quinta-feira, 27 de outubro de 2011

O Palhaço
(O Palhaço, 2011)
Drama/Comédia - 90 min.

Direção: Selton Mello
Roteiro: Selton Mello e Marcello Vindicato

Com: Selton Mello, Paulo José, Álamo Facó, Thogun, Teuda Bara, Larissa Manoela, Giselle Motta, Hossen Minussi, Fabiana Karla, Jorge Loredo, Tonico Pereira, Ferrugem e Moacyr Franco

Selton Mello é um ator consagrado e muito versátil. Por isso, não é com grande surpresa que acompanhamos as profundas mudanças entre Feliz Natal (sua estréia na direção) e O Palhaço. Se Feliz Natal era um drama urbano sombrio, desesperançoso, cru, granulado e com muita câmera na mão, O Palhaço é uma ode a alegria, a comédia, as cores do circo, da vida simples de um grupo de pessoas que amam o que fazem e que superam dificuldades com um sorriso no rosto e uma piada na ponta da língua.

Acompanhamos a história do palhaço Benjamin/Pangaré (Selton Mello) que cruza o interior do país com seu pai Valdemar/Puro Sangue (Paulo José), enfrentando toda uma variedade de dificuldades e encontros divertidos, sem na verdade, saber o que quer da vida. No fundo, Selton usa do Palhaço (essa figura sempre sorridente) para falar de um homem em busca de seu lugar na vida. Em busca de auto-afirmação, de conseguir sair de baixo da asa do pai e principalmente descobrir uma forma de se sentir feliz fazendo os outros rirem também.

Montado de maneira simples, dando muito espaço para os atores, O Palhaço consegue apresentar o circo de forma cinematográfica não caindo no teatro filmado, sabendo como e onde posicionar a câmera para amplificar cada situação criada pelos atores. A apresentação final que inclui uma ótima sequencia de humor da dupla (muito entrosada) Mello-José é o ponto alto do filme, uma verdadeira catarse para os olhos e ouvidos.


O cenário escolhido - interior de Minas Gerais - também ajuda muito o filme. Quase todo filmado durante a chamada "hora mágica" nas cenas diurnas, é impossível não encarar o sol e o céu claro como elementos importantes na cena. Mesmo nas cenas noturnas ou internas, a iluminação e a fotografia mantêm o clima leve da produção. A única variação em relação a esse trabalho, acontece quando a cidade de Passos (curiosamente o lugar onde Selton nasceu, mas que, segundo o mesmo não tem relação alguma com o que vemos na tela) é mostrada. Um ambiente mais escuro, com poucas cores, mais saturado e com maior acidez, é o reflexo da mudança de foco do longa, quando passa a acompanhar a jornada de um determinado personagem pela cidade mineira.

O elenco - e esse é um filme de elenco basicamente - é todo ele excelente. Álamo Facó e Hossem Minussi são João e Chico Lorota a dupla responsável pelo som no circo e os criadores de caso, sempre tentando levar vantagem. Thogun interpreta Gordini, o homem forte, aquele que levanta os halteres nas apresentações circenses, mas que contrapõe essa imagem de forte sendo o mais sensível do grupo, encanado até mesmo com seu cheiro. A excelente Teuda Bara consegue ir do cômico ao emocional com muita facilidade e vive a outra palhaça, Dona Zaira, sempre a procura de um sutiã novo.


Os protagonistas, Paulo José e Selton Mello estão em grande momento. Selton faz de Benjamin um sujeito de fala mansa, que esconde muito do que é e de suas reais intenções. Passa pela vida atuando entre o palhaço engraçado do picadeiro e o homem em busca de seu lugar. Uma interpretação sutil, muito segura, cheia de maneirismos e de tiques que funcionam para fazer de Benjamin um sujeito realmente "estranho".

Já o grande Paulo José, faz de Valdemar um homem cansado pela vida, mas que tem disposição para seguir em frente. Seguro de quem é, e do quer para sua vida, ve as duvidas do filho com ternura, mas com certa rigidez. Interpretando muito com o olhar, Paulo, apesar das limitações da idade parece um garoto em cena, destacando-se a química com Selton em todos os números do circo.


O filme conta também com uma série de participações especiais, que, além darem espaço (assim como Selton fez em Feliz Natal) para o resgate de grandes nomes da tv e do cinema nacional, enriquecem muito o filme. 

São os casos de Fabiana Karla (conhecida humorista), Tonico Pereira (como irmãos gêmeos e mecânicos), Jorge Loredo (o eterno Zé Bonitinho), Ferrugem (que nunca envelhece) e Moacyr Franco (estreando no cinema em uma pequena, mais hilariante participação que rendeu o prêmio de melhor ator coadjuvante no Festival de Paulínia ano passado). Selton é notável também por dar espaço à jovem Larissa Manoela que interpreta a jovem Guilhermina, numa sensível e delicada interpretação, funcionando muitas vezes como o olhar do público deslumbrado com aquele mundo.


Tecnicamente o filme é belíssimo. A direção de arte é das melhores do ano, sabendo usar do bizarro (como a casa do prefeito de uma cidade pequena recheada de quadros exóticos), do simplório (quando o circo é enfocado e suas habitações simples, feitas de remendos e com um ar kitsch), do opressivo (os detalhes da cidade grande, o quarto de hotel que determinado personagem fica) e o mágico (o ambiente circense, onde também se destacam os ótimos figurinos do filme).

O Palhaço é um desbunde visual, de sentimentos nobres com muito bom humor (e que garantem sim algumas risadas) mas profundamente emotivo e que aponta Selton Mello como um realizador de alta qualidade, tendo apenas dois filmes no currículo. Sinal de que seu talento é latente e merece ser acompanhado.

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