domingo, 4 de abril de 2010

Apenas o Fim
(Apenas o Fim, 2008)
Comédia/Romance - 80 min.

Direção: Matheus Souza
Roteiro: Matheus Souza

Com: Gregório Duvivier e Erika Mader

A geração dos anos 90 sempre foram meio esquecidas. Sem grandes acontecimentos, sem grandes ídolos... Mas foi, sem dúvida, uma das épocas mais férteis a nível cultural, principalmente em cinema. Foi nos 90's que surgiu fantásticos diretores como Christopher Nolan, Quentin Tarantino e Darren Aronofsky. E, além de tudo, haviam elementos nerds na cultura pop dessa década que ficaram marcados até hoje. Porém, essa geração tão influente culturalmente foi pouco retratada nas telas americanas.

Os dois diretores que fazem isso e que tem mais visão no mercado são Tarantino e Kevin Smith. Um influenciado pela mania cinéfila e filmes dos anos 60-70-80, mas com tramas noventistas. Outro com tramas noventistas e influenciado pela cultura dos anos 80-90. Já aqui no Brasil, fica muito mais difícil. Geralmente, aqui temos apenas duas categorias de filmes: comédias globais e filmes-denúncia. As comédias quase sempre são execráveis, porém os filmes-denúncia são uma boa pedida (apesar de tudo estar se esgotando, vide Salve Geral). Assim, logo temos um mercado desgastado em cinema. A única produção que ofereceu alguma novidade nos últimos 2 anos foi o mediano Besouro, que mesclava novela das seis com pancadaria de Hong Kong (pouca pancadaria, vale dizer).



Então, chegou agora, lá da PUC do Rio de Janeiro, um garoto estudante chamado Matheus Souza. Quando a poderosa produtora Mariza Leão chegou na PUC e viu o filme do garoto, resolveu distribuí-lo.

O longa, chamado Apenas o Fim, agora estava pronto para ser lançado no grande circuito do Brasil. Com Gregório Duvivier e Érika Mader, dois amigos de teatro do diretor, o longa já merece destaque por ter sido feito com o orçamento de uma rifa de garrafa de whiskey. E esse longa é o que determina bem o que foi os Anos 90 para a juventude nerd do Brasil. Nada de cantores-ídolos drogados, pegação ou festas ploc que varavam a madrugada. Em Apenas o Fim, tudo isso tem um valor menor que uma action-figure do Fanático. Logo, é o primeiro longa que retrata essa geração, que pode se considerar homenageada. Mas seria Apenas o Fim apenas um filme de um estudante que resolveu falar sobre cinema?

Não. Não mesmo. Além de tudo, Apenas o Fim é o mais bonito poema de amor já feito no Brasil.


A trama, simplória e objetiva, começa com Tom (Gregório Duvivier) indo para uma prova na sua faculdade de cinema. Quando ele está entrando, sua namorada (Érika Mader) chega e o avisa que irá embora, pra sempre. Tom não acredita e continua indo para a prova, porém ela o avisa q ele nunca mais a verá e ela vai embora mesmo. Então, ela faz uma proposta: Ela tem uma hora até ir e pergunta para Tom se ele quer ir pro quarto deles e transar até a partida ou debater sobre o relacionamento até o fatídico adeus. Optando pela segunda opção, Tom começa a passear pela universidade com sua amada. Começa a partir daí um brilhante e lindo debate sobre cultura, amor, renúncia e humor.

Já que Apenas o Fim é um filme universitário, tecnicamente não é de se esperar nada. Por isso, todas as cobranças caem por cima do roteiro. E, é com alegria que digo que o roteiro compensa qualquer erro técnico. Escrito por Matheus Souza, o roteiro é fantástico em todos os sentidos. Estruturalmente, segue a linha de Antes do pôr-do-Sol: um enorme diálogo sobre relacionamento, entre dois apaixonados. E isso é mais uma vez bem explorado, afinal, a conversa consegue ir pra todos os prós e contras da relação nos curtos 80 minutos de filme. Além disso, o filme dá umas pausas para flashbacks de momentos bons do casal, que servem para nos apegarmos a eles e sabermos um pouco mais de suas vidas. Construção de personagens excelente. Já nos diálogos, o roteiro demonstra ainda mais sua competência, sendo algo único no Brasil até hoje.

Tom, nerd assumido, fala sobre muitas referências pop da sua geração enquanto tenta encontrar motivos para sua namorada o largar. A personagem de Érika Mader, sem nome, segue a linha misteriosa. Seus diálogos deixam claro que ela ama Tom, porém ela fala que não foi feliz com ele (e que nem será no seu destino futuro). Uma grande personagem dúbia, com suas emoções e ambições. Humana como poucas.


Além disso, o filme é bonito pois trata o amor com honestidade pouco vista. 500 Dias com Ela, por exemplo, é um dos filmes que podemos comparar a esse. Durante todo o filme, o espectador vai se apegando ao modo carinhoso entre os dois protagonistas e ao amor sincero que um sente pelo outro. E, além disso, o filme joga bastante a questão de como um nerd com "os óculos do avô" conseguiu uma mulher tão maravilhosa como aquela. Ao longo do filme, vemos que eles se equiparam (e ficam ótimos juntos).

Em uma cena especial, que faz saltar lágrimas dos olhos, Tom vai ao banheiro e sua namorada o espera do lado de fora. A repercussão do ato é mostrada aos acordes-tema do filme e segue a reação de cada um deles. Bela, muda e poética, a cena já entra no imaginário do cinema nacional por sua carinhosa sensibilidade. Além de tudo, Matheus Souza põe dois outros personagens em determinados pontos da película: uma amiga de Tom e um amigo "pegador" de Tom.

É incrível como os estereótipos ficam tão bem construídos na mão do novato escritor. Se a amiga é mostrada caricatualmente, o amigo é um cara que identificamos nos dias de hoje. No meu caso, ele me lembrou um colega de colégio, adepto do mundo das aparências e metido a pegador. Genial, Matheus joga nas telas o verdadeiro retrato jovem de hoje em dia.


Tecnicamente, pouco a se falar. A direção de Matheus Souza é boa e, apesar de parecer amadora em alguns pontos, é rica e competente. A fotografia e edição do filme são comuns e caseiras também. Fora isso, algumas partes em preto e branco são bonitas e bem feitas. Apenas isso. Espera-se agora que Matheus ganhe uma nova chance, com uma excelente equipe e câmeras, algo mais profissional.

As atuações do filme se resumem a Érika e Gregório. Nathália Dill (a amiga) e o amigo de Tom nada fazem demais, além de alguns coadjuvantes no final. Érika é fantástica e atua na medida, contruindo um personagem fabuloso, em conjunto com o roteiro. A atriz, que tinha papéis de pouca expressão em novelas globais e na série da HBO Mandrake, rouba a cena aqui. Um achado futuro para o cinema. Já Gregório Duvivier é de um talento embasbacante. O ator, pouquíssimo conhecido, entra no personagem de forma competente e faz parece que ele é mesmo Tom (que por sua vez parece muito ser um alter-ego de Matheus Souza). Fora que suas expressões faciais são fantásticas e dão a dose exata de sentimentalismo e humor que o filme exige. Definitivamente, Apenas o Fim também chama a atenção pelas atuações.

Apenas o Fim é um excelente exemplar de que a nova geração de cineastas brasileiros pode surpreender e emocionar. Fico muito mais tranquilo sabendo que depois de Meirelles, Walter Salles e José Padilha, temos o espetacular Matheus Souza. Fantástico esse trabalho de estreia, um honesto retrato de uma geração pouco comentada pelo cinema e pela sociedade. Todos os cinéfilos e noventistas podem chorar de emoção: Finalmente, fomos honrados aqui no nosso país. Finalmente, pudemos ouvir alguém falar de Godard, Transformers e Power Rangers em português.

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