domingo, 11 de abril de 2010

Estão Todos Bem
(Everybody's Fine, 2009)
Drama - 99 min.

Direção: Kirk Jones
Roteiro: Kirk Jones

Com: Robert DeNiro, Kate Beckinsale, Sam Rockwell e Drew Barrymore

Se me perguntassem hoje, aos meus 25 anos completos, o que eu acho que mais amedronta as pessoas num nível pessoal (excetuando-se obviamente aqueles eventos que independem da nossa vontade), minha resposta seria clara e objetiva: decepcionar alguém que amamos. Esse alguém que amamos pode ser qualquer um: sua namorada, namorado, esposo, esposa, pais, cachorro, papagaio entre tantos outros.

Estamos Todos Bem, remake do filme italiano Stanno tutti bene (que não vi, portanto me abstenho de qualquer comparação), trata em sua alma disso. Nossos medos de decepcionarmos quem amamos e como, e por causa disso sofremos calados. Sofrermos, pois, ao não contarmos e dividirmos o fardo que nos pesa nos ombros, impedimos que os que nos amam sejam capazes de nos ajudar. O ser humano tem medo de sofrer. É natural sentir medo, mas é igualmente natural passarmos por situações em que nos vemos forçados e “atravessarmos a rua” e seguirmos por outro caminho. A vida é assim.


Robert De Niro vive Frank Goode, um pai que aparentemente é amoroso, sério e que perdeu a esposa há poucos meses. Como em boa parte das famílias, a figura do pai é sempre vista como provedor e como um chefe a quem devemos “relatórios”, “memorandos” e “e-mails diários” relatando nosso progresso. O personagem de De Niro é um pouco assim. Após a morte da esposa, ele teve de assumir o papel que sua esposa exercia: ligar para os filhos, perguntar se todos estão bem, o que andam fazendo, convidá-los para algum evento e afins.

A matemática da vida não é perfeita, não basta somarmos um mais um para chegarmos a dois. Por mais que se esforçasse e tentasse apoiar os filhos, de alguma maneira ele “forçou a barra”, fazendo com que seus quatro filhos (Rosie, Amy, Robert e David) quase que instintivamente bloqueassem de seu conhecimento os problemas que enfrentavam.
Frank parte então em busca de respostas. Por que eles não vieram? Por que mentem? O que será que realmente estão fazendo? E ... estarão verdadeiramente bem?


A jornada é deliciosamente agridoce. E no menu temos de tudo. A filha bem sucedida financeiramente, mas com a vida pessoal complexa. O filho musico que tem medo de não ter conseguido deixar o pai orgulhoso, a filha que esbanja felicidade, apenas como uma casca fina de problemas mais sérios e o filho ausente. Ausente física, porém o mais presente emocionalmente (notem a cena quase no fim da projeção que envolve a galeria de arte e um quadro encontrado por lá e vão entender o que falo).

No fundo, os quatro queriam apenas que o pai se sentisse orgulhoso. Que no fim, os visse como heróis olímpicos recebendo as medalhas e os louros da glória. Porém, parafraseando a mim mesmo, a matemática da vida não funciona assim.

As agruras do dia a dia, que todos passamos, impedem que estejamos sempre bem. Elas castram nossa felicidade e cabe a nós encontrarmos um meio para que mesmo diante de problemas consigamos nos manter de pé. Os personagens conseguem como boa parte de nós, mas daí a abrir o jogo e contar tudo a seu pai... é outro departamento, como diria minha tia.


Ao sairmos do convívio diário com eles, fica mais difícil (e não me perguntem por que) nos sentirmos aptos a nos abrir. Se aos oito você (geralmente) conta tudo, aos 15 conta o que interessa, aos 20 quase não abre a boca e aos 25 (olha eu ai de novo) quer apenas que “tudo pareça bem”. No fundo você não quer decepcionar ninguém.

Todo esse papo que beira o livro de auto-ajuda, é tão bem contado pelo diretor e roteirista Kirk Jones que fica difícil enxergar problemas no filme.

É claro, que muitos podem reclamar de algumas coisas, que eu mesmo também senti falta. Por exemplo, o filme é curto e as soluções acontecem apressadamente. Por esse motivo perdemos a chance de vermos três grandes encontros na tela por mais tempo. Sam Rockwell como o músico Robert , é sereno com sua condição. Está feliz consigo, mas não consegue, mesmo sentindo-se assim, enxergar-se apto a ter o direito de ter um pai orgulhoso de seu trabalho. Uma atuação contida de Rockwell, que vem do excelente Moon, e mostra-se cada vez mais interessante como ator. Kate Beckinsale como a filha “perfeita” Amy, sócia de uma agência de publicidade e com uma casa fenomenal é o elo mais frágil e mais complexo da história. Sem soltar spoilers, digamos que ela funcione para a trama como a condutora, embora sua própria vida devesse ser conduzida de forma menos confusa. E Drew Barrymore, cada vez melhor, é a filha “glamour” Rosie. Vivendo em Vegas, dançando num show e morando num belo apê, aparentemente é feliz, porém algumas dicas são dadas, e sua expressão ao deixar o pai no aeroporto (atentem a cena e percebam a interpretação sutil de Barrymore) entrega sua condição. E por fim David. Quase um McGuffin do filme, pois boa parte do plot gira em torno dele. Ele é a presença oculta. Sempre presente, de forma implícita.


E finalmente, DeNiro, com sua melhor interpretação em um bom tempo. Parece que Bob DeNiro entendeu sua idade e vive Frank, com uma naturalidade comum aos grandes atores e aos grandes homens, que ao perceberem sua condição, adéquam-se ao meio. A cena do hospital é forte e muito bem conduzida.

O condutor é Jones, que faz um trabalho competente. Volto a dizer que não vi o original de Tornatore, mas esse aqui funciona muito bem. Muito feliz ao retratar por diversas vezes os filhos de Frank, como crianças e muito mais feliz ainda ao retratar um almoço em família com crianças (com diálogos que fariam a juíza carioca que quer “acabar” com a novela das oito enviar dezoito cartas ao estúdio responsável pela fita). Quem é pai (ainda não sou) tem o costume de referir-se aos filhos como “crianças”, e o diretor leva isso ao pé da letra, ao apresentar cada um dos filhos do personagem de DeNiro primeiramente como crianças, para apenas depois retratá-los em suas idades reais.


Outro trunfo são os diálogos interessantes e bem construídos que fogem da possível pieguice do tema e da história (que não passa do velho drama de família). A trilha sonora de Dario Marianelli e as belas canções (uma delas de Paul McCartney) são perfeitas ao que se propõem. Funciona quase como uma sucessão de operetas e retratam de maneira poética os sentimentos que os personagens enfrentam. Eu gostei, outros podem dizer que ele deixou tudo mastigado.

Entre erros (poucos) e acertos (a maioria) Estão Todos Bem, é sim um filme a ser visto com mais atenção. Em especial se você já passou dos 20 e poucos e “sofre” com ligações de pais, mães e outros parentes. É quase certo que vá se identificar e entender as opções de vários personagens e que (ai sim sem duvida nenhuma) vai se comover com o trabalho de DeNiro nesse que seu melhor papel em alguns anos.

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