domingo, 23 de maio de 2010

Robin Hood
(Robin Hood, 2010)
Ação/Drama - 140 min.

Direção: Ridley Scott
Roteiro: Brian Helgeland

Com: Russell Crowe, Cate Blanchett, Max Von Sidow, William Hurt, Danny Huston, Mark Strong

Robin Hood é um herói conhecido e bem clássico, em todos os sentidos. Ele tem todos os grandes atributos que um grande herói deve ter: é durão, corajoso, não tem medo de dizer o que pensa e é ainda um grande líder, um verdadeiro exemplo.

Logo, era uma questão de tempo para esse clássico ícone do folclore inglês fosse adaptado á era da Hollywood de grandes orçamentos. Adaptada 12 vezes para o cinema, a história já foi de filmes mudos da década de 20 e um longa malaio até uma paródia de Mel Brooks, passando pela adaptação com Kevin Costner em 1991. O exemplar com Costner é um frequentador da Sessão da Tarde, com seus atos heróicos, trilha metida a épica e um roteiro pouco atraente, mas entupido de diversão trash. Agora, o inglês chega ás telas pelas mãos de outro inglês, Ridley Scott.

O conceituado diretor começou a carreira com primores como Alien e Blade Runner, mas amoleceu com o tempo e agora alterna filmes ambiciosos mas com roteiros fracos como Cruzada e filmes menores e com qualidade satisfatória, como O Gângster. Após os primeiros trailer e as fotos, o novo Robin Hood empolgava. Russell Crowe parecia perfeito no papel e o elenco coadjuvante ia da competente Cate Blanchett até o legendário Max Van Sydow. Fora a impressão de que Scott queria algo novo e inovador, violento e sombrio. E agora Robin Hood chega ás telas.


A trama, julga a maioria do público, é conhecida. Robin é um ladrão que ajuda o povo de Nottingham roubando dos ricos e dando aos pobres. E é aí que a produção de Ridley Scott merece já ser vista: Não é essa a trama. A do filme conta a jornada de Robin Hood, um cavaleiro de Ricardo Coração de Leão (Danny Huston, sub-aproveitado), Rei da Inglaterra, que está nas batalhas pelo seu país quando é preso junto com 3 arqueiros após insultar uma ordem do rei. Logo, quando o rei é morto, Robin e os arqueiros fogem e levam a coroa até o ambicioso John (Oscar Isaac), que será proclamado o novo rei. Depois, Robin vai para Nottingham e conhece Lady Marion (Cate Blanchett) e Sir Walter Loxley (Max Von Sydow). Este último pede para que Robin se finja de seu filho para comandar a cidade, agora que ela está feliz com a volta do "filho pródigo". Mas quando Sir Godfrey (Mark Strong, excelente) começa a saquear várias cidades ao mando do rei, Robin tem que proteger Nottingham.

A trama não é fraca nem arquetípica. Ela poderia até criar uma excelente história de origem, que mostrasse um lado diferente de Robin Hood e, com o filme nas mãos de Scott, teríamos algo sujo, violento e, principalmente, inovador. Mas, com o roteirista Brian Helgeland, o buraco sempre é mais embaixo. Ele, responsável por trabalhos irregulares como Zona Verde, O Sequestro do Metro e Chamas da Vingança, faz desse potente candidato a clássico num típico e comum blockbuster hollywoodiano. Algumas frases de efeito e alívios cômicos não precisam participar do mix de Robin Hood. Se a proposta original (a linda forma com que o trailer foi montado) era reinventar o herói de forma artística, ela foi perdida. Temos aqui apenas um Begins, um reboot comum, como Sherlock Holmes  (apesar do filme do detetive inglês ainda ser melhor, pecando apenas por problemas triviais).


É a tal fórmula atual de recriar filmes com ação cativante recheadas com humor. Helgeland até constrói personagens com destreza e tem calma em desenvolver(note como ele cria um roteiro inteiro antes de mostrar o Robin que conhecemos), mas peca por criar situações comuns e diálogos completamente deslocados, tentando dar um tom épico em horas que simplesmente não precisava.

Outro exemplo é a suspensão de crença. De milhões de hectares na Inglaterra inteira, Robin foi parar justo onde o cavalo do rei passava na hora com a Coroa. E o pior: o único guerreiro vivo de uma emboscada é o homem que motiva Robin a encontrar seu passado, salvar Nottingham e tudo mais. Resumo: O filme inteiro é motivado por uma simples coincidência!

Estranho pensar que no início, quando Ricardo é morto, a flecha disparada seja por um mero zé-ninguém. Aqui, o fora do comum prevaleceu, mostrando um ponto forte do roteiro. Porém, no final Robin precisa lutar com todo mundo, até mesmo contra o vilão principal, tomando a responsabilidade de tudo. Talvez o roteiro tenha tentado fazer de Robin Hood um ser maior, tendo que o colocar em todos os grandes acontecimentos. Exagero.


Uma falha enorme. Mas o roteiro tem seus trunfos. Cria personagens legais, situações aceitáveis, se avaliadas de forma descompromissada e um filme divertido, com 140 minutos que passam sem incomodar. Pra quem exige pouco, o filme pode servir bastante. Para o público ávido por blockbusters, o filme será um espetáculo. Para quem esperava algo verdadeiramente artístico de Ridley Scott, fica pra próxima.

É interessante notar que Scott poderia ter feito algo pra melhorar isso. Ele poderia simplesmente pegar a trama e pedir pra refazerem o roteiro, com o intuito de deixá-lo mais interessante e estimulante mentalmente. Mas o comodismo que tornou parte de sua persona desde A Lenda aflorou aqui. Definitivamente, as bolas do diretor ficaram com aquele unicórnio de papel na mão de Harrison Ford no longíquo 1982.

Apesar de ter amolecido como narrador, Ridley Scott continua um diretor competente. Poderia ser gênio, mas ficou preguiçoso. Filma batalhas com arrojo e com uma câmera panorâmica que faz parecer que um Michael Bay da vida nem merecia ter uma cadeira no set. Nas cenas dramáticas, sem movimentos bruscos, a direção fica acima da média, ajudando a fluência das cenas. Interessante notar também como Scott não se deixa levar pela máxima atual de colocar efeitos especiais em excesso na tela. Aqui, o legal é ver que cada fotograma do filme é uma beleza e os cenários, riquíssimos.


Um verdadeiro deleite visual, com imagens bonitas a cada frame. Um filme visualmente perfeito. Ajuda também a paisagem matadora que contempla os olhos. Um grande exemplo do perfeito equilíbrio da direção de Scott com o cenário é a batalha final, pontuada com uma sequência curtíssima, porém impactante do filme: Robin, disparando sua flecha em slow-motion, de vários ângulos. Um primor. A fotografia de John Mathieson também auxilia a construir fotogramas extremamente lindos e registrando as batalhas (e os cenários) com a mesma grandiosidade. A trilha de Marc Streitenfeld é épica, mas não cai no lugar comum de um James Horner, por exemplo. Bonita e vale a pena.

As atuações também são boas. Russell Crowe faz um bom trabalho, apesar de ter mais talento que isso. Cate Blanchett faz seu padrão, o que é ótimo, mas não se sobressai mais por ter um personagem tão raso. Max von Sydow prova ser um leão da atuação, fazendo um papel poderoso e William Hurt faz pouco com seu pouco espaço de tela. Já Mark Strong é um ator extremamente competente e é profílico, podendo ter feições diferentes a cada momento. Uma atuação hipnotizante e camaleônica, de forma que não é possível saber quais as ambições de Godfrey pela aura fechada que Strong cria.

Num panorama geral, Robin Hood é um bom divertimento semanal e vale o ingresso, ainda mais pra quem gosta dos filmes de sandálias e espadas. Apesar da constante semelhança com outros exemplares do gênero, como Gladiador (até incomoda a semelhança de algumas cenas), o filme pode se sair interessante pra quem procura um novo herói antigo nas telas, recriado com os clichês atuais. Mas, ainda serve pelo visual dos fotogramas perfeitos que Scott filmou.


Fica agora a torcida por Ridley Scott. Que ele vá até sua sala, pegue um exemplar de Blade Runner e o assista e analise cada momento de sua preciosidade oitentista. E, principalmente, que ele se lembre que já foi um cineasta ousado, que ia contra as fórmulas de maneira inconsequente, arriscando tudo.

Era legal na época em que a ficção-científica se tornava um gênero infantil e completamente familiar (Star Wars e E.T virando bilheterias enormes) e Ridley nos apresentava uma filosófica ficção com influências Noir que era inteligentíssima e com roteiro impecável. E olha que ele tinha inovado 5 anos antes também, com Alien. Onde foi parar esse cara? Definitivamente, o Ridley Scott visionário, que ia contra as fórmulas, sucumbiu a elas.

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