estrutura, esse contraste é visível. O sublime (o bom final e os mistérios poucos explicados) ao ridículo (o idiota meio do filme). Assim, Kelly continua com o mal de Southland Tales: a pretensão.
Tecnicamente, não há o que reclamar de A Caixa. Kelly tem uma boa direção, posicionando ângulos mais suaves e clássicos. Apesar disso, sua direção de atores é fraca, afinal, ele só consegue extrair de Langella uma boa atuação. A trilha sonora de Win Butler, Régine Chassagne e Owen Pallett é extrema e eleva a tensão com notas clássicas, lembrando os filmes de horror dos anos 60. Cabe como uma boa homenagem, mas artisticamente serve pouco, sendo mediana. Funciona no filme e isso basta.
A edição de Sam Bauer é competente e também ajuda no ritmo do filme. Mas, o ponto positivo extremo do filme é a fotografia de Steven Poster. A aura branca do filme, como se tudo fosse um sonho, é excelente. Fora isso, o excelente filtro de câmeras digitais que Poster usou ajuda na recriação dos bonitos anos 70 americanos. Outro ponto positivo é a direção de arte, que criou um cenário verossímel e bonito para aquela época tão peculiar. Em conjunto com a fotografia, a direção de arte forma o dueto fantástico do filme, talvez uma das únicas coisas que merecem nota em A Caixa.
Em atuações, pouco para se falar. Sem a ajuda de Kelly, que não se esforça em conseguir uma atuação no mínimo aceitável de Diaz e Marsden, todo o elenco se perde. Frank Langella engole qualquer um e demonstra sua competência habitual, mas Cameron Diaz faz uma caricatura mal feita de professora do subúrbio. Suas falas já não convencem sozinhas, quando Diaz abre a boca então... Nem quando ela tem suas expressões com marido e filho ela convence. Com certeza, Diaz pode ser boa, mas com um diretor excelente (Gangues de Nova York) ou quando ela é alívio cômico (As Panteras). Mas o pior, sem dúvida, é o pífio e metido-a-ator James Marsden. Se não bastasse ele ter como maior papel o Ciclope-corno-inexpressivo de X-Men, ele piora em A Caixa. Deslumbrado, bobo e sem convencer por um segundo, Marsden consegue um feito único: ele tem uma expressão só para todos os sentimentos. Quando tá triste, faz cara de bobo. Quando tá feliz, também. Quando raivoso, também. E por assim vai. Apesar da falta de talento, uma parcela da incompetência se deve a Kelly e sua construção razoável de personagens. Enfim, um desastre.
Sendo assim, pode se dizer que A Caixa é execrável para muitos. Porém, o filme tem alguns méritos já citados, como um bom início e um bom final. Fora que, os mistérios poucos explicados da trama não são ridículos e, mesmo sendo chupados de tudo quanto é filme Sci-Fi, não são dignos de apedrejar.
No final das contas, A Caixa é algo pra se esperar o DVD. Apenas um filme que tinha potencial que foi devidamente destruído pela ganância criativa de seu diretor. E aqui fica a torcida por Kelly. Ele tem 34 anos. Ainda dá tempo de se concertar.
Matadouro 5, O Homem Ilustrado, Corrida Silenciosa, Solyent Green, Fuga do Século 23...
ResponderExcluir"A Caixa" deveria ter sido feito naquela época, para aproveitar o que tem de melhor: promover perguntas e reflexão, mas dosando a quantidade de pontas soltas que deixa. Todos esses filmes deixavam a platéia digerindo os temas e imaginando o futuro da humanidade. "A Caixa" corre pelo mesmo caminho, mas tem uma característica que me assusta: não achei o filme ruim, mas junto com Ilha do Medo, é o filme que mais me deixou pensando no "pós" filme nos últimos tempos.