Três Mosqueteiros
(The Three Musketeers, 2011)
Ação/Aventura - 110 min.
Direção: Paul W.S. Anderson
Roteiro: Alex Litvak, Andrew Davis
Com: Matthew MacFadyen, Milla Jovovich, Luke Evans, Ray Stevenson, Orlando Bloom, Logan Lerman, Mads Mikkelsen e Christoph Waltz
Paul W.S. Anderson é um fanfarrão que não parece saber seus limites. Depois de vilipendiar os filmes de zumbi, com a série inspirada nos games de Resident Evil, as armas de Anderson agora são apontadas para o clássico da literatura "Os Três Mosqueteiros" que surge aqui em uma mistura da atmosfera dos filmes Piratas do Caribe com os fetiches e cacoetes do diretor. Longe de ser um filme de época, Três Mosqueteiros é um filme do século XXI encenado com figurino do século XVI.
Levar a sério Orlando Bloom, Mila Jovovich e o quarteto principal, formado por Matthew MacFadyen, Luke Evans, Ray Stevenson e Logan Lerman é tarefa difícil. A história, por sua vez, também não ajuda, sendo uma mistura quase patética de um episódio de série de tv anos 80 (com direito a final com discurso de vingança de vilão) amparado pela ação genérica. Aqui temos os mosqueteiros invadindo uma catedral em Veneza em busca das invenções secretas de Da Vinci (sempre ele, uma mistura de falta de originalidade com a tentativa de soar "real"), entre elas um bizarro navio voador, impulsionado por um Zeppelin. Os três mosqueteiros Athos (MacFadyen), Porthos (Stevenson) e Aramis (Evans) são criativamente apresentados com um estiloso grafismo, o mesmo que introduz a história e que é usado quando o filme se locomove entre as locações da produção. Athos é o silencioso líder heróico, Porthos o falastrão e Aramis o esquivo e religioso "guerreiro das sombras". Juntam-se a eles Milady (Jovovich) uma esperta ladra que os ajuda a roubar as plantas, para traí-los na sequencia seguinte com o duque de Buckingham (Bloom), deixando-os inconscientes enquanto foge com o "vilão".
Anos depois, os mosqueteiros surgem endividados e sem força política alguma, já que o fraco e bobalhão Louis (Freddie Fox) é dominado pelo Cardeal Richelieu (Christoph Waltz). É nesse momento que surge D'Artagnan (Lerman) que chega a cidade e se envolve numa briga com os guardas do cardeal, liderados por Rochefort (Mads Mikkelsen) e acaba juntando-se ao bando. Quando uma serie de eventos (que obviamente não vou revelar, mas que são simplórios em suas intenções de criar alguma tensão) acontece, resta ao quarteto salvar o dia.
O que fez de Três Mosqueteiros um livro amado e tantas vezes adaptado para o cinema foi sua alma de aventura, bons personagens e aquela intriga política que permeava os salões reais na França pré-revolução. Embora os personagens estejam presentes na versão de Anderson, a impressão que se tem é que o diretor pegou tudo isso e jogou fora, fazendo de seu filme, um festival de gadgets, explosões, ação mal filmada (em especial as lutas de espada em que o diretor não faz a menor questão de se afastar a fim de mostrar ao público os movimentos dos personagens), personagens demais e sub-plots desnecessários.
A aparição do rei e seu insuportável fashionismo e suas duvidas em relação ao amor de sua rainha, além de irem contra o material original, são muito mal explicadas e desviam o foco da trama principal. O grande problema é que Anderson e seus roteiristas Alex Litvak (de Predadores) e Andrew Davis (de O Alfaiate do Panamá e O Diário de Bridget Jones) aproveitam-se dessa mais que frágil história para elaborar o plano (digno de desenho infantil) do vilão, o Cardeal Richelieu, e assim nocautear mais um elemento do livro (que leu o livro de Dumas vai entender). Além disso, inclui um interesse amoroso para D'Artagnan que é vazio e só ocupa o tempo da projeção.
Como disse no início do texto, o calcanhar de Aquiles do filme são seus atores principais. Bloom, absurdamente deslocado, tentando soar engraçado com os muitos (mesmo) comentários sobre moda para irritar o rei teen. Além disso, quando precisa soar ameaçador, fraqueja em suas próprias limitações, como uma crônica dificuldade para acertar o timing das cenas em que está envolvido. Parece sempre estar em um tom acima ou abaixo do que os outros atores em cena, e quando tem de dividir a cena com Waltz, é engolido.
Já os mosqueteiros são interpretados sem personalidade e não conseguem causar nem ao menos simpatia. O Athos de MacFadyen (de Robin Hood e Orgulho e Preconceito) é um homem amargo e parece não entender que faz parte de uma paródia, um filme que momento algum se leva a sério (o que é um mérito). O Aramis de Evans (Fúria de Titãs e dos vindouros filmes O Hobbit) é o sujeito caladão e "certinho" sempre aflito com o conflito entre fé e violência enquanto o Porthos de Stevenson (Justiceiro - Zona de Guerra, O Livro de Eli, Thor) é o beberrão e que usa a força bruta a seu favor. Completa o elenco Jovovich (mulher e musa de Anderson da cine-série Resident Evil) como a ladra genérica, que usa da sensualidade para conseguir o que quer. São dela as cenas mais "absurdas" do filme, como a "escorregada" por baixo da saraivada de tiros, ou a invasão do quarto da rainha, quando ela passa pelo sistema de segurança modernoso do palácio. São típicas cenas retiradas de um filme moderno e encaixadas sem o menor cuidado em uma produção de época.
E chegamos ao protagonista, o jovem D'Artagnan. A interpretação do medíocre Logan Lerman (o Percy Jackson) é displicente e exagerada, tentando soar arrogante e impertinente, não conseguindo ser nem engraçada nem incômoda. D'Artagnan é um protagonista que não desperta nem amor, nem ódio, mas uma profunda indiferença, o que resulta em um desapego ao o personagem e enfraquece a narrativa.
Já os atores que tem algo a perder como Waltz (cada vez menos) e Mikkelsen (grande ator europeu), fazem o que podem. Waltz que surge como mais uma variação de Hans Landa, mas vai aos poucos sendo mostrado como um sarcástico e ardiloso mestre do crime e da intriga tudo com um razoável timing cômico, embora o humor no filme não funcione quase nunca. Mikkelsen - novamente com um problema no olho, assim como Le Chiffre em Cassino Royale, Guerreiro Silencioso e Fúria de Titãs - faz o feijão com arroz sem tempero. Mais um personagem de pouco papo e muita ação. Talvez sua escalação fosse para dar um ar "europeu" à produção, um certo pedigree. De qualquer forma, um cone de trânsito faria o mesmo que o ótimo ator dinamarquês fez.
Porém é dele e do jovem Lerman a melhor sequencia de ação do filme, quando os dois duelam sobre os telhados da catedral de Notre Dame. Nesse único momento Anderson parece ter entendido que fazia um filme de "capa-e-espada" e que é necessário a compreensão das lutas para que as mesmas empolguem o público.
Empolgação que fica a cargo da excelente direção de arte (Nigel Churcher e equipe) que apesar de não fugir do lugar comum é realmente muito bem realizada. Salões dos castelos, a vida simples dos plebeus, a cinzenta cidade de Londres, tudo é muito bem construído, com destaque para o impagável e megalomaníaco chão do palácio de Versalhes do filme que simula um mapa mundi e que é decorado por peças de metal (seriam "prata"?) que simulam exércitos em diferentes locais do planeta. Uma ótima sacada. Outro ponto positivo é a excelência dos figurinos de época. Apoiados por um personagem metrossexual, os figurinos de Pierre-Yves Gayraud são todos muito bons. Os masculinos são destaque a parte, sem muito medo de ousadias na paleta de cores, indo dos verdes aos azuis, aos vermelhos, púrpuras e dourados sem soar pretensioso ou fora do tom. Tudo simboliza o suntuoso mundo do reinado pré-napoleonico e é uma possível aposta para premiações ano que vem.
Anderson precisa por sua vez aprender a dirigir não só os atores, mas a montar seu filme sem abusar dos slows (ele chega a copiar uma sequencia inteira de 300 em uma luta de Athos) e do piscou perdeu. Falta escopo nas sequencias de ação mais elaboradas, como a do choque entre as maquinas voadoras, que não tem tensão, é mal resolvida e cria uma cena final absurda e que foge a lógica da ação apresentada.
Os Três Mosqueteiros não é uma adaptação do texto de Alexandre Dumas, mas o olhar de um maníaco por games sobre o texto original. Não existe um plot, mais fases a serem vencidas no jogo/filme. Ainda a espaço para o gancho - óbvio - para as novas aventuras dos espadachins anabolizados e da geração Matrix de Paul W.S. Anderson. Não chega a ofender, mas como tantos outros filmes da - até então - fraca temporada 2011 no cinema, não marcará ninguém e será esquecido assim que as luzes forem acesas.
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